segunda-feira, 6 de junho de 2011

See you later alligator…

Uma vez por ano o signatário deste blog tem o péssimo hábito de tirar férias. Fazer o quê? Eu estou apenas cumprindo as determinações trabalhistas desde que esse negócio de descanso batizado de férias foi criado em 1889.

Mais uma vez inspirado no espírito do herói de natureza selvagem Chris McCandless - mas sempre com o objetivo de um final feliz - é chegado o momento de vasculhar novos cantos, jogar em novas plagas e buscar a inspiração perdida em algum ponto dessa história.

Até lá, este blog, o Twitter da Alcova e o Facebook ficam parados. Pelo menos essa é a minha intenção e pretendo cumpri-la. Não haverá internet, telefone, nada que me faça conectar pelas próximas três semanas.

Sendo assim, como diria uma antiga e querida professora de inglês que não vejo há tempos, see you later alligator, after while crocodile...


E fiquem com as trilhas sonoras das férias logo abaixo. Para começo de conversa, tem "Kashmir", do Led Zeppelin. Na sequência, Roger Waters e David Gilmour tocando "Comfortably Numb", Pearl Jam com "Oceans", Dick Dale com "Miserlou" e, fechando, Soundgarden com "Black Hole Sun".








domingo, 5 de junho de 2011

Um bom Mel Gibson

Esqueça por 90 minutos o imbecil que Mel Colm-Cille Gerard Gibson se tornou participando de lamentáveis episódios de espancamento de namoradas. Tente esquecer por 90 minutos o patético antissemitismo do ator americano de 55 anos que dirigiu aquele banho de sangue chamado “A Paixão de Cristo” (2004). Seja superior a ele, dispa-se dos preconceitos e observe em “Um novo despertar” o bom ator que Mel Gibson pode ser quando quer e encontra uma boa história pela frente.

Terceiro trabalho como diretora de Jodie Foster, “Um novo despertar” conta a história de Walter Black, um diretor de uma fábrica de brinquedos maluco, depressivo e com tendências suicidas que um belo dia, depois de ver toda a sua vida familiar e profissional destroçada pelo seu comportamento auto-destrutivo resolve dar a volta por cima de um jeito peculiar: sendo ventríloquo da própria vida através de um castor de pelúcia. Daí o nome original do filme ser “The Beaver”, “O Castor” em inglês.

A ideia de Walter é esquecer todo o passado e começar de novo. Guardar todas as lembranças numa caixa hermeticamente fechada dentro do cérebro e reiniciar a vida, dar o reboot a partir daquele ponto, a partir do momento em que o castor assume o comando dela.

Pode soar uma ideia patética e realmente quem não embarca na viagem do filme o acha alternado entre o ridículo e o sentimento de descrença do tipo “isso não acontece na vida real”. Mas, convenhamos, isso é cinema né. Se você não embarca nessa aposta meio doidona, vai viver a sua própria vida e seja feliz.

E é em Gibson que Jodie Foster aposta para que o discurso do roteirista Kyle Killen tenha alguma veracidade dentro do cenário esquizofrênico que Walter Black vive. Mais do que a depressão é a loucura o seu grande mal. O novo despertar de Walter nada mais é do que um universo paralelo inventado pela sua mente doentia para que ele pudesse viver mais um pouco na sociedade e adiar o inevitável encontro com o manicômio mais próximo.

Em meio a tudo isso, há uma família tentando se reestruturar. A própria Jodie Foster vive Meredith, a esposa de Walter que sustenta a família e busca um pouco mais de carinho de todos, entre eles o filho mais velho, Porter (Anton Yelchin), que por não gostar das atitudes e da vida que o pai leva persegue obsessivamente em si todos os sinais possíveis que o possam fazer ser parecido com ele para eliminá-lo.

O próprio Porter é um desajustado que tem a incrível capacidade de mimetizar as ideias difusas dos seus colegas de escola e transformá-las em belos trabalhos ou textos, como o que prepara para Norah (Jennifer Lawrence), a paquera do jovem e ela também uma desajustada artista de pichações de rua que cerceia a sua arte e quer se ver distante dela após a trágica morte do irmão mais novo.

