quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Best Of 2008 – Cinema

Finalizando os posts retrospectivos e com listas de melhores, falarei sobre o cinema em 2008. Como sempre, o ano foi bastante proveitoso para nós espectadores da sétima arte. No meu caso, foram 49 trabalhos assistidos dos 302 lançados. Certamente não vi todos os filmes que gostaria de ter visto, mas me esforcei para isso. E agora tenho mais uma difícil tarefa. Talvez a pior de todas. É a de apontar os melhores do cinema no ano.

Ao contrário dos dois últimos anos, quando apontei vários nomes sem ranquear muito, a não ser pelos três ou cinco primeiros, neste ano mudei as regras e vou apontar os cinco ou dez melhores em cada categoria, dependendo da demanda. O que tornou meu trabalho ainda mais hercúleo. Paciência. Talvez eu faça algumas ressalvas, afinal, o cinema é uma paixão dura de soltar, mas prometo ser o mais sucinto possível. Até porque, são muitas categorias.

Melhores filmes:
Foi complicado selecionar 10 filmes. Com muito esforço e dó no coração cheguei a 17. Dei um primeiro corte, e sobraram 11. Foi quando fiquei entre “Juno” e “Feliz Natal”. Dois filmes completamente diferentes e, portanto, impossíveis de comparar. A única semelhança é que são excelentes películas. Acabei optando por tirar “Juno” da minha lista apenas por eu ser mais afeito a dramas do que comédias. Vamos a lista.

10º lugar – “Feliz Natal”. A estréia de Selton Mello na direção é um dos melhores filmes brasileiros do ano. O drama de Caio (Leonardo Medeiros), que vai até a festa de Natal do irmão (Teo) e tenta se livrar de uma culpa enquanto toda a sua família vive suas próprias dores. Um excelente filme.

9º lugar – "Vicky Cristina Barcelona". A, digamos, primeira parceria de Woody Allen com Barcelona depois de inúmeros filmes sobre Nova York e alguns em Londres gera um dos roteiros mais criativos do ano. Sem falar no furacão Penélope Cruz, que rouba a cena de Scarlet Johansson.

8º lugar – “Fatal”. Mais uma vez Penélope Cruz aparece na minha lista (parece até que o ano foi dela), dessa vez vivendo uma jovem aluna que tem um intenso romance com o professor David Kepesh (Ben Kingsley), bem mais velho, que jamais pensa em viver as agruras da terceira idade, mas acaba abdicando dos pequenos prazeres da vida em troca de gozos fugazes. Um excelente trabalho dos dois num roteiro primoroso e uma participação luminar de Dennis Hopper no papel do poeta George O’Hearn, melhor amigo de Kepesh.

7º lugar – “Antes que o diabo saiba que você está morto”. Um filme praticamente esquecido nas listas deste fim de ano, mas uma grande obra de Sidney Lumet sobre dois irmãos, Andy (Philip Seymour Hoffman) e Hank (Ethan Hawke), que planejam roubar a joalheria do próprio pai, Charles Hanson (Albert Finney). Tudo dá errado e abre-se uma porta para discussões familiares enquanto escolhas são feitas. Diálogos primorosos e atuações marcantes.

6º lugar – “Batman – O Cavaleiro das Trevas”. Christopher Nolan fez um marco do cinema dos quadrinhos. Com este novo filme do Batman ele transpôs as histórias juvenis para a fase adulta ao criar um Coringa terrorista, um Batman amargurado, carregado de culpa, e uma Gotham City sombria. Parece Frank Miller, mas é Christopher Nolan, criando o que talvez seja o melhor filme já feito do gênero.

5º “Onde os fracos não têm vez”. O filme que rendeu aos irmãos Joel e Ethan Coen o Oscar de melhor filme é um faroeste como jamais foi feito. Muito comparado no início do ano a “Os Imperdoáveis” (1992), de Clint Eastwood, pela quebra de paradigmas do gênero, o trabalho não é apenas brilhante por causa dos diretores, mas também pelas atuações marcantes de Tommy Lee Jones (Ed Tom Bell) e Javier Bardem (Antoin Chigurh).

4º lugar – “Senhores do Crime”. Um inventário da máfia russa criado por David Cronenberg, que entregou um dos principais papéis, o do assassino Nikolai, a Viggo Mortensen, que cumpre uma de suas grandes atuações. Imperdível.

3º lugar – “Linha de Passe”. O segundo brasileiro da minha lista. Uma obra sensível criada por Walter Salles e Daniela Thomas sobre os desafios de uma mãe grávida para criar uma família de quatro irmãos de pais diferentes em São Paulo. A melhor de todas as histórias é a do aspirante a jogador de futebol Dario (Vinicius de Oliveira). Obra tocante que rendeu o Cannes de melhor atriz a Sandra Corveloni. Mas neste trabalho, é a história que conta mais do que qualquer atuação.

2º lugar – “Na natureza selvagem”. Uma vida enfadonha e uma sede de aventura levam o jovem Chris McCandless, vulgo Alex Supertramp (Emille Hirsch), a resolver largar a existência certinha de um futuro médico que seus pais desenharam para explorar o mundo. Amparado por uma bela trilha sonora de Eddie Vedder e lindas paisagens, este “Easy Rider” (1969) moderno é um incentivo a liberdade e a viver intensamente. Uma pena que Chris tenha ido além do limite. Mas sua curta história foi sem dúvida rica e intensa.

1º lugar – “Sangue Negro”. Um ganancioso produtor e uma história sobre os primórdios da corrida ao petróleo. O filme de Paul Thomas Anderson e a soberba atuação de Daniel Day-Lewis na pele de Daniel Plainview mereciam melhor sorte no Oscar. Um “Assim Caminha a Humanidade” (1956), mais sangrento, cruel, egoísta. Uma obra para se aplaudir de pé.

Piores filmes:
Incensado pela crítica, malhado por “Memórias da Alcova”. O que é “4 meses, 3 semanas e 2 dias”? O desgosto do cinema em que eu estava assistindo foi resumido por uma mulher na platéia: “Que filme ruim!!!”. É inacreditável que esta obra tenha conquistado o Cannes de melhor filme. Ou falta-me experiência, inteligência, sei lá, para ver qualidades no trabalho do romeno Cristian Mungiu.

Outro filme que deixa a desejar é “O Silêncio de Lorna”, trabalho dos irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne que é marcado por uma das mais insipientes cenas de sexo que eu já vi na vida. No cômputo geral, um filme muito chato.

Mas o título de pior filme do ano, até pela quantidade de estrelas que tinha, eu vou dar para “O Procurado”. Nem James McAvoy, nem Morgan Freeman, muito menos Angelina Jolie salvam o trabalho de Timur Bekmambetov. Apesar das cenas divertidas em câmera lenta e de Jolie nua, passe longe deste trabalho.

Decepções:
Ninguém nega o talento de Cate Blanchet, mas “Elizabeth – A era de ouro”, continuação do primeiro “Elizabeth” (1998) também feito por ela, que marcou um certo ineditismo por ser um filme histórico com continuação, decepcionou pelo potencial que tinha a explorar. Blanchet continuou perfeita como a rainha, mas o tom novelesco da obra em determinados momentos e uma constrangedora atuação de Clive Owen (Walter Raleigh) colocaram tudo por água abaixo.

“Ensaio sobre a cegueira” também decepcionou pelo potencial não explorado da obra de José Saramago ao transpô-la para a tela. Faltou ousadia a Fernando Meirelles e um roteiro mais bem trabalhado, ao contrário do feito por Don McKellar. Nem as boas atuações de seus atores principais salvaram o filme, que me deixou com um gosto amargo de insatisfação.

O herói do ano:
Num ano em que Harrison Ford voltou a viver o velho Indiana Jones em “Indiana Jones e o reino da caveira de cristal”, batendo assim de frente com seu adversário e aprendiz Rick O’Connell (Brendan Fraser) em “A múmia: Tumba do Imperador Dragão”, a escolha não foi fácil. Teve ainda um anti-herói, Ben Wade, brilhantemente vivido por Russel Crowe no faroeste “Os Indomáveis”.

Mas após pensar muito, resolvi colocar o meu lado nerd para decidir e dar o prêmio de herói do ano a um agora ex-agente do FBI que sempre buscou a verdade para tudo, mesmo que tivesse que passar por cima dos seus chefes ou se sacrificar pelo que acredita. Fox Mulder (David Duchovny) retornou aos cinemas em “Arquivo X – Eu quero acreditar” e mesmo que o filme não seja nada além de um episódio médio da velha série de TV, ele merece o título pela perseverança e por ser um pouco também anti-herói. Ao lado de Dana Scully (Gillian Anderson), ele forma uma das duplas mais marcantes do cinema e da TV. O velho Fox é o herói do ano.

O vilão do ano:
Aqui não tem discussão. Heath Ledger deu a vida por um papel e criou um Coringa superior até mesmo ao de Jack Nicholson, algo que parecia impossível. Seu Coringa sádico, terrorista, maquiavélico com sua risada debochada e aterrorizante foi a maior de suas criações. Uma pena que Ledger tenha sucumbido antes mesmo de ver seu trabalho ser merecidamente elogiado por nove entre dez críticos, fãs de cinema, etc. O Coringa é o grande vilão do ano e um dos maiores de toda a história do cinema.

