domingo, 22 de agosto de 2021

Finalmente um bom "Esquadrão Suicida"

Isso sim é um Esquadrão Suicida
Não sou muito fã de fazer comparações ou tomar partido em um dos lados da dualidade do cinema pop atual. Mas como fã e leitor de quadrinhos tanto da Marvel quanto da DC, vou abrir uma pequena exceção para traçar um tímido paralelo entre as duas rivais.

É inegável que a Marvel faz filmes bons em quantidade maior do que a DC. Seus acertos são maiores do que os seus erros. Mas também é inegável, pelo menos do meu ponto de vista, que quando a DC acerta, ela acerta num nível que a equipara, quiçá a faz superar, alguns dos melhores filmes da Marvel.

“O esquadrão suicida” (The Suicide Squad, no original) é desses filmes do patamar mais alto da DC. E traz justiça. Traz justiça para esse grupo de vilões e anti-heróis tão mal tratados na versão de David Ayer de 2016. E vamos combinar que depois deste filme podemos definitivamente esquecer que o anterior existiu.

O filme também traz justiça para uma personagem tão legal como a Arlequina (Margot Robbie). Finalmente ela ganha um filme bom, excelentes cenas e um roteiro um pouco melhor, embora longe de ser perfeito. Mas melhor do que o que vimos no primeiro “Esquadrão Suicida” e do fraco “Aves de Rapina” (2020).

“O esquadrão suicida” também traz um sopro de novidade na monocultura contida dos filmes de super-heróis. Num mercado dominado pela Marvel, que só faz filmes PG-12, a classificação indicativa de “O Esquadrão Suicida” é 18+. Isso proporciona um filme nada contido e, exatamente por isso, mais “carnal” e vivo nos mais diferentes aspectos.

Longe de mim, porém, achar que a qualidade de um filme se resume a violência extrema e sexo. Isso está muito longe de ser verdade. Mas um grupo de personagens como o do Esquadrão Suicida pede um filme de censura mais alta para que seja mais fiel aos feitos de cada um deles. É claro que isso, por outro lado, não mascara os eventuais problemas do filme. Uma história um pouco jogada e num esquema mais de montanha-russa do que de encadeamento de ideias.

E aqui é preciso ressaltar o trabalho de James Gunn. Diretor e roteirista do filme, o cineasta deixa claro desde os primeiros minutos que tudo pode acontecer neste filme. E que não devemos nos apegar a nenhum personagem. Esse caráter de imprevisibilidade do filme é um dos méritos dele.

Em suas 2h14min, Gunn também consegue apresentar mais do que cenas apoteóticas. Num filme com 18 personagens supervilões. ele também consegue desenvolver minimamente seus personagens principais. Em especial Sanguinário (Idris Elba), Ratcacher 2 (Daniela Melchior) e Rei Tubarão (Sylvester Stallone). Tudo isso aproveitando para dar uma continuidade à história da Arlequina, que o fã já conhece de outros filmes e atiçando a curiosidade do fã com relação ao Pacificador (John Cena), cuja série spin-off já havia sido confirmada enquanto o filme estava sendo finalizado. E, por isso, talvez ele não ganhe destaque maior com alguma história do seu passado, embora tenha bastante tempo de tela.

Gunn também nos apresenta uma história divertida com um roteiro simples — o grupo é enviado a uma nação sul-americana qualquer para cuidar dos interesses americanos em meio a um golpe militar — que também é marcado por pitadas de humor que variam entre o pastelão da típica piada de tiozão e alguma elegância.

Mas o grande trunfo do “O Esquadrão Suicida” é mesmo seu grau de imprevisibilidade. E não deixamos de nos surpreender até o fim, até as cenas pós-crédito.

“O esquadrão suicida” merece todos os elogios e é um dos bons filmes deste ano. Esperamos que Gunn faça uma sequência. Ainda que ele tenha perdido muitos personagens neste filme. Se bem que, quando se trata de quadrinhos, ninguém morre de fato.

Cotação da Corneta: nota 8.



"Loki" apresenta novo supervilão da Marvel

Dois Lokis é um problema duplo
“WandaVision” foi o aquecimento. “Falcão e o Soldado Invernal” uma história paralela para criar um novo líder e herói. É em “Loki” que a Marvel deu o pontapé inicial na sua nova saga que virá após o desfecho da Saga do Infinito em “Vingadores: Ultinato” (2019).

