quinta-feira, 21 de novembro de 2019

Tim Miller ignora sequências e tenta dar um fim/novo começo à saga do Exterminador

Dani, Grace e Sarah, heroínas da resistência
A essa altura, em pleno 2019, é difícil saber o que aconteceu ou a ordem exata dos acontecimentos após seis filmes do Exterminador do Futuro. Tirando a trilogia clássica iniciada por James Cameron e que teve Jonathan Mostow com diretor do terceiro filme, “A rebelião das máquinas” (2003), a franquia foi tomando outros rumos em que a gente fica se perguntando se de fato a Skynet prevaleceu em algum ponto no futuro ou se impediram mesmo o futuro apocalíptico das máquinas dominando o planeta. 

Batizado de “Destino Sombrio” (“Terminator: Dark Fate”, no original), o novo Exterminador tenta dar uma visão sobre tais acontecimentos. Ao mesmo tempo em que tenta encerrar a história, aponta para um futuro digamos.... sombrio. Afinal, somos humanos e temos uma incrível capacidade de fazer bobagens quando recebemos uma tecnologia de ponta em nossas mãos. Ou nem isso. 

Para isso, o diretor Tim Miller e James Cameron, que está entre os sete criadores da história deste filme, ignorou tudo o que aconteceu em “Rebelião das máquinas”, “A Salvação” (2009) e “Gênesis” (2015). Tudo foi considerado fora do cânone do Exterminador. Focou apenas nos  dois primeiros filmes, lançados, respectivamente, em 1984 e 1991, trouxe de volta a atriz Linda Hamilton, a the one and only Sarah Connor (sorry Emilia Clarke), e apontou para os desafios vindouros. 

E qual o resultado disto? Primeiro, um filme divertido. “Destino sombrio” é bem legal para quem é fã de explosões, perseguições, o famoso “tiro, porrada s bomba” e da resistência implacável do vilão que só encontramos na franquia Exterminador do Futuro. 

Aqui ele é vivido por Gabriel Luna, em sua versão Rev-9, uma máquina de combate implacável feita de fibra de carbono e capaz de se dividir, se amalgamar e se moldar de acordo com o ambiente. Ele é praticamente imparável e indestrutível. Sua versão faz o modelo T-800 de Arnold Schwarzenegger parecer um robozinho inofensivo. 

(E agora atenção para os SPOILERS).

He is back
Na história repaginada, Sarah Connor conseguiu impedir o apocalipse da Skynet, porém, em 1997, um Exterminador surge e mata o seu filho John, o futuro líder da resistência. 

Só que mesmo com o futuro alterado, a humanidade não aprende. E daqui a quatro décadas, uma nova ameaça surgirá a partir de uma guerra cibernética. A Legião é o vilão da vez e para isso um Exterminador volta a 2019 para tentar mudar o futuro. Com ele, claro, vem alguém para defender uma pessoa importante para a resistência humana. 

Ao contrário do T-800, Grace (Mackeinzie Davis, grande aquisição para a franquia) é uma humana “melhorada”. Cheia de componentes eletrônicos e amalgamada com equipamentos tecnológicos que a fazem ser mais forte, rápida e precisa. Ainda assim, isso não é suficiente para combater o mal. É aí que surge Sarah Connor. 

Sua entrada é absolutamente triunfal. Com direito a uma citação da frase clássica de Schwarzenegger : “I´ll be back”. 

Trazer Linda Hamilton de volta foi um dos acertos para a história. Ela é a cara da saga junto com Schwarzenegger, que agora aparece como um androide aposentado que é chamado de volta a batalha para cumprir a missão de salvar Dani (Natalia Reyes), a nova peça-chave no tabuleiro da resistência humana no futuro. 

A participação do veterano ator austríaco é um deleite para os fãs, mas funciona de forma muito ruim para o filme. Não convence muito o fato de encontrarmos um Exterminador que havia matado John Connor e agora tenta se redimir e passou a entender melhor os humanos.

Mas é claro que o personagem se segura bem apesar disso. O trocadilho com sua frase famosa, a brincadeira com os óculos escuros e, por fim, o trabalho impecável de Schwarzenegger .no papel Para um ator de filmes de ação que nunca teve muito talento dramático como o seu outrora par do passado Bruce Willis, nada como um androide de fala robótica para que ele se sinta totalmente à vontade. Para alguém que não é exatamente um Al Pacino da emoção, a melhor coisa que existe é interpretar um personagem sem emoção ou arroubos faciais. Não há papel em que Schwarzenegger se sinta mais à vontade. 

Com isso, “Exterminador do Futuro: destino sombrio” cumpre o seu papel de entreter, dar um destino para os personagens clássicos e apontar para o futuro. Na era atual, deixar as franquias em aberto é fundamental para a sua continuidade. Se é que algum dia isso virá a acontecer. 

Mas com Sarah Connor no comando, a resistência nunca acaba até que o futuro esteja assegurado. E a humanidade aprenda a não se destruir. 


