Ciúme, inveja e muita sabotagem |
É
curioso pensar que o filme mais convencional e menos "insano" de Yorgos Lanthimos
esteja sendo o mais bem sucedido de sua carreira. De fato, “A favorita” (The
favourite, no original), que vem colecionando premiações. Já são um total de
134, com direito a um Globo de Ouro para a atriz Olivia Colman e sete prêmios Bafta,
O filme ainda ganhou dez indicações ao Oscar. Mas “A favorita” está longe de
ter as complicações, os sadismos e de causar aquele desconforto que tinham os seus
trabalhos anteriores, “O sacrifício do cervo sagrado” (The killing of a sacreddeer) e “O lagosta” (The Lobster). Com um filme mais palatável e que não foi
escrito por Lanthimos e seu parceiro dos últimos trabalhos, Efthymis Filippou,
o diretor grego acabou conseguindo a chance de ganhar mais simpatia dos membros
da academia.
E
isto prova que por mais que o Oscar tente ser eventualmente mais simpático a
outros tipos de produção com menos cara de Oscar - e a indicação de “Pantera
Negra” a melhor filme sinaliza para isso - a academia tem sempre seus limites.
Filmes em que você tem que decidir sobre a morte ou não de um membro da família
com ecos na mitologia grega como “O sacrifício do cervo sagrado” ou com
roteiros um pouco mais intrincados como “O Lagosta” ainda não chegam tão
longe. Tudo, no entanto, pode mudar com os ventos.
Mas
é claro que “A favorita” não deixa de ser um bom filme por causa disso. Se há
uma marca de Lanthimos neste filme é a ironia e o quase desprezo com que seus
personagens são tratados. Lanthimos é quase maravilhosamente cruel ao
ridicularizar a realeza com uma sutileza e ao mesmo tempo um tom caricatural de
um grande chargista. Tudo com direito a algumas tomadas que remetem a um
espectador que parece estar apenas a espreita, olhando pelo buraco da fechadura
e cenários de um exagero kitsch, um luxo que beira de forma provocadora ao mau gosto.
Nas
suas mãos, toda a tradição da monarquia é patética. Da forma como a rainha deve
ser tratada (nunca se virar para ela, não olhar para ela sem ser solicitado) a
maquiagem ridícula dos homens e até uma pífia corrida de patos e de lagostas.
Tudo soa kitsch como se Lanthimos nos dissesse: “Como sustentamos esse teatro
ridículo por tantos séculos e ainda hoje?”
No
centro de “A favorita” está uma disputa que envolve ódio, ciúme, inveja entre
duas mulheres, Lady Sarah (Rachel Weisz) e Abigail (Emma Stone) pela atenção da
rainha Anne (maravilhosamente vivida por Olivia Colman). A briga de é ridícula,
infantil. Pior, de crianças ricas e mimadas.
Desde
o princípio estabelece-se uma rivalidade entre as duas primas distantes. Uma
querendo manter o poder de influência sobre a rainha e, por consequência, sobre
o governo, que enfrenta uma batalha militar contra a França. A outra, uma ex-lady
que perdeu tudo em algum casamento fracassado querendo recuperar o dinheiro e o
status que outrora tivera. Tudo é sobre poder, influência e riqueza.
Para
isso, as duas usam todas as armas que tem. Se sabotam, se ironizam, tudo com o
olhar perceptivo da rainha, que adora a disputa das duas para seduzir ela. No
fundo, a rainha tem uma sagacidade ao mesmo tempo em que Lanthimos expõe as
esdrúxulas excentricidades dos monarcas.
No
fundo, a questão da guerra dentro e fora do palácio tem mais a ver com o humor
da rainha e os jogos políticos e extra políticos dentro do palácio do que
propriamente uma questão prática e objetiva. Mas é assim em qualquer cenário
político, poderíamos argumentar? Sim, mas quando se trata da realeza isso ganha
ainda mais proporções nas futilidades e excentricidades da corte.
Lanthimos
filmou o ridículo com uma mistura de sátira e veneno e, melhor de tudo, fazendo
com que tudo pareça muito sério. Não é o seu filme mais interessante, mas como
não se deliciar com a exibição do luxo e do kitsch numa corte de valores fúteis
e miseráveis como a construída pelo diretor grego?
De
fato, Lanthimos conseguiu de novo. E sobre isso só podemos aplaudir.
Cotação
da Corneta: nota 8.
Indicações
ao Oscar: melhor filme, atriz (Olivia Colman), diretor (Yorgos Lanthimos),
atriz coadjuvante (Emma Stone e Rachel Weisz), roteiro original, edição,
fotografia, figurino e direção de arte.
Nenhum comentário:
Postar um comentário