Única das três séries lançadas até aqui confirmadas com uma segunda temporada, “Loki” teve altos e baixos no seus seis primeiros episódios. Como série, ficou aquém do esperado. Mas no fim revelou-se fundamental para o desenvolvimento da nova fase do Universo Cinematográfico da Marvel graças ao seu episódio final.

(ATENÇÃO QUE A PARTIR DE AGORA TEREMOS SPOILERS)

Foi no episódio final que o Deus da Trapaça se viu diante daquele que será o próximo supervilão da Marvel: Kang, o conquistador (Jonathan Majors).

Até de forma surpreendente, Kang aparece no episódio final da temporada como o grande arquiteto mantenedor da linha do tempo que então se acreditava ser comandado pelos Guardiões do Tempo e sua TVA.

Desmascarada a farsa e revelada que todos os funcionários da TVA são variantes, os dois Loki (Tom Hiddlestone e Sophie Di Martino) se veem num dilema esfíngico proposto por Kang após uma longa explicação dos seus atos: Aceitar a ausência de livre-arbítrio e comandar a TVA ou matá-lo ali imediatamente e fazer com quem as linhas temporais percam o controle com os atos de todas as suas variantes.

Fica a sensação de que Kang sabia o que estava fazendo e saberia qual seria o seu desfecho. Como se quisesse recomeçar toda a sua obra por puro sadismo de viver tudo aquilo de novo.

Assim, o último episódio de “Loki” mostra o pontapé inicial de algo que deve reverberar em todos os filmes e séries da Marvel daqui para frente. Com especial foco em “Doutor Estranho e o Multiverso da Loucura”, previsto para ser lançado em 2022. Ao implodir a única linha do tempo, gerando ramificações infinitas, os heróis devem enfrentar diversas consequências nos próximos anos a partir dos atos de Kang.

Embora toda esta parte seja empolgante, também é preciso falar sobre como “Loki” enquanto série deixou a desejar, após um primeiro episódio muito bom e um segundo bem legal, a série foi se perdendo em episódios fracos. O pior deles foi o que envolveu Loki e Sylvie num mundo próximo do apocalipse. Ali não havia absolutamente nada a se aproveitar e foi uma grande perda de tempo.

Claro que Tom Hoddlestone é carismático e Loki é um ótimo personagem. Sua relação com Mobius (Owen Wilson) rendeu alguns bons momentos no início. E Sylvie, a Lady Loki, foi um acréscimo positivo ao universo. Mas foi pouco para uma série que passou a impressão de ser mais uma escada para futuros acontecimentos da Marvel do que uma história que poderia ter sido mais bem construída em si.

Aliás, as três séries lançadas até aqui neste ano pela Marvel têm muito está cara. No fim, “WandaVision” foi a mais interessante das três. E foi a que pareceu ter uma história mais coesa com começo, meio, fim e uma ideia de para onde vai.

Mas no cômputo geral, a Marvel está devendo em suas séries. As três lançadas até aqui não são ruins, mas não estão no patamar de “Demolidor”, “Justiceiro” ou “Legion”.

Cotação: nota 7.



"Um lugar silencioso: parte II" é uma decepção

Um filme que não sai do lugar
Quando foi lançado em 2018, “Um lugar silencioso” conquistou público e crítica com uma ideia inventiva que possibilitava usar os recursos de som e silêncio numa história de terror passada em um mundo pós-apocalíptico. Ao explorar bem os recursos técnicos e construir um filme muito tenso e com monstros assustadores, porém cegos, que “farejavam” suas vítimas pela sensibilidade que tinham com o mínimo barulho que ouviam, o filme agradou muitas pessoas.

Embora tivesse uma história que se fechava em si mesma, era inevitável que no mundo atual do cinema marcado por dezenas de sequências, prequels e construções de sagas, que o filme ganhasse uma continuação. É uma pena que “Um lugar silencioso: parte II” (A quiet place: part II, no original) seja tão pobre de ideias, convertendo-se uma verdadeira decepção quando colocado em comparação com o primeiro filme.

(ATENÇÃO QUE A PARTIR DE AGORA TEREMOS SPOILERS).

