sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Agatha Christie em Marvel style

Que bigode, amigos!
Os números sempre foram sedutores. No cinema do século XXI, então, eles são moeda de troca natural numa sociedade que só vê o lucro. O sucesso de fórmulas leva a repetições incansáveis. E é essa a sensação que causa ao assistir à nova versão do clássico filme “Assassinato no Expresso do Oriente”

Ao contrário da versão de 1974, o filme atual dirigido e estrelado por Kenneth Branagh transformou-se numa obra digna dos filmes da Marvel, onde piadinhas e traquejos caminham lado a lado com a história. Sua versão do famoso detetive Hercule Poirot, criado pela escritora Agatha Christie, parece um super-herói com superpoderes de dedução e uma imensa capacidade intelectual, muito acima da média, como se fosse um humano que atingisse um estágio de singularidade. Além de um peculiar charme com sotaque belga e a esquisitices de um bigode moldado e irretocável. Afinal, todo super-herói tem características únicas. 

Isso traz consequências. Para o bem e para o mal. “Assassinato no Expresso do Oriente” é um filme agradável de se ver até certo ponto. Tem uma irresistível história do gênero “quem matou fulano?”, com uma dúzia de suspeitos e um detetive a investigar o caso enquanto você se pergunta quem é o assassino. Não deixa de ser uma diversão descompromissada para uma tarde sem grandes anseios. 

Por outro lado, a narrativa tem aquele cheiro de “eu já vi isso dezenas de vezes”. Se até os filmes da Marvel estão cansando, que dirá as cópias que não fazem parte do seu universo cinematográfico. 

Além disso, o Poirot de Branagh guarda enorme semelhança com o Sherlock Holmes vivido por Benedict Cumberbatch na série da BBC. Tem uma certa arrogância, uma inteligência fora do normal, os superpoderes de dedução, manias únicas e até a paixão por uma mulher misteriosa/talvez impossível... A diferença está apenas no charme que Cumberbatch impõe a Holmes. Branagh prefere dar um tom caricatural ao seu Poirot. 

Diretor mais conhecido por suas adaptações de Shakespeare, cujo tom clássico acabou virando uma assinatura própria, Branagh acabou por ter o mérito de sair da sua zona de conforto para construir uma história agridoce para as massas. Há méritos em assumir riscos. E nele, o diretor inglês colhe frutos e maçãs podres no processo. Mas o resultado final é aceitável. 

Fica no ar, porém, que Branagh está apenas começando. Estaria inaugurando uma franquia. O final do filme dá a entender que Poirot ainda voltará em mais alguns filmes. O Expresso do Oriente é apenas o ponto de partida para novas aventuras. 

Cotação da Corneta: nota 6,5


terça-feira, 21 de novembro de 2017

Mulher Maravilha sempre salvando o dia

Cadê o Aquaman, galera?
“Batman vs Superman” foi um erro tão grande que eu nem sei como repetir todos os problemas. Foi uma grande tragédia. Diante disso, a expectativa pelo filme da Liga da Justiça tinha baixado consideravelmente. Talvez por isso eu tenha achado até uma agradável diversão. 

“Liga da Justiça” tem problemas graves, é claro. O primeiro deles é o Ben Affleck jamais me convencer como Batman. Perdoem-me, mas depois de Christian Bale é difícil encontrar alguém que faça um Batman tão bom. E Affleck não consegue superar sequer Michael Keaton. Ele emparelha ali com George Clooney (melhor, mas num filme ruim) e Val Kilmer. 

O segundo problema é o Flash ser um idiota. Cara, por que o Barry Allen precisa ter a alma de um adolescente deslumbrado feito o Homem-Aranha nos Vingadores? Por que ele tem que achar tudo AWESOME como se já não tivesse passado por poucas e boas. Por que ele tem que ser o cara das piadinhas? Lamentável o que fizeram com o Flash.