A frase do ano: Atuação primorosa, título de vilão do ano, o que faltavam mais a Heath Ledger e seu Coringa? O troféu de frase do ano. Vai dizer que você não ficou aterrorizado quando ele virava para a câmera, dizia “Why so serious?” e cometia alguma atrocidade. Esta foi a grande frase do ano.

A musa:
Que escolha difícil. Marisa Tomei estava linda em “Antes que o diabo saiba que você está morto”, Emmanuelle Seigner, de “O escafandro e a borboleta”, é o meu fraco por francesas, Leandra Leal mostrou tudo, principalmente talento, é verdade, em “Nome Próprio”, Gillian Anderson (“Arquivo X – A verdade está lá fora”) é tara antiga de nerd, Claudia Abreu (“Os Desafinados”) tem a classe das musas e Scarlet Johansson (“Vicky Cristina Barcelona”), bem é Scarlet Johansson.

Mas na hora de escolher fiquei paralisado entre uma eterna musa, Angelina Jolie e toda a sua atitude de mulher fatal em “O Procurado” e Penélope Cruz, estrela de, vejam só, “Fatal” e “Vicky Cristina Barcelona”. A espanhola ou a americana? Que dúvida cruel. No critério beleza, Jolie ganha com alguma vantagem, mas no critério atuação e qualidade dos filmes, o que pesou na minha escolha, a vencedora é Penélope Cruz, minha musa de 2008.

Os melhores roteiros:
Se eu tirei “Juno” da minha lista final dos dez melhores filmes, aqui não posso deixar de reconhecer o talento da ex-stripper Diablo Cody ao criar os diálogos mais inteligentes já feitos em um filme com adolescentes em décadas. Conquistou merecidamente o Oscar da categoria, pois foi um dos roteiros mais criativos do ano.

Na contramão da comédia e da velocidade, o estilo bem pop de Cody, está o trabalho de Joel e Ethan Coen para “Onde os fracos não têm vez”. Destaque para os momentos contemplativos de Tommy Lee Jones.

Na minha lista entram ainda “Senhores do crime”, escrito por Steven Knight, “Antes que o diabo saiba que você está morto”, feito por Kelly Masterson, o trabalho de George Moura, Daniela Thomas e Bráulio Mantovani para “Linha de Passe”, Woody Allen ("Vicky Cristina Barcelona") e a fraterna parceria entre Christopher Nolan e Jonathan Nolan em “Batman – O Cavaleiro das Trevas”.

Mas o melhor de todos, para mim, também é o de “Sangue Negro”. Um trabalho impecável e envolvente assinado por Paul Thomas Anderson.

Os piores roteiros:
Sylvester Stallone nunca foi conhecido como um bom escritor. E “Rambo IV” reflete isso. Um roteiro superficial bem ao estilo de todos os que ele já criou.

Se “Rambo IV” é superficial, “A múmia: tumba do imperador dragão” peca pela obviedade. Tudo o que você vê ali, já viu em outros lugares e até mesmo nos dois primeiros filmes da múmia. Aquela historinha batida de pais ausentes, conflito entre gerações, velhos heróis que voltam a ativa por saudade dos bons tempos. Cheiro de naftalina que a série não merecia ter. Pareceu feito a toque de caixa para garantir o capital chinês (que foi grande) na produção.

Por fim, “Eu sou a lenda”. Quem leu o livro, diz que a história é excelente. Transposta para a tela por Mark Protosevich e Akiva Goldsman, ela fica confusa e ininteligível num filme que deixou a desejar pela expectativa criada em torno deste trabalho de Will Smith.

O francês do ano:
Fã do cinema francês, é praxe do blog indicar pelo menos um filme na língua da Marselhesa se ele não aparece na lista dos melhores. Neste ano, portanto, aponto “O escafandro e a borboleta”, bom trabalho de Julian Schnabel sobre um jornalista, Jean-Dominique Bauby, vivido por Mathieu Amalric, que sofre uma grave lesão no cérebro e desenvolve ao lado de sua enfermeira, Henriette (Marie-Josée Croze), uma linguagem baseada apenas no piscar de um olho, a única coisa que não ficou paralisada no seu corpo. Apenas com isso, ele escreve um livro, seu último ato antes de ser envolto em trevas. Trabalho tocante.

Foi ano de rock and roll:
Como não entraram na minha lista dos melhores, resolvi criar este espaço para comentar e indicar dois filmes musicais excelentes. Um é “The Rolling Stones – Shine a light” que mostra a banda de Mick Jagger e Keith Richards como jamais se viu. Trabalho nota 10 de Martin Scorsese, que capta uma maravilhosa performance dos Stones. Destaque para a parceria com Buddy Guy. De babar.

O outro é “Não estou lá”, cinebiografia extremamente livre de Todd Haynes sobre o gênio Bob Dylan. Estrelado por seis atores – Cate Blanchet, Bem Wishaw, Richard Gere, Christian Bale, Marcus Carl Franklin e Heath Ledger – eles mostram seis diferentes personalidades/fases da carreira de Dylan. É praticamente uma aventura romanceada de outro ótimo documentário de Scorsese, “No Direction Home” (2005). Destaque para as partes em que Dylan é vivido por Blanchet, Marcus Carl Franklin e Heath Ledger.

Os brasileiros:
Ano bom para os filmes brasileiros. Como já comentei sobre “Ensaio sobre a cegueira”, que embora falado em inglês é dirigido por Fernando Meirelles, e “Linha de Passe” e “Feliz Natal”, que entraram no meu top10, vou me ater aos outros cinco filmes nacionais que vi.

“Meu nome não é Johnny” faturou a maior bilheteria do ano pautada numa excelente atuação de Selton Mello como o traficante de classe média João Guilherme Estrela. Alguns podem até achar que o filme faz apologia às drogas (no que discordo), mas é um bom trabalho, divertido, como os melhores blockbusters americanos.

Em outro tom, “Nome Próprio” é um filme vivido intensamente por Leandra Leal na pele da blogueira Camila. A atriz teve que se expor bastante para fazer um trabalho que fica entre a ficção e a realidade da cabeça de Camila. Vale a pena assistir apenas por Leandra Leal.

“O mistério do samba” versa sobre um tema que não é muito a minha praia, mas o trabalho de Marisa Monte de resgate de boas histórias da velha guarda da Portela é de tirar o chapéu.

“Desafinados” é quase como seu nome sugere. Apesar do elenco conhecido, o filme de Walter Lima Jr. não decola. É um filme leve sobre os tempos da bossa nova, mas não vai além disso. Talvez nem fosse seu objetivo, mas ao expor os problemas da ditadura, fica-se com a expectativa de que ele vai avançar um pouco e não avança. Desafina um pouco.

“Última Parada – 174”, que conta a história de Sandro Nascimento e a tragédia do seqüestro do ônibus 174, é um bom filme de Bruno Barreto escrito por Bráulio Mantovani.

O retorno:
O grande retorno de 2008 foi o do velho Indiana Jones (Harrison Ford), herói de “Indiana Jones e o reino da caveira de cristal”. Estava com saudades daquela trilha sonora, do chicote e do chapéu de Indy. O melhor é que o filme ainda tem uma deixa para um novo trabalho. Vida longa a Indy.

O beijo:
Dentro dos meus quesitos alternativos, procurava uma cena de sexo para escolher como a melhor do ano. Não encontrei nada bombástico, mas tive algo quase tão bom quanto. Imagine a cena. Você sendo esculachado por uma ex-namorada na casa que dividia com ela e, não mais que de repente, é surpreendido com Angelina Jolie entrando no apartamento e lhe tascando um beijo erótico ao estilo desentupidor de pia. Que inveja de James McAvoy! Para ele deve ter valido a pena fazer “O Procurado”. Quero um beijo desse de Jolie.

Melhores diretores:
Não fujo muito dos já elogiados trabalhos de Joel e Ethan Coen (“Onde os fraco não têm vez”), David Cronenberg (“Senhores do Crime”), Christopher Nolan (“Batman – O cavaleiro das trevas”) e Sean Penn (“Na Natureza Selvagem”). Meu Oscar particular, no entanto, continua fazendo justiça a Paul Thomas Anderson e seu grande trabalho por “Sangue Negro”, praticamente o melhor tudo do ano.

Pior diretor:
Francis Lawrence vacilou ao filmar “Eu sou a Lenda”. Um trabalho que por vezes parece incompleto, em outros momentos é confuso e, por fim, risível. Fica para a próxima.

Melhores atuações masculinas:
Russel Crowe brilhou duas vezes por “O Gângster” e “Os indomáveis”, Javier Bardem só não levou o título de vilão do ano pelo seu Antoin Chigurh em “Onde os fracos não têm vez” porque havia um certo Coringa no meio do caminho. Denzel Washington também está muito bem como Frank Lucas em “O Gângster”, enquanto Viggo Mortensen brilhou em “Senhores do Crime” e Robert Downey Jr. na pele de Tony Stark em “Homem de Ferro”.

Não poderia faltar ainda Aaron Eckhart, o Harvey Dent/Duas-Caras de “Batman – O Cavaleiro das Trevas”, e Phillip Seymour Hoffman, por sua atuação em “Antes que o diabo saiba que você está morto”.

Mas se eu tivesse que escolher as três melhores atuações do ano ficaria, na ordem decrescente, com Ben Kingsley, por “Fatal”, Heath Ledger, por “Batman – O Cavaleiro das Trevas” e, claro, a melhor de todas, Daniel Day-Lewis por “Sangue Negro”.