Cotação da Corneta: nota 6,5

quinta-feira, 14 de novembro de 2019

A fábula fofinha e rasa de Woody Allen

Selena e Chalamet no meio da chuva
Ser um diretor prolífico é bom para os fãs, mas também pode causar um cansaço de quem olha, ou fazer o próprio autor cair em fórmulas repetitivas. Nos últimos 37 anos, só teve um em que Woody Allen não lançou um filme. Foi justamente o ano passado. Mas também pode-se dizer que desde 2011, quando lançou “Meia-noite em Paris”, que o diretor americano não traz ao cinema algo verdadeiramente brilhante. “Blue Jasmine” (2013) e “Roda Gigante” (2017) têm seus bons momentos, é claro, mas muito mais calcados na interpretação de suas atrizes principais, Cate Blanchett e Kate Winslett, do que propriamente em suas histórias. 

“Um dia de chuva em Nova York” (“A rainy day in New York”, no original) é mais um filme médio do diretor. Não é ruim como “Magia ao luar” (2014), mas está longe de ser marcante na filmografia de Allen. É mais um conforto para seus fãs passarem duas horas agradáveis e sem grandes conflitos numa sala de cinema do que propriamente um filme para entrar em qualquer lista de best of do diretor. 

“Um dia de chuva em Nova York” é uma fábula onde Allen discorre sobre duas visões de mundo. Uma pessimista e outra otimista. Para expor suas ideias, seus personagens usam a linguagem do cinema. Chan (Selena Gomez) quer ver o mundo como um conto de fadas em que tudo dá certo e o casal romântico se beija no fim. Gatsby (Timothée Chalamant, em uma interpretação que é um dos pontos altos do filme), já vê o mundo de uma forma mais cinica e niilista. 

Tudo é fruto de como eles se encaixam no mundo. Chan sabe que não é exatamente a garota perfeita que encanta todos, mas tem noção do seu valor e sabe se encaixar no mundo. Gatsby, por outro lado, teve tudo na vida, mas parece não se encaixar naquele mundo. Ao mesmo tempo em que é um jovem rebelde sem causa cheio dos sintomas do chamado “white people problems”. 

E este é um dos problemas do filme. É difícil se encaixar na fábula bourgeois de Allen onde ninguém realmente sabe o que é viver uma real dificuldade. Além de ser rico, Gatsby ganha dinheiro facilmente num estalar de dedos porque é um ás no poker e tem uma sorte que o acompanha o tempo todo para justificar os excêntricos gastos que faz durante todo o filme. Além, é claro, de uma família rica por trás. Tudo lhe vem fácil. Fácil até demais. A ponto de ele de fato não enfrentar um desafio realmente importante que não seja um auto-conhecimento que, ainda assim, é muito raso para os padrões e reflexões que Allen costumava nos dar.

Não é que os ricos não possam ter voz no cinema. Longe disso. E estamos falando de Woody Allen e não de um Ken Loach, cineasta mais afeito a filmar os dramas da classe trabalhadora. Seu cinema sempre refletiu essa burguesia com um certo cinismo e um texto criativo. Porém, falta algo que justifique esse filme para além de uma mera fábula que procura dar beleza aos dias de chuva, tão odiados por todos.

E é este ponto do texto que faz falta em “Um dia de chuva em Nova York”. Salvo raros momentos, seu roteiro não tem as boas tiradas que o diretor mostrou em filmes passados e falta a sua história um pouco mais de conflito que vá além de pessoas flanando por Nova York discutindo de forma desinteressante sobre a vida e cujo único contratempo é uma chuva torrencial. 

No meio disso, está o outro vértice de um triângulo amoroso. Ashleigh (Elle Fanning) é uma jovem jornalista do interior deslumbrada pela oportunidade de entrevistar um dos seus diretores de cinema favoritos, Rolland Pollard (Liev Schreiber). Através dele, Ashleigh se imiscui no jet set cinematográfico de Nova York a ponto de se transformar numa caricatura de si mesma enquanto Allen a usa para tecer seus pensamentos sobre o trabalho da imprensa. 

“Um dia de chuva em Nova York” é cercado de homenagens. A começar pelo nome de um dos seus personagens principais. Chalamet interpreta um jovem chamado Gatsby Welles. O primeiro nome é um conhecido personagem criado pelo escritor F. Scott Fitzgerald no romance “O grande Gatsby” (1925). Tal como o Gatsby de Allen, o de Fitzgerald também era um bon vivant que circulava entre a high society e tinha um gosto pelo submundo a ponto de quebrar regras. Fitzgerald é um dos grandes nomes da literatura norte-americana.

Já o sobrenome é uma homenagem a Orson Welles, diretor de clássicos como “Cidadão Kane” (1941), filme que também reflete sobre o jornalismo. Welles é um dos mais conhecidos diretores de cinema e não é à toa que o personagem de Chalamet é um apaixonado por filmes antigos. 

Chalamet, aliás, interpreta também um alter-ego de Allen. As ideias pessimistas dele estão ali, o jeito de andar pela cidade e de se vestir também. Ele é uma cópia de personagens vividos pelo diretor em filmes como “Noivo Neurótica, Noiva Nervosa” (1977). 

Donde se vê, portanto, que “Um dia de chuva em Nova York” tinha muito potencial. Mas os temas abordados (jornalismo, visões de mundo, lições da vida) acabam ficando apenas numa camada superficial a partir de um roteiro pouco inspirado. 

É um filme agradável e bonito como costumam ser os filmes de Allen. E só o diretor para encontrar beleza na chuva. Porém, “Um dia de chuva em Nova York” ficou devendo um mergulho mais profundo nas questões que aborda. Acabou prevalecendo a doçura de uma história de amor tradicional. 


Cotação da corneta: nota 6,5