O terceiro problema é essa brodagem entre o Superman e o Batman. Para piorar, o Bruce Wayne ainda tem sensação de culpa. Tipo, a relação deles não é bem essa. Só falta agora eles voltarem a falar do nome da mãe ser igual. Para piorar, ainda tem essa tensão sexual fake com a Mulher Maravilha. Sai para lá, Bruce que a Mulher Maravilha é meu crush! Você já é rico e poderoso. 

Se a gente releva essas coisas, a “Liga da Justiça” pode ser uma boa diversão. Até porque tem a Mulher Maravilha brilhando as usual. Já são três filmes e a Gal Gadot está sempre roubando a cena. Gosto muito dela nesse personagem. Caiu como uma luva no papel. 

E gosto também do new Aquaman bombado e trabalhado nas tatoos do Jason my sun and stars de Daenerys Momoa. Super entendo quem vier a sentir falta da versão roots louro nórdico e magrelo e seu uniforme laranja e verde. Mas o Aquaman macho alfa não chegou a ser um problema para mim. 

Duro de engolir é o background da história principal. Peraí, quer dizer que um dia na história o povo de Atlantis, as Amazonas da Grécia antiga, os deuses gregos, os alienígenas e a humanidade se uniram para combater uma raça de insetos da dengue alienígenas liderados por um ser bizarro chamado Steppenwolf (Boooooorn to be wiiiiiide)? Então tá. Isso é tão heterogêneo que é tipo as alianças do PT para chegar à presidência do Brasil. Mas é melhor aceitar que dói menos. 

Fato é que o Superman morreu (ou voltou para o seu planeta como um jornal mostra com a foto do David Bowie) e o Steppenwolf (Booooorn to be wiiiiiiide) resolveu ficar saidinho achando que a humanidade estava perdida. 

Ele só não contava que o Batman anda mais sociável e pensando até em dates. Bruce então resolve reunir uma super equipe porque a a coisa está ficando feia e o mundo, ADIVINHEM, pode ser destruído mais uma vez. Nem na Guerra Fria se cogitou destruir tantas vezes o mundo quanto nos filmes da Marvel/DC. 

Bruce acena para o Flash, Diana manda um how you doing para o Cyborg. De repente o Aquaman acha que deve participar e volta para casa só para pegar o seu garfo gigante. Quer dizer, tridente. E logo a equipe está quase completa. Só falta O CARA. 

E aqui, CUIDADO, temos SPOILER. 

Pois é, amigos, o Superman não ia ficar fora dessa festa. Foi ressuscitado mesmo com técnicas mais modernas que as do Cristianismo e veio participar brilhantemente da peleja. Rolou até uma lagriminha aqui quando ele abraçou a mãe. Welcome back, Clark. 

“Liga da Justiça” está longe de ser um filme perfeito. Mas não dá para dizer que não é uma boa diversão. Já é bem melhor que “Batman vs Superman”, por exemplo. Quem sabe a DC não está começando a aprender? 

Enquanto não chega o Liga da Justiça 2, o inimigo agora é Lex Luthor e sua gangue, a Corneta deixa uma nota 7 para a “Liga da Justiça”.


terça-feira, 14 de novembro de 2017

A paixão de Van Gogh

A beleza do trabalho dos diretores de Van Gogh
Depois de mais de um século de indústria cinematográfica, é muito difícil encontrar algum filme que traga algo de original e diferente do que já tenha sido feito. Mas parece-me que os diretores Dorota Kobiela e Hugh Welchman conseguiram esse feito em pleno 2017. Boa parte da beleza de “A paixão de Van Gogh” (Loving Vincent, no original) está na ousadia de sua execução.

Foram cinco anos trabalhando numa cinebiografia diferente de qualquer outra coisa que já tenha sido feita sobre outro artista. “A paixão de Van Gogh” é uma animação toda feita com pintura a óleo e tinta no estilo que consagrou o pintor holandês (infelizmente só) após a sua morte, em 1890, aos 37 anos. Um total de 120 artistas pintaram 65 mil fotogramas utilizando a mesma técnica de Van Gogh para dar vida a esse filme que é de uma beleza ímpar e um deleite para os fãs do pintor.