“Um lugar silencioso: parte II” se passa quase imediatamente após os acontecimentos do primeiro filme. Passaram-se apenas cinco dias em relação ao dramático final da história anterior, que terminou com a morte de Lee (John Krasinski, também diretor e que participa do roteiro desta sequência).

Mas antes temos um longo e um tanto quanto desnecessário flashback que não serve para muita coisa a não ser apresentar o personagem de Cillian Murphy. Ali conhecemos Emmett, aparentemente um amigo da família com contatos no exército, mas nada disso será usado mais a frente. Fica a impressão de que Emmett é a figura masculina da vez na ausência de Lee.

Enquanto isso, acompanhamos a tentativa de Evelyn (Emily Blunt) de sobreviver junto com seus três filho. Entre eles Regan (Millicent Simmonds), que dias atrás (no filme anterior para os espectadores) havia descoberto um ponto fraco das criaturas alienígenas, que dá aos humanos uma pequena vantagem na tentativa de exterminá-las.

O maior problema desta sequência é a falta de ideias novas. Se fosse apenas um capítulo de série, daria para dizer que era um bom episódio que continua a história em questão, mas andando de lado, sem avançar muito. Como na verdade é um filme, é um pouco triste ver que ele não avança em praticamente nada na história. Os personagens continuam tendo que fugir sem fazer nenhum barulho, os humanos continuam se escondendo dos alienígenas em silêncio, Evelyn continua tendo que cuidar de um bebê que neste mundo é uma verdadeira bomba relógio e a tensão e os truques do primeiro filme apenas se repetem no segundo.

Do meio para o final do filme, Regan descobre o que pode ser uma solução para destruir as criaturas. Uma ilha de onde uma estação de rádio transmite em looping uma única música. Ela decide ir lá, Emmett a acompanha, a família se separa e parece que teremos uma busca de uma solução para a trama. Ao chegar na marina a procura de um barco, um grupo é atacado pelos monstros e descobrimos que as criaturas não podem nadar. Uma informação que poderia ser relevante, pois isso converteria a ilha numa zona de segurança deste mundo pós-apocalíptico. Mas a informação não é usada como uma forma de os humanos levarem vantagem na luta pela sobrevivência. Pelo contrário, um barco surpreendentemente — ou melhor, convenientemente — chega a deriva com um monstro justamente até a ilha. Soou como um recurso barato de filme B para levar o monstro até lá. Este foi o maior exemplo da falta de ideias que este filme tem. No jogo de forças entre humanos e monstros, não é possível que o roteiro tenha sido tão empacado e ausente de ideias que fizessem avançar a história.

O que fica de bom de “Um lugar silencioso: parte II” é apenas a repetição dos recursos do primeiro filme. O personagem do Cillian Murphy revela-se quase desnecessário em uma história que fica empacada e não traz nada além do que já não foi visto. Para ver mais do mesmo não era necessária uma continuação.

Cotação da Corneta: nota 6.



Viúva Negra e a despedida de Scarlett Johansson da personagem

Scarlett se despede em belo filme
A Viúva Negra sempre foi uma personagem querida e popular dos fãs de quadrinhos. Pelo menos desde o primeiro filme dos Vingadores, lá em 2012, um filme solo da personagem era desejado. A Marvel demorou demais. Mas antes tarde do que nunca. “Viúva Negra” (Black Widow, no original), primeiro filme da fase 4 do Universo Cinematográfico da Marvel, finalmente chegou aos cinemas após diversos adiamentos causados pela pandemia de Covid-19. A longa espera e os diversos contratempos foram compensados por um trabalho que, embora controverso entre os críticos, eu me alinho entre os que gostaram do filme.

“Viúva Negra” é bem escrito, bem dirigido, tem uma história muito legal, tem boas atuações de seus atores, tem excelentes cenas de ação. Em resumo, é a Marvel mais acertando do que errando. “Viúva Negra” se coloca entre os pontos altos do longo universo desenvolvido pelo estúdio e deixa como questionamento qual seria o potencial deste filme se tivesse sido lançado primeiro num momento mais próximo ao tempo em que ele passa, ou seja, após “Capitão América — Guerra Civil” (2016). Em segundo lugar, sobre o que ele teria feito de bilheteria num mundo normal em que todos podem ir ao cinema.

