domingo, 22 de fevereiro de 2009

Dúvidas

Com o perdão do trocadilho infame o qual eu não resisto fazer, “Dúvida”, segundo longa-metragem de John Patrick Shanley, deixa uma certeza. Como é difícil haver algum filme em que Meryl Streep ou Philip Seymour Hoffman atuem que seja ruim. Ou pelo menos eu dou sorte e só vejo a nata da dupla, que é responsável pelos melhores momentos da película quando se confrontam cara a cara na pele da irmã Aloysius e do padre Brendan Flynn.

Ela é uma figura amarga e defensora da Igreja mais tradicional, que quer derrubar o padre por discordar de seus métodos na escola e de suas escolhas. Para isso, encontra um suposto caso de pedofilia envolvendo o padre e um dos alunos, Donald Miller (Joseph Foster), justamente o primeiro negro a estudar no colégio. Ele é alguém que quer modernizar a Igreja, coloca-la mais perto da comunidade e, por conseguinte, se afastar do estilo do “dragão”, como chama a irmã Aloysius.

É em torno de provar ou não o suposto crime de pedofilia que “Dúvida” se insere. Ele é a grande questão do filme e durante o tempo você tende a acreditar nos argumentos de um ou de outro. Fica em dúvida. Claro.

Baseado na peça escrita pelo próprio Patrick Shanley, “Dúvida”, porém, é mais atraente pelo confronto entre os dois atores principais do que pela história em si. Tanto é que o filme demora a engrenar. Quando acelera, principalmente a partir do primeiro choque entre Seymour Hoffman e Meryl, torna-se uma deliciosa película. Você sempre espera o próximo embate, a próxima jogada entre o padre Flynn e a irmã Aloysius.

É espetacular a hora em que eles discutem asperamente e em tons cada vez mais altos, justamente minutos depois de ela ter dito à irmã James (Amy Adams) que em Esparta ganhava uma discussão quem falasse mais alto e lembrava: “Ainda bem que não estamos em Esparta”. E os dois, em seguida, fazem o maior barraco. Mas com a classe dos grandes atores.

Não é a toa que das cinco indicações ao Oscar que acontece neste domingo, quatro tenham sido para atores do filme. “Dúvida” é um trabalho em que o brilho dos atores é o fundamental. “Dúvida” não está presente em categorias como melhor filme ou diretor, porque não é uma película em que Patrick Shanley tenha se esforçado para criar uma obra-prima. O que o filme passa é que ele é alguém que levou o roteiro, ligou a câmera e gritou: “Action!” Não há muitas viagens. O trabalho de câmera dele é simples, quase sem aparecer.

Fez o certo. Tinha mesmo que dar o filme a Meryl e Seymour Hoffman, dois ganhadores de Oscar que podem muito bem faturar mais um prêmio, principalmente a atriz, que já ganhou outras premiações pré-Oscar.

Por causa dos dois que o filme é um trabalho imperdível. E quando Aloysius se debulha em lágrimas ao fim do filme dizendo ter “dúvidas”, não consigo pensar em algo diferente do que o ponto de interrogação. Será o padre realmente pedófilo ou apenas um bom homem que queria ajudar um jovem aluno contra o preconceito e ao mesmo tempo aproximar a escola da comunidade? Dúvidas.

Indicações ao Oscar: Melhor atriz para Meryl Streep, melhor ator coadjuvante para Philip Seymour Hoffman, melhor atriz coadjuvante para Amy Adams e Viola Davis e melhor roteiro adaptado para John Patrick Shanley.

PS: Sei que prometi a meus poucos, mas fiéis leitores uma análise das películas que concorrem ao Oscar de melhor filme estrangeiro antes do Oscar. Todavia mudanças nas datas de estréia e um plantão no meio do caminho me impossibilitaram disso. Mas prometo analisar os três trabalhos restantes após a cerimônia de premiação deste domingo.

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