O objetivo da diretora polonesa e do seu colega inglês era fazer com que as obras de Van Gogh falassem por si, ganhassem vida na tela. Em uma hora e meia, vemos muitas telas e muitas referências aos trabalhos do artista. Vemos personagens reais retratados por ele nos seus quadros ganharem vida e um papel ainda mais relevante do que meros rostos em telas pós-impressionistas.

Mas tratando-se de Van Gogh, o filme não ficaria apenas na ousadia do formato. “A paixão de Van Gogh” também foge do tema tradicional das cinebiografias, que costumam contar a história do artista da infância até a morte. O filme prefere criar uma narrativa detetivesca procurando investigar como o pintor teria falecido.

Oficialmente, Van Gogh, cometeu suicídio ao atirar em si mesmo no dia 27 de julho de 1890. Mas há teorias de que ele poderia ter sido assassinado, por acidente ou não, por René Secretan, um jovem que vivia implicando com o pintor na cidade francesa de Auvers-sur-Oise. O filme resolve explorar isso e as declarações contraditórias de personagens que conviveram com o artista em seus momentos finais na França.

Com isso, a ação se passa justamente um ano depois de sua morte. Na ocasião, uma carta nunca enviada para o seu irmão, Theo Van Gogh, surge nas mãos do jovem Armand Roulin (Douglas Booth), que, antes de enviá-la para a agora viúva de Theo, irmão mais novo de Van Gogh e que morreu seis meses depois do pintor.

Roulin traça a linha de investigação conversando com todas as pessoas que de alguma forma conviveram com Van Gogh em Auvers-sur-Oise. Entre elas, personagens pintados pelo artista, como Marguerite Gache (Saoirse Ronan) e o doutor Gachet (Jerome Flynn, o Bronn de “Game of Thrones”).

Os diretores consideram que surgiram várias declarações contraditórias sobre a morte de Van Gogh, que permaneceria hoje, mais de 100 anos depois, cercada de mistério. A tese do assassinato já havia sido defendida em 2011 pelos biógrafos do escritor Steven Naifeh e Gregory White Smith. E o próprio reconhecimento de René Secretan no fim da vida dizendo que havia atormentado demais o pintor, conhecido por suas psicoses e depressões reforçaram, para os diretores, a tese do potencial assassinato.

Mas a película não toma uma posição. Apresenta os argumentos e deixa em aberto para o espectador pensar sobre qual poderia ter sido o final deste artista genial. O que não deixa de ser uma boa postura.

Embora “A paixão de Van Gogh” tenha sido um filme trabalhoso e que demorou um longo tempo para ser feito, os diretores não pretendem abandonar o estilo de animação pintada que fizeram com este trabalho. Pelo menos por mais um filme. O próximo objetivo de Dorota e Hugh é uma película de terror todo pintado baseado nos trabalhos que Goya fez no fim de sua vida. Desde já estou ansioso pelo resultado dessa nova jornada.

Enquanto ele não chega, “A paixão de Van Gogh” ganhará uma nota 8.