Nunca saberemos. O que é certo é que o filme dá certo em quase todos os seus aspectos e, num momento em que a Marvel lança séries que não atingiram o potencial esperado, “Viúva Negra” mostra que o estúdio ainda tem boa lenha para queimar e aquecer o coração de seus fãs.

Não é por acaso, aliás, que “Viúva Negra” tem entre suas escritoras a mesma Jac Schaeffer responsável por “WandaVision”, a melhor das três séries da Marvel lançadas até aqui no Disney Plus (as outras são “Falcão e o Soldado Invernal” e “Loki”). Junto com Eric Pearson e Ned Benson, Schaeffer aqui acerta de novo ao investigar o passado da personagem estrelada por Scarlett Johansson criando um filme que é sobre famílias despedaçadas que estão tentando se acertar, mas também sobre vingança, passagem de bastão e que se mostra relevante dentro do universo transmedia da Marvel, explicando pontas da personagem que ficaram perdidas ao longo das fases do estúdio (finalmente sabemos o que aconteceu em Budapeste entre Natasha e Clint Barton), e dando à personagem a importância que ela têm dentro dos Vingadores, com suas camadas e sua história complexa.

E neste contexto, Scarlett entregou uma de suas melhores atuações no papel de Natasha. Tudo isso sendo muito bem assessorada por Florence Pugh (Yelena Belova), uma estrela em ascensão, David Harbour (Guardião Vermelho), que surge como o alívio cômico do filme, e Rachel Weisz, que faz Melina Vostokoff, que os fãs dos quadrinhos conhecem como a Dama de Ferro. Além deles, temos um Ray Winstone inspirado como Dreykov, sendo a sua cena com Natasha na parte final uma das melhores do filme.

É ima pena que Scarlett não deve retornar à personagem. Não apenas porque conhecemos o seu destino, revelado em “Vingadores: Ultimato” (2019), mas porque a tendência é que a Marvel a substitua por Pugh. Infelizmente. Acho que as duas podiam conviver juntas, pois Scarlett se mostrou tão importante quanto Robert Downey Jr, Chris Evans e Chris Hemsworth na construção deste Universo do estúdio. Sua Viúva Negra é tão relevante quanto o Homem de Ferro, o Capitão América e o Thor, interpretado pelos três atores aqui citados.

Mas o legado de Natasha tem tudo para continuar com Pugh, Harbour e Weisz, que esperamos que retomem seus personagens em futuros filmes.

Lamentos à parte, “Viúva Negra” pega a personagem num momento completamente quebrada. O filme se passa imediatamente após os acontecimentos de “Guerra Civil”, em que os Vingadores se dividiram por causa do Tratado de Sokovia. A família de Natasha está rompida enquanto ela é forçada a procurar a sua família falsa russa na busca por finalizar uma missão do passado: acabar com o Salão Vermelho, onde mulheres são treinadas cruelmente para virarem assassinas de aluguel de Dreykov.

O filme aqui aproveita para tocar em questões importantes como o tráfico de mulheres e a invisibilidade de jovens que vivem à margem da sociedade e são “recrutadas” para servirem à uma organização que, no fundo, não deixa de ser terrorista, influenciando em toda a geopolítica do planeta com suas ações.

É na tentativa de resolver estas questões do passado, de entender o papel do que Natasha conhece como família, embora sua construção tenha sido muito falsamente criada dentro de um departamento de espionagem do governo russo nos Estados Unidos, que a personagem buscará forças para encontrar a paz interior que precisa para ajudar a resolver o problema com a família que a adotou, a dos Vingadores. E o resto da história nos conhecemos muito bem.

Assim, o filme se equilibra entre acenar para grandes temas e investigar a intimidade de uma personagem que está num momento de reconstrução para poder finalmente se reerguer.

Talvez a única crítica que se possa fazer ao filme seja o papel do Treinador. Um vilão B, mas que dentro deste grupo está entre os mais legais da Marvel, com um poder de copiar tudo de quem ele está enfrentando, merecia um tratamento melhor do que a ideia que lhe deram para o cinema. O Treinador podia voltar em outro contexto, pois ele tem um potencial a ser explorado.

Cotação da Corneta: nota 9.