Piores atuações masculinas:
As decepções não foram muitas, mas, bom, dá para considerar Sylvester Stallone um ator? Não é o que se vê em “Rambo IV”. Richard Gere é outro que não engulo, principalmente na pele de Billy the Kid, uma das “facetas” de Bob Dylan em “I’m not there”.

Mas as duas piores são as de Clive Owen por Walter Raleigh, em “Elizabeth” e, decepção das decepções, James McAvoy, por Wesley Gibson em “O Procurado”. Para quem brilhou no início do ano pelo bom filme “Desejo e Reparação”, ele poderia ter selecionado melhor seus trabalhos.

Melhores atuações femininas:
Não foi um ano de marcantes atuações femininas. Teve Cate Blanchet tentando salvar “Elizabeth – a era de ouro”, Leandra Leal, brilhando em “Nome Próprio” e Rachel Weisz e Natalie Portman roubando a cena de Norah Jones em “Um beijo roubado”. Teve ainda Ellen Page, ótima em “Juno”, mas num papel que não é muito desafiador.

Portanto, se tenho que escolher uma melhor atuação fico com uma dobradinha de Penélope Cruz em “Fatal” e em “Vicky Cristina Barcelona”, onde ela rouba a cena.

Piores atuações femininas:
Aqui foi mais fácil encontrar exemplos. Liv Tyler nem de longe lembra a ótima Jennifer Connely no papel de Betty Ross no novo “O Incrível Hulk”. Por que trocaram de atriz? Maggie Gyllenhall é insosa no papel de Rachel Dawson em “Batman – O Cavaleiro das Trevas”. Talvez seja o único ponto fraco do filme. Também não gostei do desempenho de Alessandra Negrini em “Os Desafinados”. Muito novela das 8, muito sem vida.

Mas a pior de todas é simplesmente Maria Bello. Aqui fica outra pergunta. Por que tiraram de Rachel Weisz o papel de Evelyn O’Connell em “A Múmia: Tumba do Imperador Dragão”? Sim, eu sei. Ela estava grávida e não queria cruzar o mundo gravando o filme. Mas não poderiam adaptá-lo? Não poderiam fazer algumas concessões e negociar com ela outras? O filme perdeu em brilho e graça, pois Maria Bello não convence nem um pouco. Lamentável.

Concluindo: Relendo todo esse tratado cinematográfico fiquei com uma impressão. O ano de 2008, na modesta opinião deste signatário, foi de Penélope Cruz, Heath Ledger e de “Sangue Negro”. Nada mal. De quem será 2009? Façam suas apostas.

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Best Of 2008 – Música

O ano de 2008 foi muito bom para shows. Um dos melhores, segundo a minha contabilidade particular. Vi 17 concertos, alguns inesquecíveis, outros dispensáveis, mas, como eu sempre digo, para quem gosta de música nada substitui uma banda no palco. É ali, de frente para o público, com os amplificadores ligados e sujeito a erros e acertos, pronto para improvisações ou com tempo marcado, que uma banda mostra quem verdadeiramente é.

E agora eu tenho a difícil tarefa de selecionar as cinco melhores apresentações de 2008. Assim como no ano passado, quando não inclui o Police, dessa vez tiro outro show do Maracanã que fechou o ano da minha lista também. Sim, a Madonna fez um bom show no Rio, mas um dos critérios aqui do blog diz que o espetáculo deve ser 100% cantado. E a Madonna foi, digamos, uns 75% cantado.

Mais difícil do que tirar a Madonna, foi tirar da lista o Scorpions, a Tarja Turunen, o Helloween e o Bob Dylan, mas como só podia escolher os cinco melhores, ficam aqui como menção honrosa.

Dadas as explicações, vamos a lista que vem em ordem decrescente. Mas aqui no caso é do muito bom para o excelente. No final, ainda aponto o pior show do ano, afinal, 2008 não foi só de flores. Teve também alguns espinhos.

5º lugar – Whitesnake. Os ingleses vieram ao Brasil em maio para a turnê do disco “Good to be bad” e fizeram, como de costume, um showzaço no Citibank Hall. Foi a segunda vez que os vi tocar ao vivo e desta vez foi ainda melhor. David Coverdale estava cantando muito bem, soltou todos os clássicos e ainda fechou com “Burn”, explodindo de vez a platéia. Inesquecível.

4º lugar – Mudhoney. O último remanescente do rock de Seattle veio aqui em outubro lançar novo disco, “The Luck Ones”. O Circo Voador não estava lotado, mas extremamente empolgado com a banda que deu a alma em quase duas horas de apresentação. Antes, ainda foram muito simpáticos com os fãs tirando fotos e dando autógrafos. O grunge vive com o Mudhoney e nós nos alimentamos dele através de Mark Arm e sua banda.

3º lugar – Queen + Paul Rodgers. Quem disse que o Queen não sobreviveria sem Freddie Mercury. Tudo bem, Mercury é insubstituível, mas este Queen é uma nova banda com um vocalista de estilo, talento e estrela próprios. O novo álbum, “The Cosmos Rocks”, comprova isso. É uma nova banda, que reverencia os velhos tempos, mas não deixa de olhar para frente e mostrou todas as suas facetas na apresentação de novembro. Ninguém esquece de Freddie Mercury, mas todos que estiveram no HSBC Arena se lembrarão de Paul Rodgers.

2º lugar – R.E.M. Novembro também foi o mês dos americanos do R.E.M. no Rio de Janeiro. Pela segunda vez no Brasil, agora para lançar “Accelerate”, Michael Stipe, Peter Buck e Mike Mills provaram que são realmente uma das melhores bandas do momento. O novo álbum é muito bom, como pudemos ver nas canções mostradas no show, um espetáculo, aliás, que não deveu nada ao do Rock in Rio de 2001.

O melhor do ano – Ozzy Osbourne. Quando começaram a vender os ingressos para o show de Ozzy em abril eu tinha um único objetivo em mente: esta vai só para o currículo. Achava que Ozzy não era mais o mesmo, estava seqüelado e não tinha mais voz para cantar metal. Mas era o Senhor das Trevas, um dos sonhos da minha lista pessoal de shows, portanto, não podia perder a oportunidade. Só que não podia perder dinheiro. Daí eu ter comprado o ingresso para a arquibancada mais distante e barata da HSBC Arena.

Só me arrependo de uma coisa deste dia, portanto. Por que eu não comprei ingresso de pista para o mega-lotado show de Ozzy? O roqueiro inglês superou todas as minhas expectativas (e por isso levou no photochart o título de melhor show do ano) e fez uma das melhores apresentações que eu já vi. Tocou clássicos do Black Sabbath, canções que sempre quisemos ouvir ao vivo, além de inúmeras canções históricas como “No More Tears” e “Crazy Train”. Tudo isso mandando muito bem nos vocais. Com voz de garoto e soltando os velhos gritos de “Let’s go fucking crazy”. Ele também lançava um disco novo, “Black Rain”, mas nós queríamos mesmo o velho Ozzy, e ele estava muito parecido com o grande Senhor das Trevas. Definitivamente o melhor show do ano. Inesquecível.

Pior show: A bomba do ano foi o Korn. Os americanos abriram o show para o Ozzy, mas, nossa, como são chatos. É até difícil entender como alguém consegue se divertir com aquilo. Tudo bem que eu não sou muito chegado a nu metal, mas o Korn foi absolutamente dispensável. Antes tivesse tido apenas o Black Label Society abrindo para o Ozzy. Korn é uma banda que, espero, nunca mais assistir.


Amanhã, encerrando a retrospectiva/melhores do ano abordarei o cinema em 2008.

Best Of 2008 – Recomendações literárias

No ano passado, já deixara claro aqui minha predileção por livros antigos. Raramente leio lançamentos, pois prefiro os clássicos. Mas neste ano, mesmo ainda não tendo terminado a leitura, colocarei entre as minhas recomendações literárias um ótimo livro lançado este ano aqui no Brasil: “Gomorra”, do jornalista Roberto Saviano.

O livro como todo mundo aqui já deve saber serviu de inspiração para o filme de Matteo Garrone (que ainda será tema de crítica aqui no blog). Como disse, ainda não finalizei sua leitura, mas até onde cheguei posso dizer que é um livraço daqueles que é difícil largar e se lamenta quando se chega ao fim.

Através de “Gomorra”, Saviano usa frases curtas, impactantes, uma escrita direta, rápida e rasteira para expor todos os tentáculos da Camorra, a máfia italiana com negócios no mundo inteiro. Tanto o livro quanto o filme, são altamente recomendáveis e complementares, uma vez que “Gomorra”, o filme, aborda apenas alguns aspectos do que é apresentado no livro. É possível, portanto, ir ao cinema sem ter lido o livro sem que haja muita perda, uma vez que a história de Saviano serviu de inspiração para o trabalho de Garrone, que jamais conduz uma mera filmagem linear do trabalho do jornalista, que, aliás, também ajudou no roteiro do filme.

“Gomorra” custou a liberdade de Saviano, que está marcado para morrer, já cogitou deixar a Itália e vive cercado de seguranças. Só desejo que o jornalista tenha dias melhores daqui para frente.

