sábado, 8 de outubro de 2022

"Não se preocupe, querida": Algumas boas ideias e altos e baixos

Pugh faz a sua parte e Styles não acompanha
Atriz presente em uma série de projetos populares, Olivia Wilde vem, desde 2019, se arriscando no trabalho de diretora. “Fora de série” (“Booksmart”, no original), seu primeiro filme lançado há três anos, era uma típica comédia adolescente sobre uma passagem importante na vida de duas jovens: o período entre a formatura da escola e o início na universidade. No filme, as duas protagonistas tentam viver todas as emoções que não viveram até então enquanto refletem sobre os desafios daquela fase da vida.

Embora não seja exatamente um grande filme, “Fora de série” é despretensioso e divertido. E mostra um pouco das pretensões de Wilde como diretora. Contar histórias femininas, refletir sobre o que as mulheres pensam, mostrar um protagonismo feminino numa seara quase exclusivamente masculina neste gênero específico de filme.

“Não se preocupe, querida” (Don’t worry darling, no original), seu mais recente trabalho é um passo além nas suas ideias. A intenção permanece a mesma, mas aqui Wilde vai além nas suas reflexões no sentido de mostrar alguns perigos da vida adulta vividos pelas mulheres.

Para isso, Wilde traça uma alegoria. Uma sociedade distópica com ecos em “Matrix” (1999) onde tudo é estranhamente perfeito, simétrico e rotineiro. Wilde faz questão de pontuar muito fortemente a rotina a ponto de até entediar e/ou causar incômodo no espectador. Rotina esta que sofre pequenas rupturas. Algumas com mais estranhamento, como os ovos quebrados sem gema, outras que parecem mais comuns: uma carne queimada, um salto temporal, sonhos e ilusões.

A primeira hora de “Não se preocupe, querida” é tomada pelo incômodo e a ambientação plastificada e perfeita do tal projeto Vitória comandado por Frank (Chris Pine).Ali acompanhamos Jack (Harry Styles) e Alice (Florence Pugh), um casal completamente feliz, parecendo em eterna lua de mel, e sua vida burguesa e cercada de casais de amigos numa comunidade criada no deserto.

Tudo parece muito falso. Alice é a esposa perfeita de uma comunidade solar e parada nos anos 50 do século passado. Lava, passa e cozinha, devotada ao marido, cuida dele. Jack é um bem-sucedido engenheiro que trabalha num projeto secreto, sobre o qual não pode falar nem para a própria esposa.

Desde o início, naquela rotina de dona de casa eterna e repetitiva, tudo parece estranho. E Wilde vai bem em esconder o jogo ao mesmo tempo em que revela pequenas fraturas naquela sociedade perfeita. A mais grave, e que desperta o interesse de Alice, é o surto de Margaret (Kiki Layne).

A partir daí vamos descobrindo a verdade por trás desta comunidade utópica. Por outro lado, é exatamente no momento desta virada que o filme, ao mesmo tempo em que exibe algumas ideias interessantes para a história e para refletir sobre a violência e opressão masculina sobre a mulher, mostra-se apressado e despejando muitas coisas para processar a história. Era como se ele tivesse um ritmo e depois precisasse acelerar demais para acabar e concluir todas as pontas para não deixar nada solto.

É uma pena, pois a ideia por trás do filme era boa. Ainda que q sua realização tenha sido problemática, como as fofocas e disse me disse de bastidores do set. Não entrarei neste mérito. Mas se isso interferiu ou não no trabalho dos atores, o que vemos é apenas uma Florence Pugh que entrega algo minimamente aceitável. Ela e a própria Olivia Wilde no papel da melhor amiga de Alice, Bunny, são o que o filme tem de melhor.

Styles, por sua vez, é constrangedor como ator. Zero emoções, zero expressões para além do básico e sem conseguir acompanhar a versatilidade de Pugh, atriz competente que consegue tomar para si os holofotes nos filmes em que tem participado. Enquanto Pine parece um vilão barato de James Bond.

O mais interessante mesmo de “Não se preocupe, querida” é ver a evolução de Wilde como diretora. Ainda que seja possível questionar algumas de suas escolhas na tela, ainda penso que este filme é um avanço de alguém que está construindo a própria voz cinematográfica e amadurecendo a sua linguagem.

Nota 6.