segunda-feira, 22 de março de 2010

Franz Ferdinand a cada dia melhor

Como é bom assistir a um show sem aquela aberração na frente do palco chamada área vip. A apresentação do Franz Ferdinand na madrugada de sábado na Fundição Progresso deveria ser gravada e mostrada a todos os organizadores de espetáculos no Brasil para eles verem o que é um verdadeiro show de rock. O ponto alto seria o mosh duplo do cantor e guitarrista Alex Kapranos e do guitarrista Nick McCarthy no fim. Você consegue imaginar alguma banda fazendo um mosh na área vip? Provavelmente os mauricinhos e patricinhas amontoados na frente reclamariam.

Como eu dizia, o que se viu na Fundição Progresso foi um verdadeiro show de rock como se vê pouco hoje em dia. Sim, porque por mais que uma banda se esforce nos mega concertos da Apoteose, Maracanã ou qualquer outro lugar, é fato que os shows andam mais frios desde que criaram aquele entreposto entre o verdadeiro fã e seu artista. Lembremos do Police e dos Rolling Stones, por exemplo. Mick Jagger ali apontando para o fundo como se quisesse falar com seu verdadeiro público. Na Fundição isso não aconteceu. A temperatura foi altíssima e banda e plateia saíram em êxtase, me fazendo concluir que hoje os shows menores são muito mais interessantes e me dão mais prazer do que os grandes.

Por outro lado, há uma questão a se pensar. Por mais que tenham um carinho pela Lapa onde já tocaram em três oportunidades, o Franz Ferdinand já merece um lugar maior. Mais gente precisa ouvir uma banda que melhora a cada dia e a cada show e é um dos poucos grupos verdadeiramente bons que surgiram neste século XXI. Mas aí teríamos o problema daquela aberração já citada. É um verdadeiro dilema.

Formado ainda pelo baixista Bob Hardy e pelo baterista Paul Thomson, os arquiduques do rock aportaram mais uma vez no Brasil para o lançamento do seu mais recente disco, “Tonight: Franz Ferdinand” (2009), o terceiro da banda que tem ainda o “Franz Ferdinand” (2004) e “You could have it so much better” (2005).

O hiato de quatro anos entre o segundo e o terceiro álbum fez a banda aparecer diferente, experimentando o uso de sintetizadores em suas novas canções. Instrumento devidamente tocado por Kapranos e McCarthy quando as executavam no palco a partir de “Bite Hard”, que abriu os trabalhos por volta de 0h11m, coisa de meia hora depois de um sonolento Moptop tentar dar uma esquentada no público.

O resultado é mais do que satisfatório e jamais prejudica a já tradicional incendiária apresentação do quarteto. Inclusive porque algumas canções do novo disco podem se incluídas entre as melhores do Franz Ferdinand como “Turn it on”, “Bite Hard”, “No you girls” e “Lucid Dreams”, que fechou o espetáculo exatas duas horas depois e na sequência de “This Fire” clamada pelo público desde o início do bis.

Foi interessante e ousado do Franz Ferdinand encerrar o show como uma música nova, mas “Lucid Dreams” é tão boa que se pode dizer que foi um risco bem calculado de uma banda que sabe o cacife que tem e está construindo. Acho que a música, que funciona melhor até ao vivo do que no disco, pode, inclusive, ser colocada naquele grupo de clássicos próprios de Kapranos e cia que assim como “Take me out”, “This Fire” e “Do you want to” será sempre cantada e pedida pela plateia. É só uma impressão a ser confirmada no futuro.

No palco, Kapranos é um frontman cada vez melhor e passa a impressão de estar verdadeiramente se divertindo no Rio. Com ele, uma bandeira do Brasil nas costas jamais parece oportunista, sua tentativa de falar português (o que consegue muito bem) não soa como estratégia para parecer simpático. Ele está apenas comandando uma grande festa entre amigos que o recebem com um “Parabéns para você” no meio de “40’” pelo aniversário de 38 anos que estava completando. Comemorar aniversário no Rio, aliás, parece uma especialidade da banda. No show de setembro de 2006, a calorosa recepção foi para Thomson.

Companheiro de loucuras e mosh de Kapranos, McCarthy é aquele guitarrista insano que já conhecemos. Mais uma vez ele subiu numa estrutura lateral do palco. Mas, além disso, ele é excelente no que interessa. Se ficou mais preso dessa vez porque de vez em quando tinha que pilotar os teclados e até cantar, quando pôde se soltar ele foi o músico competente de sempre, sem firulas e fazendo a sua guitarra berrar o necessário.

Paul Thomson completa o trio agitador do grupo com suas baquetas infernais e ganha até um momento, digamos, "Stomp", comandando uma pancadaria geral na bateria ao lado dos colegas de banda no número que fecha a primeira parte do show. Como “reserva moral” do grupo, o baixista Bob Hardy mantém-se mais tranquilo no seu canto deixando que o seu trabalho fale por si.

Os quatro não deixam em nenhum instante do show a peteca cair. O ritmo é sempre frenético e nunca há espaço para aquele momento para ir ao banheiro ou comprar uma cerveja. Quem sai, perde sempre uma boa canção ou uma estripulia no palco, pois a banda faz valer cada centavo do ingresso. E isso apenas com a qualidade de sua música, pois não há telões com projeções fantásticas (apenas algumas imagens psicodélicas) ou elementos cênicos pelo palco. A decoração é simples e com o espaço necessário para o Franz Ferdinand usufruir da maneira que achar necessário.

Definitivamente quem foi a Fundição Progresso não se arrependeu. Viu um grande show que dificilmente deixará de ficar entre os destaques de 2010 e ainda melhor que o de quatro anos atrás no mesmo lugar. Resta saber o que os escoceses vão aprontar para se superarem no próximo espetáculo.

Set list do show a partir dos discos (espero não ter esquecido de nenhuma):

“Franz Ferdinand” – Take me out, The dark of the matineé, This Fire, Michael, 40’, Auf Achse, Tell her tonight, Darts of pleasure, Come on home

“You could have it so much better” – The Fallen, Do you want to, This Boy, Walk Away, Outsiders, Evin and the heathen, You’re the reason, I’m leaving, Well that was easy, I’m your villain

“Tonight: Franz Ferdinand” – Ulysses, No you girl, Lucid Dreams, Bite Hard, Can’t stop feeling, Turn it on, Twilight Omens, What she came for, Dream Again
Alguns momentos marcantes do show na Fundição:
"This Fire"

"Take me out"

"40'"

"Can't stop feeling"

"Auf Achse"
"Do you want to"

"Michael"
"The dark of the matineé"

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