Na seara de livros mais antigos, duas indicações. “Ensaio sobre a cegueira”, de José Saramago, que é infinitamente melhor do que o filme já criticado aqui neste espaço. Foi o primeiro livro que li do escritor português, que me conquistou com sua escrita angustiante, por vezes nauseante, e me forçou a comprar outros dois trabalhos dele. Ao contrário do filme, “Ensaio sobre a cegueira” o livro é de rasgar a alma. Um trabalho de primeira grandeza do português.

Minha segunda indicação para fechar este post é “Com a morte na alma”, de Jean-Paul Sartre. Desfecho da série “Os caminhos da liberdade”, que conta ainda com os ótimos “A idade da razão” e “Sursis”, “Com a morte na alma” se passa na reta final da Segunda Guerra Mundial e é um romance igualmente angustiante. Ele traça o caminho inevitável de herói (ou anti-herói) Mathieu e outros soldados numa guerra que já chega ao fim, fala das escolhas, do livre-arbítrio e das influências externas, principalmente do pensamento único do Partido Comunista, na vida de cada um e do quanto isso pode ser prejudicial e até mesmo mortal quando você se prende aos grilhões ideológicos.

Talvez por ser comunista, Sartre até tivesse querido defender sua ideologia, mas eu acabei tendo uma outra visão de sua obra. De um lado ou de outro, porém, acredito que Sartre vai na veia e sem perdão.

Mais tarde abordarei os melhores shows do ano.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Best Of 2008 – Esportes

Fim de ano é sempre motivo para fazermos retrospectivas, listas de melhores, piores, etc. E Memórias da Alcova não foge a regra e faz pelo terceiro ano consecutivo sua edição do Best Of. Desta vez, porém, prometo ser mais sucinto e dividir os assuntos em posts diferentes. Assim sendo, hoje e nos próximos dois dias, escrevo sobre o que de melhor vi, li, ouvi, assisti, percebi, e vai por aí. Começarei pelos esportes. Vamos lá.

Grandes jogos:


Não foi um ano de muitos grandes jogos, mas deu para separar três deles. O melhor de todos, uma verdadeira aula de futebol, aconteceu no dia 5 de março deste ano. Maracanã lotado, primeira fase da Libertadores, e o Fluminense bateu o Arsenal, da Argentina, por 6 a 0. Foi o grande jogo do Dodô em sua passagem meteórica e de pouca saudade pelo clube. Ele marcou dois golaços num dia em que o Tricolor foi quase perfeito com uma defesa implacável, um meio de campo habilidoso e criativo e um ataque fulminante. Thiago Neves, Washington, Cícero e Gabriel completariam o placar.

O outro jogo que destaco também é do Flu e também pela Libertadores. Este foi no dia 28 de maio, primeiro jogo das semifinais contra o Boca Juniors na Argentina. Partida tensa e emocionante que acabou 2 a 2. Os Thiagos Silva e Neves marcaram para o Flu.

O terceiro jogo vem da Europa e também entrou pelo quesito emoção/dramaticidade. Foi a final da Liga dos Campeões entre Manchester United e Chelsea. Uma partida tensa disputada na Rússia que acabou 1 a 1. Na disputa de pênaltis, jogadores importantes como Cristiano Ronaldo e Terry desperdiçaram suas cobranças. No final, o goleiro Van der Sar defendeu o pênalti que garantiu o tricampeonato dos Red Devils.

Os grandes times:


Se não foi um ano de muitos grandes jogos, não foi também um ano em que um time brilhou intensamente de janeiro a dezembro. Mas alguns brilharam e merecem ser destacados.

O melhor de todos, na minha opinião, foi o Manchester United, que verdadeiramente encantou nos cinco primeiros meses do ano, quando a temporada na Europa chegava na sua reta final. Com Cristiano Ronaldo, Wayne Rooney e Tevez brilhando no ataque e um meio-campo de respeito que tinha Carrick como o grande destaque, a equipe de Sir Alex Ferguson deixava os amantes do futebol satisfeitos. Pena que o Manchester, que acaba de ser bicampeão do mundo, não conseguiu ainda repetir aquelas atuações na atual temporada.

No Brasil, o São Paulo foi campeão brasileiro com seu futebol chocho e nenhum outro clube mereceu elogios na disputa do torneio nacional. O time que jogou melhor no ano, mas somente na Libertadores, foi o Fluminense. Enquanto esteve inteiro, dava gosto ver jogar, principalmente pelo tom épico que a disputa ganhou. Uma pena que o desfecho tenha sido tão trágico.

O craque do ano:

O brasileiro anda realmente em baixa desde a última Copa do Mundo. Se eu tivesse que escolher os melhores jogadores do mundo hoje, não colocaria nenhum deles na minha lista tríplice. E o que é pior para uma certa rivalidade, entrariam dois argentinos.

Os dois primeiros da minha lista são óbvios: Cristiano Ronaldo e Messi. O terceiro é outro argentino que vem jogando muito bem e do qual se fala pouco, Agüero.
Embora não esteja exibindo um futebol brilhante nesta nova temporada, considero o português o melhor pelo que fez ao levar o Manchester United ao título inglês e da Liga dos Campeões. O atacante do Barcelona vem em seguida porque encanta quem gosta de futebol. O mesmo poderia dizer de Agüero, que se por enquanto é conhecido apenas como o genro de Maradona que joga no Atlético de Madrid, ainda vai dar o que falar no futebol. Aguardem.

Heróis:

Em ano de Olimpíada, tenho que eleger meus heróis olímpicos também. Por um momento, vamos fechar os olhos para o desrespeito aos direitos humanos e a censura na China e falar apenas de esporte. E esta Olimpíada de Pequim foi farta em heróis. Teve Liu Xiang, o herói chinês que sucumbiu às dores de uma contusão e não pôde competir os 400 metros com barreira. Teve o alemão Mathias Steiner, que superou a dor da morte da mulher para bater um recorde no levantamento de peso (225kg) e levar a medalha de ouro. Teve ainda os brasileiros César Cielo e Maurren Maggi, esta um exemplo de superação ao vencer o salto triplo.

Mas escolherei três personagens que foram as atrações máximas da Olimpíada. O americano Michael Phelps, porque nenhum nadador havia conquistado oito medalhas de ouro em uma edição dos Jogos como ele. Além de superar seu compatriota Mark Spitz, sete vezes campeão em Munique-72, algumas de suas vitórias foram épicas. Em especial um revezamento 4x100m medley, conquistado na última perna da piscina, e, claro, a dramática vitória sobre o sérvio Milorad Cavic nos 100m borboleta. A diferença no final: um centésimo a favor de Phelps, um fenômeno das piscinas.

Se o Cubo D’Água foi de Phelps, do Ninho do Pássaro vêm meus outros dois heróis. O jamaicano Usain Bolt devolveu a alegria ao esporte com sua marra, seu jeito de lidar com a torcida e a maneira debochada com que ganha suas provas e bate recordes. Deixou Pequim com três ouros e dono do título de o homem mais rápido do mundo.

No salto com vara, a musa Yelena Isinbayeva quebrou mais uma vez o recorde mundial ao saltar 5,05m, tornando-se bicampeã olímpica. Foi o 24º recorde da russa, que também é campeã de simpatia e doçura.

O mico do ano também é olímpico. O sumiço da vara de Fabiana Murer foi uma tremenda bola fora dos Jogos e só gerou piadas engraçadinhas. Lamentável.

Mas o king kong do ano foi a farra das reeleições do COB, da CBF, das federações. Todos os dirigentes se perpetuando no poder. Fica a pergunta de Memórias da Alcova: Até quando teremos que aturar Carlos Arthur Nuzman e Ricardo Teixeira a frente das duas principais entidades esportivas do país sem terem feito absolutamente nada? Quem em 2009 eles tomem simancol, embora ache difícil.

A primeira vez a gente nunca esquece:

Rafael Nadal pela primeira vez levantando o troféu de Wimbledon e assumindo o posto de número 1 do mundo de Roger Federer. O primeiro título de um piloto negro na história da Fórmula 1, Lewis Hamilton, da McLaren (e que decisão emocionante no GP de Interlagos). Hamilton também ultrapassou Alonso e se tornou o mais jovem piloto da história da F-1 a conquistar o mundial.

Amanhã abordarei os assuntos literários.

sábado, 27 de dezembro de 2008

Uma estréia promissora

A expectativa é sempre grande quando um dos melhores atores de sua geração resolve vir para o lado de cá das câmeras e comandar seu primeiro filme. Responsável pela maior bilheteria deste ano do cinema nacional com “Meu nome não é Johnny”, Selton Mello, 35 anos, resolveu contar a sua própria história. Escrever o seu próprio conto de Natal.

Longe de ser um filme família, “Feliz Natal” é de uma melancolia e falta de esperança daquelas de cortar os pulsos. É como ouvir Radiohead em depressão. Diferentemente da seara “jingle bell” que polui o cinema e as produções televisivas, seu filme é um longo libelo de culpa, desencontro, traições, infelicidades. Cada personagem expõe a nudez de sua facada na alma. Cada um carrega sua cruz e tenta se livrar dela seja enfrentando os problemas ou tentando se desviar deles.