Thor encontra o Ragnarok

Você sabia que tinha essa irmã raivosa, Thor?
A Corneta abandonou o gerúndio, mas jamais deixou de lado a língua afiada. E ela voltou em sua versão internacional para contar um segredo sobre “Thor: Ragnarok”: toda vez que toca a música do Led Zeppelin vem uma cena muito maneira. Então, prestem atenção. Quando o Robert Plant vem com aqueles versos “Valhalla I am coming”, podes crer que o Thor (Chris Hemsworth) vai nos entregar uma pancadaria digna do Deus do Trovão.
Mas “Thor: Ragnarok” não se resume a isso. Podemos dizer que este é o melhor dos três filmes do herói que me fez amar a mesóclise e as segundas pessoas do singular e do plural. Sim, pois muito antes dele virar um fanfarrão nas mãos dos diretores de cinema, Thor era um cara.... bom ele era um pouco fanfarrão também nos quadrinhos, mas tinha um tom solene na voz. Tinha uma vibe de deus no meio dos mortais. O que era justamente o que ele era.
Mas ser o melhor filme não significa grande coisa, é verdade. Embora eu goste bastante do primeiro filme com sua pegada shakespeariana, entendo que ele não caiu exatamente nas graças de público e crítica.
Na terceira aventura, a que narra os acontecimentos da profecia do RAGNAROK, toda a mitologia do Thor entra na fórmula do cinema da Marvel: aventura, piadinhas, algumas boas cenas de combate e um vilão que basicamente quer destruir tudo isso que está aí e, de quebra, dominar o mundo. No caso, Asgard.
Tratar com humor a mitologia nórdica talvez até seja melhor opção, visto que todas as vezes que os americanos meteram as mãos em mitologia ou qualquer coisa sobre o tempo antes de Cristo pareceu tão ridículo quanto novelas da Record. Quem não lembra de “Tróia” (2004), “Alexandre” (2004), “Deuses do Egito” (2016) e outras pérolas de Hollywood?
Mas a pergunta que fica da Corneta é: precisava tratar o Thor com aquele humor físico misto de Jerry Lewis com Trapalhões? Só faltou torta na cara.
“Ragnarok” começa com uma nota triste. Odin (Anthony Hopkins) está partindo para Valhalla e não há nada que Thor e Loki (Tom Hiddleston, sempre maravilhoso neste papel) possam fazer. O problema é que quando um deus vira deus (imagino que depois da morte, ele vire uma divindade eterna, né), sempre tem complicações. Tipo, a saída de cena de Odin libera um monstro. Um belíssimo monstro, sem dúvida, a quem eu me curvaria sem pestanejar.
Estamos falando de Cate Blanchett. Quer dizer, de Hela, a poderosíssima emo fã de Linkin Park DEUSA DA MORTE. Como primogênita de Odin, Hela reclama o trono de ferro (e ouro) de Asgard. E o que as quatro temporadas de “Vikings” nos ensinou é que quando alguém reclama o trono, sai de baixo porque cabeças rolarão e sangue será jorrado em cachoeiras.
Hela quer escravizar, possuir, dominar. Hela é o Christian Grey e quer transformar o universo no seu grande quarto vermelho. Começando por Asgard.
Claro que o Thor terá que impedir isso. Pois é isso que os heróis fazem. O problema é que antes ele precisa passar por uma longa e quase enfadonha viagem pelo planeta Sakkar, espécie de Capital perdida de “Jogos Vorazes”, onde lutará com o Hulk e terá uma DR (soooono) com o monstro verde e o Bruce Banner (Mark Ruffalo). Ah, ele também vai recrutar a última Valquíria (Tessa Thompson) sobrevivente da guerra contra Hela. Uma Valquíria alcoólatra, mas nada que alguém que tenha convivido com Tony Stark não possa lidar.
Mesmo sem o seu inseparável martelo Thor salva o dia (isso não é spoiler, pois os filmes da Marvel são previsíveis) e prepara o seu povo para colonizar um espacinho da Noruega em Midgard (a Terra para os asgardianos). Será que os noruegueses vão receber bem essa leva enorme de imigrantes? Por muito menos, tem gente na Europa gritando. Mas esta é uma resposta que só teremos no próximo Thor. Ou talvez em “Guerra Infinita”, onde o bicho promete pegar feroz.
Antes de ir embora, duas coisas:
1- A cena com o Doutor Estranho é uma das minhas favoritas.
2- Repararam na participação especial do Matt Damon?

Cotação da Corneta: nota 7.