Enquanto a vida de Meredith com o Walter/Castor vai melhorando e o filho mais novo, Henry, descobre um novo pai que ele não conhecia e o ajuda a construir coisas e liberar sua criatividade, Porter não consegue aceitar que a mãe tenha aberto a casa para novamente receber o pai que por anos foi um estorvo na família. É aqui que Jodie Foster abre caminho para uma lavagem de roupa suja da família Black que para ela pode servir de espelho para muitas famílias de todos os cantos do planeta.

Mas é claro que Meredith vai se cansar da vida de ventríloqua, vai querer o marido de volta, mas não vai perceber que o sonho temporário de um tratamento para atingir uma cura era uma utopia e que o caso de Walter é mais grave do que ela podia imaginar.

E Gibson mostra que por trás daquele monstro descrito lá em cima ainda vive um bom ator que diante de um papel como esse ainda pode mostrar algumas qualidades como no passado. Lembre do guerreiro escocês William Wallace em “Coração Valente” (1995), filme pelo qual ele ganhou um Oscar de direção e outras quatro estatuetas. Lembre de como nos divertimos com Martin Riggs, o impagável policial porra-louca dos cinco filmes da série “Máquina Mortífera”, ou do seu divertido Bret Maverick, em “Maverick” (1994), quando contracenava com a amiga Jodie Foster. Do herói Benjamim Martin de “O Patriota” (2000) ou “O preço de um resgate” (1996) e “O Troco” (1999). E não esqueça de Mad Max. Nunca se esqueça de Mad Max e a trilha sonora da velha Tina Turner.

Interpretações que mereciam ganhar um Oscar? Provavelmente não, mas trabalhos honestos que representam um pouco mais do que qualquer idiotice que esse cara tenha feito para manchar a própria carreira e agora precisar do apoio de amigos como Jodie para mostrar que diante de uma câmera ainda pode dar um caldo.

E assim voltamos a “Um novo despertar”. Que o título em português sirva de inspiração para Mel Gibson olhar para trás e começar de novo. Mas sem esquecer o passado, nem enlouquecer de vez como Walter Black.

sábado, 4 de junho de 2011

A primeira aula

Inaugurada em 2000, a franquia dos X-Men se tornou uma das melhores entre as adaptações dos quadrinhos apoiada não apenas nos efeitos especiais, mas no bom desenvolvimento da história sobre os mutantes que “usam os seus poderes para proteger a humanidade que os teme e odeia” – e no que isso gera num debate acerca do racismo e de uma suposta pureza genética em substituição ao ideal nazista da supremacia ariana – e nas ótimas atuações dos seus três principais atores: Hugh Jackman (Wolverine), Patrick Stewart (professor Charles Xavier) e Ian McKellen (Magneto).

Capitaneada por Bryan Singer no início, a trilogia só deu uma escorregada no terceiro filme, dirigido por Bratt Rattner, quando optou por ser meramente um filme de ação e deixou de lado assuntos bons para serem explorados como a saga da Fênix do ponto de vista puramente dos quadrinhos ou a questão da cura dos mutantes, que seria uma continuidade daquele debate com o racismo como pano de fundo.

Apesar desse leve desvio de rota, a franquia fez sucesso arrecadando muito dinheiro nos cinemas do mundo inteiro e sair dos trilhos para pegar uma nova rota seria uma aposta ousada e ainda bastante arriscada. Mas foi esse o desafio que o mesmo Bryan Singer dos dois primeiros filmes se impôs ao ajudar a escrever a história da origem dos jovens mutantes que formariam o supergrupo X-Men e dos próprios mutantes na Terra na década de 60 do século passado em “X-Men: primeira classe”, que acaba de entrar em cartaz.

Como se trata do início da história do grupo, o filme dirigido por Matthew Vaughn não pôde contar com a trinca de atores que carregaram a trilogia nas costas até 2006 (a não ser por uma hilária ponta de Jackman no papel de Wolverine) e aposta em novos e menos midiáticos mutantes para reiniciar uma história do zero e contar a origem de tudo.

O resultado dessa aposta é mais do que satisfatório. “X-Men: primeira classe” não deve nada aos três primeiros e ganhou em James McAvoy (o novo professor X) e Michael Fassbender (o novo Magneto) substitutos a altura dos mestres Stewart e McKellen.