Com uma trilha sonora intermitente e de impacto sonoro que me fez lembrar o recurso usado em “As Horas” (2002) de Stephen Daldry, ou mesmo – e até mais ainda – “Laranja Mecânica” (1971), de Stanley Kubrick, o filme começa contando a história de Caio (Leonardo Medeiros, em ótima atuação), dono de um ferro-velho, odiado pelo pai, vivido por Lucio Mauro num dos seus raros papéis dramáticos, e amado pela mãe Mércia (Darlene Glória, num retorno ao mainstream de forma triunfal).

Caio vai a festa de Natal do irmão Teo (Paulo Guarnieri) para uma visita onde ficam patentes todos esses sentimentos e mais o interesse/leve flerte de Fabi (Graziella Moretto), que dá uma pista de que no passado Caio era um jovem sedutor, que conquistava facilmente as mulheres com o binômio charme/canalhice.

Mais sossegado, casado, com um pequeno negócio, Caio, porém, vive numa solitária maior do que qualquer prisão que ele tenha passado. Aos poucos descobrimos o que o faz sentir tão culpado.

Contudo, seu sofrimento não é o único fio condutor da desestabilidade do filme. Teo é um infeliz por ter que carregar uma família de fracassados nas costas. Seu pai, por, no fim das contas, sofrer de um vazio existencial não preenchido nem pela garota mais jovem com quem ele transa turbinado por pílulas de viagra. Sua mãe é tomada por uma loucura, causada pela grande quantidade de remédios que toma e a esquizofrênica vida que leva. Cansada dos problemas da família de Teo, Fabi quer se livrar de tudo. Olha-se no espelho e percebe que está perdendo a juventude numa existência fracassada.

É um Natal amargo o de Selton Mello. Nada é fácil. Nenhuma família verdadeiramente é. Com seu roteiro fragmentado, assinado em parceria com Marcelo Vindicato, tomado de improvisos Selton faz o seu filme ser vivo. A impressão que passa é que ele liga a câmera e diz: “Faz aí qualquer coisa, segue mais ou menos o roteiro. Depois a gente tira os melhores momentos”. E assim nasce uma cena maravilhosa como a de Darlene Glória se pintando diante do espelho.

“Feliz Natal” não é certamente um trabalho linear. Tomado de pontas soltas, é um delicioso quebra-cabeça em que as peças podem até ser juntadas de diferentes formas. Um quebra-cabeça flexível. É um filme em que se deve especular sobre os comos e por quês conforme ele vai passando. E aqui eu não posso deixar de citar os trabalhos de David Lynch, tão difíceis de concatenar. Não chega a ser o caso de “Feliz Natal”, mas é possível ver um pouco do diretor de “Veludo Azul” (1986), “Cidade dos Sonhos” (2001) e “Império dos Sonhos” (2006) no seu trabalho.

Lynch, Kubric, não sei sinceramente se são influências do Selton Mello diretor ou mesmo se ele curte os filmes dos dois americanos, mas se é possível buscar paralelos com estes fantásticos cineastas (ou eu sou completamente insano) é um sinal que o ator marcou um golaço na sua estréia na cadeira de diretor. O Natal de Selton pode até não ser tão feliz, mas seu filme é uma promissora estréia.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Tomando banho com Madonna

Há dez anos, quando chegava a casa dos 40 e lançava “Ray of Light”, Madonna foi perguntada em uma entrevista se ela se via fazendo a mesma coisa em dez anos. Sua resposta foi: “Não. A Madonna com 50 anos é uma cantora aposentada”. O tempo passou e a cantora americana como todo mundo sabe abandonou a idéia e está mais viva do que nunca, faturando montanhas de dinheiro com uma das turnês mais lucrativas do mundo, a “Sticky and Sweet”, de divulgação do seu novo álbum, “Hardy Candy”, lançado neste ano.

Foi exatamente este novo disco e a nova turnê que a fizeram interromper um longo hiato de 15 anos – desde a turnê Blonde Ambition, quando vestiu a camisa do Flamengo (ninguém é perfeito) e gritou “bunda suja” para o país todo ouvir – e aportar no Brasil.

O que dizer sobre a Madonna que fez dois shows no Maracanã no domingo e segunda, um deles, o primeiro, presenciado por este signatário? Pode-se tirar algumas conclusões. Em primeiro lugar, pode-se dizer que Madonna continua dando as cartas no mundo do pop por dois motivos. Primeiro porque ela é boa mesmo no que faz (e aí, é no sentido artístico, embora mereça a conotação sexual também). Segundo porque falta concorrência. Britney Spears e Justin Timberlake, só para ficar em parceiros recentes da cantora, não engraxariam o sapato de Madonna.

Um outro ponto importante é que Madonna sabe fazer um show. Pensou em entretenimento, no showbizz, pensou em Madonna. Seu espetáculo é tão rico que você até releva alguns momentos de playback, algo que eu abomino em qualquer artista. São luzes, telões, toda uma produção realmente de tirar o chapéu. Talvez eu só tenha visto algo parecido no show do Roger Waters no ano passado.

Claro que justamente desde “Ray of Light” a cantora não faz um disco a contento. “Music” (2000), “American Life” (2003), “Confessions on a dance floor” (2005) e Hardy Candy são apenas álbuns Ok, com seus bons momentos, mas irregulares. Mas foi uma opção dela mergulhar de vez na música eletrônica e tornar o flerte de “Ray of Light” num casamento mais longo do que os seus na vida real. Tem o mérito de ter atraído os jovens e renovado a sua platéia. Do contrário, ela continuaria ganhando muito dinheiro hoje, mas apenas graças ao seu velho público saudoso de álbuns “mais clássicos” como “True Blue” (1986) e “Like a Prayer” (1989). Bons tempos aqueles em que ela compunha com Patrick Leonard.

Mas no show do Maracanã se tem a oportunidade de ver todas as Madonnas. Ela, portanto, não deixa de agradar todo mundo, embora, obviamente o que predomine sejam as cações do novo disco. Em diferentes momentos, nos quatro ou cinco – confesso que não me lembro agora – sets que compõem o show, ela canta sete músicas do disco. De “Candy shop”, que abre os trabalhos com a cantora adentrando o palco num trono se colocando como “Rainha do Pop”, a “She’s not me”, em que bailarinos “vivem” suas diferentes fases e Madonna acaba dando um beijo na boca da bailarina vestida de noiva, como em “Like a Virgin”, passando pela balada “Miles Away” e os sucessos “4 Minutes” e “Give it 2 me”.

Quando abre espaço para seus antigos sucessos, Madonna os apresenta em novos arranjos. Alguns deles dão certo como a versão rock and roll de “Borderline”, que tirante a sua desafinação ficou bem melhor do que a original, ou “Human Nature”, também com uma pegada mais roqueira. Parêntesis: Madonna, aliás, tomou gosto pela guitarra. A toca (ou faz pose que toca) em diversas partes do show, faz pose de “frontwoman” e até o símbolo do metal (aquele dos chifrinhos feitos com a mão) ela ousou fazer. Sua entrada no Rock and Roll Hall of Fame deve tê-la deixado empolgada.

Outras versões ficaram satisfatórias, como “Vogue”, “Into the groove” e “Like a Prayer”, que, contudo, foram responsáveis por alguns dos momentos mais emocionantes para a platéia que pulou, dançou e estremeceu a arquibancada em que eu estava.

La Isla Bonita, porém, ficou bem abaixo com sua versão meio cigana, meio sei lá o que dos confins da Romênia. Parecia que o Gipsy Kings estava tocando com a Madonna. Enfim, não se pode acertar sempre. Só não se pode acusá-la de não ter arriscado.

Em duas horas de espetáculo (e chuva ininterrupta, que fez a cantora, visivelmente irritada, entoar um “Fuck the rain” e até limpar o palco com um paninho), Madonna revisitou toda a sua carreira. Se minhas contas estiverem certas e eu não esqueci de nada, apenas três álbuns não tiveram canções lembradas: “American Life”, “Erotica” (1992) e “Like a Virgin” (1984).

Entre uma música e outra, ela procurava ser simpática com a platéia. Respondia com um “I love you to” aos gritos históricos de “I love you”, “We love you” e similares. Até trocou o trecho final da balada “You must love me” para “I must love you”. Truques velhos, batidos, mas que agradam uma multidão ávida por uma palavra de carinho de seu ídolo.

Mas o grande momento da relação artista-platéia aconteceu na parte do show em que Madonna deixa que um fã peça uma música. O felizardo foi um tal de Fábio, um dos que pagaram o explosivo ingresso de R$ 600 para ficar na pista vip (até quando essa aberração vai existir?). Fábio levou um fora de Madonna ao fazer seu primeiro pedido, que não consegui escutar qual foi, mas Madonna disse que era uma boa canção, só que não cantava mais, ou já esquecera a letra, coisa parecida. Andei lendo que foi “Everybody”, que é do seu primeiro disco, “Madonna” (1983), mas infelizmente não posso confirmar.

Fábio teve direito a uma segunda chance e Madonna aceitou cantar “Express Yourself”. Só que com uma condição. Dizendo que ela sabe o quanto os “brasileiros são bons em trabalhar em equipe” (e tome reboladas provocativas), Madonna afirmou que cantaria um verso e o público outro. O improviso até que saiu direitinho. Se gravaram para o DVD não ficará feio.

No final, apesar da chuva, o saldo foi positivo. O show foi melhor do que eu esperava (tudo bem que eu aguardava uma tragédia) e pode-se dizer que pagou o ingresso. Além disso, falem o que quiser, mas Madonna continua gostosa. Pena que provavelmente foi minha última chance de ir para a cama com ela.

