quinta-feira, 10 de maio de 2012

Marilyn, a mala

Michelle Williams e sua Marilyn Monroe
É um pecado, uma falha grave, mas vou confessar: conheço muito pouco do trabalho de Marilyn Monroe. Quase nada. Minha única e quase esquecida experiência com a mulher que tinha legiões de fãs no planeta na década de 50 do século passado foi ter visto em algum momento da minha vida “Quanto mais quente melhor” (1959), filme do qual eu mal me lembro da história.

Apesar de o seu trabalho ser quase desconhecido para mim, a presença de Norma Jeane Mortenson na cultura pop é tão grande, que parece que eu conheço a vida dela como se tivéssemos sido amigos de infância. Nasceu em Los Angeles, foi amante de John Kennedy, cantou aquele sexy “Parabéns para você” para o presidente, símbolo sexual, desejada por todos os homens da sua época, fotos nuas para a Playboy e, por fim, a morte por overdose de barbitúricos. Isso é basicamente um rápido resumo da atriz.

O que eu não sabia, e agora serei um pouco maldoso sim, é que Marilyn Monroe era uma mala sem alça, mimada, um tanto vazia e atriz até certo ponto medíocre. Essa foi a primeira impressão que o filme “Sete dias com Marilyn” me deixou. Ok, ela era uma mulher problemática, que tinha a clara necessidade de ser amada por todos para suprir a falta de amor que teve em casa na sua infância, adolescência e por aí vai. Quando Norma cresceu virou uma personagem. Mas no fundo era uma mulher tristemente frustrada porque todos amavam Marilyn e não Norma. Imagina o Édson em conflito com o Pelé com tinturas freudianas, entende?

Essa carência é outra ferida bem exposta no filme de Simon Curtis. Marilyn quer a atenção de todos e quase uma overdose de amor, um culto a si mesma para compensar as perdas da juventude. Tanto é que quando o jovem Colin (Eddie Redmayne, tão expressivo quanto um picolé de chuchu) se propõe a cuidar dela e a pede para largar a vida de estrela, Marilyn recua. Mas diante da postura do jovem de que então vai seguir a vida e não quer mais saber dela, a atriz pede ao menos uma “troca de olhares”. Norma não consegue largar a personagem mesmo na intimidade. E não tem pena dos corações que vai devastando no caminho, embora ela aparentemente não tenha consciência da dor que causa, pois na verdade se alimenta e precisa desse amor que a cerca.

“Sete dias com Marilyn” é um belo filme. A película se passa durante a gravação de “O príncipe encantado” (1957), cinco anos antes da morte da estrela. Naquele tempo, Marilyn, vivida por Michelle Williams, já era uma estrela mundial que buscava o reconhecimento artístico e contracenava com Laurence Olivier (Kenneth Branagh, o grande ator do filme), ator que tinha o respeito da crítica, mas almejava se tornar uma estrela do cinema.

O filme se centra na viagem de Marilyn para a Inglaterra e na sua experiência no set de filmagem inglês com Olivier e os conflitos com a forma de trabalho no set e o chamado método de Paula Strasberg, uma mala puxa-saco dela no filme, que era responsável por fazer uma atriz medíocre como ela ter momentos de brilho em suas películas por fazê-la aceitar, acreditar e “entrar no personagem”. Era o chamado “Método” que podia dividir os artistas e até dar uma impressão de propaganda negativa neste filme sobre a estrela hollywoodiana, mas muita gente boa o defende e é adepto. É o caso de Al Pacino. Já o vi dar entrevistas elogiando muito essa forma de trabalhar.

"Sete dias..." tem essa linha mestra centrada em Marylin Monroe, mas através dela várias camadas dramáticas vão se descortinando. O próprio Olivier revela a sua insegurança. Em 1957, ele tinha 50 anos e quis usar Marilyn não apenas para tentar finalmente se tornar um astro, mas também para parecer mais jovem num trabalho que ele já tinha tido sucesso de crítica através de uma peça de teatro em que encenou com a sua então mulher Vivien Leigh (Julia Ormond), estrela de, entre outros filmes, “E o vento levou...” (1939), e que foi rejeitada pelo próprio Olivier por ser muito velha para o papel no cinema. Na época ela tinha 44 anos e reconhecia com uma ponta de amargura não poder competir com a jovem estrela de apenas 31 anos.

E assim Curtis vai expondo as fragilidades destas estrelas. Se Marilyn é um poço de problemas que só sessões de análise resolveriam, Olivier também sofria por sua vaidade e temia ser esquecido por se achar já velho para as câmeras. Vivien, por sua vez, sentia-se rejeitada pela escolha do marido, tinha ciúmes, pedia para Colin vigiá-lo, pois claramente o marido desejava aquela jovem. E quem não desejava Marilyn na flor da idade? Três anos depois do lançamento do filme, Vivien se separou de Olivier.

Se Kenneth Branagh é o cara da película, Michelle Williams, de 31 anos, não fica muito atrás do ator. Marilyn Monroe talvez seja o seu grande papel na carreira até aqui. Michelle conseguiu mostrar as fraquezas da estrela que encantava Hollywood, assim como exibir a atriz que tinha um carisma sem concorrência no seu tempo. E sempre que necessário fazia a transição com extrema facilidade como na cena em que ela visita o colégio em que Colin estudou. Quando é reconhecida pelos alunos, a mulher que está ali encantada com a vida comum do seu colega, logo se transforma “nela”, distribuindo encantadores sorrisos e beijos para a plateia ávida por ter um pedaço de Marilyn para si.

Michelle não chegou a “incorporar” Marilyn como o “Método” exige, mas deu sua própria visão para a estrela 50 anos após a sua morte. De certa forma, Marilyn Monroe ganhou o amor e a admiração eterna uma vez que sua história ainda desperta muito interesse. Após as gravações de "O príncipe encantado", Marilyn ainda estrelaria mais três filmes. Entre eles "Quanto mais quente melhor", um dos seus grandes sucessos.