Base do primeiro filme dos X-Men, o confronto de ideias e estilos dos amigos e rivais Charles e Magneto é mais uma vez a linha mestra que permeia o trabalho de Vaughn. O diretor usa os dois personagens para mostrar que eles se tornarão líderes de todas as gerações de mutantes que dali nasceriam sempre num confronto entre fazer o que é certo e proteger a humanidade apesar da aversão, temor e horror que ela tem pelos nascidos com o gene X a mais, ou simplesmente esmagá-las porque os mutantes são a nova ordem, um estágio a frente da civilização e superiores, logo, devem prevalecer como espécie dominante numa corruptela da teoria darwiniana da evolução das espécies e, por que não?, uma versão mutante do nazismo.

A primeira turma dos X-Men com o seu olhar 43
No meio dos dois, há um inspirado Kevin Bacon (e há quanto tempo eu não digo isso) vivendo Sebastian Shaw, o líder do Clube do Inferno, cujo plano é simplesmente destruir a humanidade provocando uma guerra nuclear entre Estados Unidos e União Soviética. Estamos nos anos 60 e a real crise dos mísseis de Cuba é usada como plano perfeito para inserir os até então escondidos e párias mutantes na história da humanidade.

Com uma identidade alemã, Shaw foi também um oficial nazista e responsável pela morte da mãe de Magneto, quando o jovem judeu Erik Lehnsherr viu sua família ser jogada num campo de concentração nazista. O filme, aliás, começa exatamente como o primeiro trabalho dos X-Men. Desconfio até que seja a mesma cena. O início da película mostra a origem de Magneto e a primeira vez que Erik manifesta os seus poderes (os poderes de todos os mutantes começam a surgir na adolescência deles).

O episódio do assassinato da mãe é o que vai mudar toda a história de Magneto, que crescerá sempre em busca da vingança e nunca confiará na humanidade porque ele sempre vai acreditar que quem é capaz de jogar pessoas diferentes (no caso judeus) numa câmara de gás, muitos deles depois de sofrerem com experimentos científicos, fará o mesmo ou pior com os mutantes se estes não se defenderem.

Charles, porém, acredita no trabalho em conjunto, na bondade da maior parte da humanidade e que exatamente por serem um avanço na genética, os mutantes precisam dar o exemplo, colaborar, proteger os humanos e ensiná-los a não temer o que é diferente deles.

Apesar das diferenças e da sede de vingança de Erik, até o fim do filme os dois ainda estarão juntos. A película mostra exatamente a migração de Magneto para, digamos, “o lado negro da força”, logo após ser o responsável pela irreversível lesão na coluna de Xavier e o assassinato de Shaw. Até lá, eles recrutam mutantes para formar a primeira turma de alunos dos X-Men.

Assim ficamos conhecendo personagens que não haviam aparecido antes ou fizeram pequenas pontas, como o Fera (Nicholas Hoult), Banshee (Caleb Landry Jones) e Destrutor (Lucas Till), que é Alex Summers, irmão de Scott, o Ciclope conhecido por todos os fãs dos quadrinhos. No filme também aparece pela primeira vez com destaque a doutora Moira McTargget (Rose Byrne), que virá a ser uma grande parceira de Xavier e comandará uma divisão da futura escola para jovens superdotados dele na Ilha Muir, na Escócia. Além de Mística, vivida pela indicada ao Oscar deste ano por “Inverno da Alma” Jennifer Lawrence, que tem sua origem e passagem do lado dos bons para o dos maus contada também em “Primeira Classe”, e da Rainha Branca/Emma Frost (January Jones, numa interpretação patética e parecendo uma boneca de porcelana), uma telepata tão poderosa quanto Xavier.

Todos, porém são meros coadjuvantes perto das ótimas interpretações de McAvoy e Fassbender que monopolizam o filme e o tornam ainda mais interessante porque conseguem passar a ternura da amizade sincera entre os dois personagens junto com as diferenças de ideias e o afastamento sem que isso abalasse um profundo respeito mútuo e a sinceridade e reconhecimento da importância de um para o outro.

Resta saber agora o que Vaughn - ou outro diretor - fará no próximo passo dessa nova seqüência dos X-Men. Agora os caminhos das estradas estão delimitados e Magneto precisará colocar o seu plano em ação. Se a história seguir para um próximo momento do grupo de mutantes, será a hora de entrarem em cena o Homem de Gelo, Ciclope, Fênix e Arcanjo, que junto com o Fera formaram o passo seguinte dos X-Men. Mas será que o estúdio vai deixar mais uma vez o personagem mais interessante de todos, o Wolverine, de fora?