Enquanto eu lamento minha falta de sorte, deixo para vocês alguns momentos do show. “Human Nature”, “Vogue”, “Like a Prayer”, “You must love me” e “Borderline”. Infelizmente, apenas o segundo tem uma boa qualidade de imagem, mas dá para acompanhar trechos importantes, Madonna cantando, Madonna em playback. Tem um pouco de tudo.


Borderline

You must love me

Vogue

Like a Prayer

Human Nature

sábado, 20 de dezembro de 2008

Só faltou um final épico

O que esperar de um boxeador de 46 anos, endividado, que volta da aposentadoria para enfrentar um adversário que é campeão do mundo, 11 anos mais jovem, 25cm maior e muito, mas muito mais forte? Se o enredo é de cinema, uma vitória épica como as melhores de Rocky Balboa (Sylvester Stallone). Se é a vida real, um massacre de conseqüências provavelmente irreversíveis. Pois neste sábado, ao contrário do que normalmente acontece, a vida quase imitou a arte.

Há muito tempo não ficava de pé e ansioso pelo desfecho de uma luta de boxe. Nem me lembro qual foi a última vez. Talvez alguma vitória do George Foreman num passado distante, uma vez que as do Mike Tyson eram sempre massacres de muita porrada e pouca técnica. Nesses tempos todos, até discuti se boxe era verdadeiramente um esporte. Como pode ser se em nada ele valoriza a vida e seu aspecto saudável. É um homem querendo matar o outro sem piedade.

Mesmo com todas as minhas dúvidas, estava curioso para assistir à luta entre o americano Evander Holyfield, que pressionado pela pensão que deve pagar para os nove filhos gerados com seis mulheres, resolveu desafiar o gigante russo e campeão pela Associação Mundial de Boxe, Nikolay Valuev. Independentemente do resultado, a luta já valeria ao ex-tricampeão mundial US$ 750 mil. Dinheiro que aliviaria o bolso estourado de Holyfield.

Acontece que o americano não entrou no ringue apenas pelos dólares, mas para ganhar do russo. Tal qual um enredo hollywoodiano, Holyfield lutou como um verdadeiro gigante, um verdadeiro campeão.

Com uma tática parecida com a usada por Muhammad Ali na histórica luta contra George Foreman em 30 de outubro de 1974, no Zaire - excelentemente bem reproduzida, aliás, no ótimo filme "Ali" (2001), estrelado por Will Smith - Holyfield, que sempre foi mais conhecido por ser um boxeador agressivo, usou toda um técnica de "dançar" pelo ringue enquanto deixava Valuev no meio tentando socar um adversário menor e mais ágil do que ele.

A única diferença em relação ao que Ali usou contra Foreman, é que Ali também se deixou bater muito, mas nunca em pontos fracos do seu corpo que pudessem comprometer sua performance. Isso foi fundamental para cansar Foreman e fazer com que ele vencesse a luta. Holyfield não podia, no entanto, usar artifício semelhante. Do contrário sairia da Suíça num caixão. A luta do Zaire, aliás, pode ser encontrada inteira no Youtube. Basta digitar "Ali vs Foreman". Vale a pena. É um dos maiores momentos da história de todos os esportes. (Embaixo eu coloco apenas o desfecho do combate, a título de comparação com a luta de hoje).

É interessante mesmo a semelhança entre as duas lutas. Assim como Holyfield vs Valuev, o confronto Ali vs Foreman também reunia uma diferença considerável de idade (no caso, sete anos, pois Ali tinha 32 e Foreman, 25) e o boxeador mais velho era considerado acabado para o esporte. Ali acabou dando a volta por cima justamente neste confronto.

Mas como eu dizia era impressionante o preparo físico de Holyfield. Correu pelo ringue durante os 12 rounds, bateu mais e melhor do que Valuev, deixando o russo atônito. Ele certamente não esperava enfrentar um adversário tão bem preparado como o americano que surpreendeu a todos e conquistou imediatamente a simpatia da torcida.

Já que eu entrei na seara dos filmes, a trajetória de Holyfield e a luta em si é tão hollywoodiana que você podia ver ali no ringue o lutador quebrado financeiramente que tem que voltar literalmente à luta de "Rocky 3" (1982), o confronto épico-patriótico contra uma máquina russa de matar então vivida por Dolph Lundgren em "Rocky 4" (1985) - com exceção que no filme o confronto é na Rússia e na vida real, foi na Suíça -, a torcida que se volta completamente para o mais fraco, como em todos os filmes de Rocky Balboa - e você pode ver a galera torcendo pelo Holyfield no vídeo abaixo.

Há ainda o outro lado, o adversário mais jovem, mas com uma carreira que sofre com a desconfiança. Até lutar contra Holyfield, Valuev não havia enfrentando nenhum adversário de respeito. Muito porque o boxe hoje não é o mesmo esporte nobre, ou, vá lá, romântico de outrora quando contava com lutadores do naipe e também carisma de Foreman, Tyson, Joe Frazier, Joe Louis, Sugar Ray Robinson, Sonny Liston ou Floyd Patterson. Um enredo muito parecido com o mais recente filme de Stallone, "Rocky Balboa" (2006).

Ao ver Holyfield quase que lutando para se reerguer do fundo do poço, como não lembrar de James Braddock, que não teve uma carreira tão brilhante, mas uma história de vida que rendeu um filme "A Luta pela Esperança" (Cinderella Man - 2005, no original, um dos apelidos de Braddock), estrelado por Russel Crowe. No filme, quando tentava se recuperar em meio a Grande Depressão americana do final da década de 20 e início dos anos 30, Braddock chega a dizer uma frase emblemática: "Agora eu sei pelo que estou lutando. Eu luto por leite", explicando que ele precisa levar comida para casa. Holyfield não chegou tão ao fundo do poço quanto Braddock, que passou fome, mas dizem que sua situação não é das mais tranqüilas.

Todos esses filmes podiam ser vistos ao vivo no ringue de Zurique. E no final eu já estava de pé torcendo por um nocaute de Holyfield, pois temia que os juízes dessem a vitória ao russo, repetindo, assim, o que acontece em "Rocky Balboa", que perde a luta por pontos. E que anticlímax ao ver a decisão dos juízes. Mesmo com o mundo inteiro tendo assistido claramente que Holyfield lutou melhor e merecia conquistar pela quarta vez o título mundial - e se tornar o mais velho boxeador a conseguir tal feito, ultrapassando Foreman, campeão com 45 anos - os juízes da luta deram a vitória a Valuev.

No final, vaias e protestos dos que lotavam o ginásio e merecidos aplausos para Holyfield, que desafiou o tempo para protagonizar uma das maiores lutas - e injustiças - da história do boxe. Foi quando veio a minha mente o outro lado do esporte que sempre detestei. O estilo Don King. Aquele cheiro de marmelada que sempre permeou o boxe (principalmente a categoria pesado) nas últimas quatro décadas pelo menos.

A luta deste sábado foi uma aula de boxe de Holyfield. Uma pena que ela não tenha tido o mesmo final feliz da de Ali no Zaire. Neste enredo cinematográfico faltou apenas o desfecho épico e glorioso para que pudesse ser filmado pelos estúdios. Uma pena que a decisão dos juízes tenha sido tão conservadora diante do óbvio que foi visto nos 12 rounds de Zurique. Após o combate, Holyfield, muito contrariado com o resultado, disse que não sabe ainda o que fará daqui para frente. Aos 46 anos, ele não tem mais muito futuro na carreira. Se decidir se retirar definitivamente dos ringues, espero que o dinheiro tenha servido para que ele consiga se livrar de suas dívidas e curta uma merecida e tranqüila aposentadoria. Afinal, depois deste sábado ele escreveu definitivamente seu nome na história dos verdadeiros gigantes do boxe.
Abaixo, o oitavo e o décimo-segundo rounds da luta entre Holyfield e Valuev e o final do combate histórico entre Ali e Foreman.





quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Sobre neurônios

Roberto Horcades é um dos piores presidentes da história do Fluminense. Como se não bastasse a imbecil frase de que mulheres "só tem dois neurônios", ele protagonizou neste segundo mandato a frente do clube das Laranjeiras fatos vergonhosos e/ou pastelões que só me fazem gostar cada vez menos do futebol brasileiro.

Aliado do ex-presidente do Vasco Eurico Miranda, Horcades vem se revelando um exímio sucessor (estaria ele disputando com Elias Duba, do Madureira?) das piores práticas adotados pelo velho ditador vascaíno. Nesta semana, então, ele se superou.

Enquanto soltava mais uma de suas pérolas - quem não se lembra de outras como "eu ganhei tudo aqui no clube" como se "tudo" se resumisse a um Estadual e uma Copa do Brasil - Horcades liderava nos bastidores um golpe de estado na Federação de Futebol do Rio de Janeiro. O golpe fez com que o presidente Rubens Lopes, cujo mandato se encerrava em 2011, esticasse seu período a frente da entidade até a Copa de 2014.

Parênteses. Parece que tudo no futebol brasileiro se resume a Copa de 2014. Lembremos que o mandato de Ricardo Teixeira na CBF também foi estendido até a Copa. E que esta medida vem se repetindo em outras federações. Se o Pan foi uma farra de superfaturamentos e falcatruas, esperem para ver o que será a Copa. A menos que a Fifa faça alguma coisa e transfira o Mundial para o Canadá ou para a Alemanha, o que seria bem mais sensato.

Mas como eu dizia, apoiado por todos os clubes - com exceção do Flamengo - Horcades conseguiu o seu intento. Mas a decepção não parou por ai. Na quarta-feira ele apresentou com a pompa de um Oráculo de Delfos, Alexandre Faria para comandar as divisões de base do clube e fazer a ponte com os profissionais.

Nada demais se Faria não tivesse sido demitido neste ano do Atlético-MG acusado de empresariar jogadores ao mesmo tempo em que comandava o futebol do Galo. De acordo com Afonso Paulino, ex-presidente do clube mineiro, Faria recebia 3% de alguns contratos de atletas do clube. Faria, obviamente, nega. Não estou querendo acusar ninguém, mas como se dizia da mulher de César "não basta ser honesto, tem que parecer honesto". Ou seja, não seria melhor isso tudo ficar completamente esclarecido antes de contratá-lo? Será que ele é o único profissional capaz de cuidar de um departamento de futebol? Por enquanto, a imagem que me vem na cabeça é da Raposa flanando livre no galinheiro.

Além disso, ainda está muito mal explicado o escândalo dos ingressos da final da Libertadores contra a LDU. Por causa de uma situação obscura, metade dos 68 mil ingressos simplesmente não foram destinados à bilheteria, causando transtorno e frustração aos torcedores. Durante o escândalo, que teria contado com a participação de dirigentes do clube, foram retirados ingressos das bilheterias e destinados a chefes de torcida, agências de viagem e uma rede de cambistas que faturou alto na decisão. Horcades não foi acusado de estar diretamente envolvido, mas não fez nada para aprofundar as investigações ou afastou quem estava sendo acusado.

Além dos desvios éticos e das decisões equivocadas, Horcades permanece petrificado como quem se vê diante da Medusa diante do desmantelamento do time que foi vice-campeão da Libertadores. Depois de perder Cícero, Gabriel e Thiago Neves no meio do ano, o Flu perde agora o lateral-esquerdo Júnior César para o futebol alemão e o zagueiro Thiago Silva para o Milan. Ainda está ficando sem seu artilheiro, Washington, praticamente negociado com o São Paulo, inexplicavelmente não tem dinheiro para pagar os US$ 2,8 milhões para manter Conca, emprestado pelo River Plate, e agora está ameaçado de perder Arouca também para o São Paulo.

Que time o Fluminense terá no ano que vem? Um arremedo? É para brigar para não cair no Brasileiro? Convém fazer uma pergunta. Horcades, com quantos neurônios se faz um time de futebol?

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

The show must go on

Uma das vozes mais marcantes da história do rock, Freddie Mercury é considerado por muitos o maior cantor do gênero. Não sei se ele é realmente o melhor, mas certamente deve ser figura presente em qualquer top10. Seu talento aliado à sua presença de palco o credencia facilmente a isso. Portanto, a idéia de substituir o insubstituível seria no mínimo espinha atravessada na garganta de qualquer fã xiita.

Só que o guitarrista Brian May e o baterista Roger Taylor nem pensaram nisso quando em 2004 convidaram o cantor Paul Rodgers, ex-Bad Company, Free e The Firm, para formarem uma parceria que ficaria conhecida como Queen + Paul Rodgers. A associação de uma das maiores bandas da história com Rodgers, um vocalista de conhecido talento e que era um ídolo para Freddie, pareceu um tremendo projeto caça-níqueis mais ou menos como a que o tecladista Ray Manzarek e o guitarrista Robby Krieger fizeram ao convidar o vocalista do The Cult, Ian Astbury, para substituir outro insubstituível, o poeta Jim Morrison, para formar o The Doors of 21st Century.

Assim como o baterista John Densmore no caso do Doors, o baixista John Deacon não quis participar da reunião naftalínica do Queen. Cizânia no grupo? No caso do Doors, sim, uma vez que Densmore não concordava com uma banda que não tivesse Morrison nos vocais. No caso do Queen, ninguém sabe, mas May deu entrevistas dizendo que hoje Deacon é um cara recluso e que as portas estão abertas para ele aparecer e tocar quando quiser.

O Queen + Paul Rodgers lançou um disco ao vivo em 2005, “Return of the Champions”, e neste ano saiu “The Cosmos Rocks”, bom álbum de inéditas que começou a dar a impressão de que o projeto era mais para valer do que brincadeirinha para encher as contas bancárias.

O novo disco trouxe a banda ao Rio para uma apresentação na HSBC Arena. E o que se pode dizer da nova banda? Se eu comecei comparando projetos, pode-se dizer que o Queen + Paul Rodgers é muito mais Velvet Revolver, a agora ex-banda que foi formada pelo vocalista do Stone Temple Pilots, Scott Weiland, e pelos ex-Guns N’Roses, Slash (guitarra), Duff McKagan (baixo) e Matt Sorum (bateria), do que The Doors of 21st Century. Uma nova banda formada por membros de outras bandas conhecidas. Ponto. Afinal, como diz uma letra do velho Queen, “the show must go on”.

Assistir ao show com esse espírito é a melhor maneira de aproveitá-lo. Até porque, se Freddie Mercury é, como já disse, insubstituível, Paul Rodgers é um cantor excelente, de luz própria e que não caiu no projeto de pára-quedas. Rodgers tem história e parte dela foi vista na apresentação do grupo quando ele cantou duas ótimas músicas de suas antigas bandas, “All right now”, do Free, e “Feel like making love”, do Bad Company, além de “Seagull”, também desta banda.

Se seu alcance vocal não atinge o que era conseguido por Freddie, Rodgers é um cantor, digamos, mais rock and roll e dá um peso ainda maior a, vamos chamar assim, este novo Queen.

E essa diferença de som é marcante quando são mostradas as músicas do novo disco. “Cosmos Rocking” é uma pauleira sensacional com uma pegada blueseira. Rock clássico. “C-elebrity” uma canção forjada para ser o single de uma banda enquanto “Say it’s not true” se revela uma linda balada. Ainda foram tocadas as ótimas “We Believe” e “Surf’s up school’s out”. Definitivamente, “The Cosmos Rocks” é um álbum que precisa ser ouvido com atenção e sem pré-conceitos.

Rodgers também não faz feio quando canta as canções do velho Queen. “Hammer Fall”, que abre o show, e “Tie your mother down” ficam ótimas na sua voz, assim como “Another one bites the dust”, “Crazy little thing called love”, “Radio Ga Ga”, “We will rock you” e “I want it all”, canções acompanhadas com fervor pela platéia.

Mas o Queen + Paul Rodgers sabe respeitar a história e tem consciência de que nem sempre Rodgers funciona em algumas músicas do antigo Queen. É por isso que Brian May canta a balada das baladas “Love of my life” – o guitarrista ainda faz um agrado à platéia dizendo que “ainda ouve aquelas vozes” do Rock in Rio de 1985, na histórica apresentação da banda com Freddie nos vocais – muito ligada a Freddie Mercury. Ele ainda pede para o público “cantar por Freddie” e é prontamente atendido sem esconder uma lágrima caindo no canto do olho. Taylor também coloca as cordas vocais para funcionar em “Underpressure”, “Kind of magic” e “I’m love with my car”.

Mas a presença de Rodgers é tão marcante, que é possível estranhar o longo tempo em que ele fica ausente do palco no meio do show. O cantor já havia conquistado a platéia e por mais criativa e espetacular que seja Taylor usando as baquetas para tocar o baixo de Danny Miranda (também acompanham a banda o guitarrista James Moses e o empolgadíssimo tecladista Spike Edney) ou o baterista tocando uma bateria que era montada na hora pelo rodie, faz uma falta danada no palco.

Mas são irregularidades naturais para um show de 2h30m. Só vi uma banda ser espetacular do início ao fim de uma apresentação, o Pearl Jam. No cômputo geral, o show do Queen + Paul Rodgers é ótimo e emocionante. Muita gente deve ter se emocionou quando Freddie Mercury apareceu no telão cantando “Bohemian Rhapsody” num “dueto espírita” com Paul Rodgers. Uma bela homenagem ao cantor que morreu em 1991 em decorrência de complicações causadas pela Aids.

Para finalizar, a clássica “We are the champions”. Se o tempo não está para perdedores, como diz a canção, o Queen + Paul Rodgers mostra que já nasce vencedor. E que é mais do que uma banda que vive do passado, mas que o reverencia e também aponta para um futuro honesto. Superior aos grupinhos da moda de hoje, ele é. Portanto, God save the (new) Queen.

Abaixo, alguns dos grandes momentos do show:
"Bohemian Rhapsody"


"I Want it All"



"The show must go on"


"We will rock you"

"Cosmos Rocking"

domingo, 7 de dezembro de 2008

A hora de abrir o olho

Deixando um pouco de lado o problema da tentativa de manipulação de jogos, o Campeonato Brasileiro deste ano pode ser considerado um divisor de águas na história do futebol carioca. Há mais de uma década vivendo do passado glorioso, o Rio de Janeiro caminha para o nono ano sem ver um clube sequer ser campeão brasileiro. Desde que o Vasco de Romário, Juninho Pernambucano, Juninho Paulista, Euller, Viola e outros nomes de peso conquistaram a competição de 2000, o Rio bateu na trave algumas vezes com o Fluminense, neste ano com o Flamengo e foi muitas vezes ameaçado de rebaixamento. Além de cair com o Botafogo e agora com o Vasco.

Neste meio tempo, o São Paulo foi tricampeão (2006-07-08), o Santos foi bicampeão (2002 e 2004), e o Corinthians faturou o título de 2005. Os únicos a quebrar a hegemonia paulista foram o Atlético-PR em 2001 e o Cruzeiro em 2003. O Rio ficou chupando dedo ou vivendo de pequenas glórias nas Copas do Brasil de 2006 (Flamengo) e 2007 (Fluminense).

O Rio começou o ano de maneira promissora. Com dois times na Libertadores (Fla e Flu), parecia que seria a redenção. Apesar do vice-campeonato do Flu, um baque muito duro para o torcedor tricolor, mas de valor pela dificuldade da competição, o Fla liderava o Brasileiro e dava pinta de que poderia brigar por pelo menos uma nova participação na Libertadores.

O fim de ano ao invés de significar uma subida de degrau na corrida atrás do futebol paulista, representou muito mais do que um rebaixamento, no caso do Vasco, mas uma redução ainda maior do poderio fluminense.

Em 2009, o Rio de Janeiro terá três times na primeira divisão – contra seis dos paulistas – nenhum clube na Libertadores, após o patético fim de campeonato do Flamengo, que perdeu por 5 a 3 para o Atlético-PR, e apenas três times na Sul-Americana (a dupla Fla-Flu, “rebaixada” em âmbito internacional, e o Botafogo). Neste ano, os quatro grandes cariocas disputaram uma competição internacional.

Nem a história está mais ao lado do Rio. Por 16 anos, o Flamengo bateu no peito para dizer que era o maior vencedor de títulos brasileiros do país - embora isso sempre fosse discutível, pois essa conta simplesmente ignorava os títulos de Santos e Palmeiras na Taça Brasil e no Torneio Roberto Gomes Pedrosa, precursores do atual Brasileiro -, agora o São Paulo é hexa (acima, na foto de Wander Roberto, de divulgação da Vipcomm) e o Flamengo, apenas penta.

Por tudo isso, o futebol carioca termina o ano menor do que entrou. Menor do que estava no meio do ano. Será que o Rio continuará insistindo em dirigentes amadores e incompetentes? Até quando o mês terá 60 ou 90 dias por aqui? O Rio precisa reagir. Precisa abrir o olho. Do contrário, será um pôster amarelado na parede do bar.

XXXXXXXXXXXXXXX

PS: O fim do Campeonato Brasileiro me fez adiar a postagem da crítica do shomzaço do Queen + Paul Rodgers. Mas na quinta-feira prometo pagar essa dívida.

Outra contaminação

Um dia antes da última rodada do Campeonato Brasileiro eu planejava fazer um balanço da competição que foi muito emocionante na tabela, mas sofrível dentro de campo. Sem bons times, com poucos jogos dignos de nota, para mim este Brasileiro foi um dos piores. Apesar da tabela.

Ainda assim, num exercício natural em cada fim de campeonato, me arrisquei a fazer uma seleção da competição e até que o cômputo final não ficou tão ruim. Algo como Marcos (Palmeiras), Leonardo Moura (Flamengo), Miranda (São Paulo), Ronaldo Angelim (Flamengo) e Leandro (Palmeiras); Ramires (Cruzeiro), Hernanes (São Paulo), Wagner (Cruzeiro) e Alex (Internacional); Guilherme (Cruzeiro) e Alex Mineiro (Palmeiras). Técnico: Muricy Ramalho (São Paulo). Até que não é nada mal. Levando-se em conta que eu ainda teria no banco jogadores como Rogério Ceni (São Paulo), Jonathan (Cruzeiro), Juan (Flamengo), Thiago Silva (Fluminense), Jean (São Paulo), Arouca (Fluminense), Sandro Silva (Palmeiras), Marquinhos (Vitória), Tcheco (Grêmio), além dos atacantes Nilmar (Inter), Keirrison (Coritiba) e Kleber Pereira (Santos).

Só que meus planos de análise do Brasileirão foram suplantados por uma nova reflexão após mais um possível escândalo de arbitragem no futebol nacional. Dessa vez envolvendo o árbitro carioca Wagner Tardelli, cujo nome estaria sendo usado por alguém que só a CBF sabe, mas não quer contar como vejo na ESPN, para a manipulação de resultados na competição. Em troca disso, duas versões. Uma diz que é dinheiro, outra que é um envelope com ingressos para o show da Madonna. Essa cantora realmente adora um escândalo.

Tardelli, que aparentemente (e por enquanto só aparentemente), não tem qualquer envolvimento no caso foi afastado do jogo decisivo deste domingo entre Goiás e São Paulo, que pode valer o título para o Tricolor paulista na disputa contra o Grêmio, que enfrenta no mesmo horário – 17h – o Atlético-MG. No seu lugar foi escalado Jailson Macedo de Freitas.

A menção de mais uma notícia de manipulação de resultados fez vir à tona a velha expressão “campeonato contaminado” usada em 2005, quando o escândalo Edílson Pereira de Carvalho desvendado pela revista Veja explodiu como uma bomba atômica no futebol brasileiro. Na ocasião, movimentos muito suspeitos de todos os lados (CBF, STJD, etc...) anularam 15 jogos apitados por Edílson que foram decisivos para o título do Corinthians num momento em que Internacional e Fluminense disputavam a liderança da competição.

Sem contar o escandaloso pênalti não marcado pelo árbitro Márcio Rezende de Freitas em cima de Tinga numa partida decisiva entre Inter e Corinthians no Pacaembu. Aquele campeonato (aparentemente, e só aparentemente) tinha que ser mesmo da misteriosa parceria Kia/Corinthians. Aliás, de onde vinha o dinheiro do iraniano?

Se o Brasil fosse um país sério, ou melhor, mais ou menos sério, o Brasileiro de 2005 não teria continuado. Até porque eu não conheço esquema de uma pessoa só e nesta confusão toda só quem se deu mal foi o Edílson. Não que ele não tivesse qualquer culpa. Ele, inclusive, assumiu a sua parte. Os demais é que continuam nas sombras.

Um exemplo de um país que eu considero mais ou menos sério - afinal, quem elege diversas vezes Silvio Berlusconi para primeiro-ministro não pode ser plenamente sério: a Itália. Nos últimos 28 anos, o país teve três sérios escândalos de manipulação de resultados. O primeiro, o famoso escândalo da Totonero em 1980, resultou como principais conseqüências a punição de dois anos para o atacante Paolo Rossi, que, ressaltemos, foi punido não por participar, mas por saber da história e não ter revelado, e o rebaixamento de Milan e Lazio para a segunda divisão.

No segundo, em 1986, também envolvendo a loteria esportiva italiana, um esquema semelhante resultou no rebaixamento da Udinese para a Série B, além de punições para times da segunda, terceira e quarta divisões.

O terceiro, mais recentemente, envolvendo manipulação de resultados, resultou no cancelamento do campeonato de 2004-05, conquistado pela Juventus, no título da Inter na temporada 2005-06 ganho no tapetão por causa do envolvimento da Juventus, que foi rebaixada para a segunda divisão com direito a perda de pontos, e na perda de pontos de diversos times na Série A, o principal deles o Milan, que começou com 15 pontos a menos.

No Brasil, a título de comparação, aconteceram quatro escândalos de arbitragem/manipulação de resultados nos últimos 12 anos, mas ao contrário da Itália a impunidade imperou por aqui.

Por causa da patética cena do ex-presidente Álvaro Barcelos estourando uma garrafa de champagne para comemorar a “virada de mesa” do Fluminense, rebaixado em 1996 e mantido na primeira divisão em 1997 (até cair de novo), pouca gente lembra que aqueles anos foram marcados pelo escândalo Ivens Mendes. O esquema envolvia manipulação de jogos, financiamentos para eleições e figuras que até bem pouco tempo estavam ainda comandando seus clubes como se nada tivesse acontecido. Daquele tempo para cá, nada aconteceu realmente – além da morte de Mendes - e o esquema caiu no esquecimento. A única alteração foi a manutenção de Fluminense e Bragantino na primeira divisão de 97.

Além disso, tivemos o caso Loebeling, cujo chefe na comissão de arbitragem, Armando Marques, o pediu para adulterar uma súmula. Lembravam disso? Pois é. Mais recentemente o já listado esquema de 2005 e agora esse que mancha o campeonato deste ano. Nos três anteriores, uma única marca: a impunidade. Continuará assim? A saber.

O fato é que se houve manipulação de jogos é preciso ter a coragem de pedir desculpas aos torcedores e simplesmente acabar com o campeonato. Sem choro nem vela. Sem volta olímpica, sem grito de campeão. Provada qualquer tipo de manipulação, a “contaminação” do campeonato é inerente. E aí só restará a lamentação. Mas ninguém terá coragem de fazer isso. A CBF jamais teria coragem de fazer isso. Não fizera antes, por que faria agora?

Assim, fica apenas uma pergunta. Enquanto a impunidade estiver mandando no futebol – e no Brasil como um todo, aliás – você confiará no que vê na TV ou no estádio? Eu só sei que hoje meu amor por esse esporte foi novamente atingido, aumentando ainda mais a minha descrença.