quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Uma nova face de Jesse James

Jesse James era um dos mitos do Velho Oeste americano. Apesar de ser um fora-da-lei com alguns assassinatos nas costas, suas histórias – muitas verdadeiras, outras tantas falsas – ganharam ares de lenda e repercutiram no imaginário popular principalmente em músicas e histórias que faziam e ainda fazem parte do folclore americano. Assassinado covardemente por Robert Ford, como deixou bem claro sua mãe em seu epitáfio - “Murdered by a traitor and coward whose name is not worthy to appear here” -, Jesse acabou se tornando um herói de sua época.

É nas contradições, nas dicotomias entre a lenda e o homem que o diretor Andrew Dominik pauta uma nova visão – a 18a em 86 anos, aliás – da vida de um dos maiores ladrões do Velho Oeste em “O assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford”.

Magistralmente interpretado por Brad Pitt, o filme é um faroeste econômico nas ações, mas intenso no drama da vida de Jesse. Longe do bandido carismático e por isso sedutor interpretado por Colin Farrell no filme “Jovens Justiceiros” (2001), a mais recente obra sobre Jesse, Pitt tenta viver o homem por trás do mito. Entender as razões de seus atos e os motivos que o levaram a ser assassinado aos 34 anos por alguém que inicialmente o admirava, posteriormente o temeu e finalmente viu no ato final a chance de se transformar em celebridade.

Para muitos Jesse é uma espécie de Robin Hood americano. Antes um agricultor, começou a assaltar depois da perda de seu rancho para uma companhia ferroviária que queria desbravar o Oeste através de ferrovias intercontinentais, mesmo que tivesse que passar por cima de fazendeiros da região a qualquer custo. Com isso, Jesse emergiu contra as grandes corporações em defesa dos pequenos agricultores. Apesar da “nobreza” de seus atos, ele era essencialmente um bandido. E isso é fato. Mas seu carisma o transformou numa figura palatável para uns e de total admiração para outros.

A história e a inscrição no túmulo de Jesse James contam que o fora-da-lei foi traído por Ford e atingido pelas costas depois que aquele que ficou conhecido como um covarde começou a negociar com o governador do Missouri, Thomas T. Crittenden, a prisão ou morte de Jesse. O importante era entregá-lo, uma vez que a prisão dos irmãos Frank e Jesse James era uma plataforma de campanha. Para Ford e seu irmão Charles restariam a recompensa de US$ 10 mil e o perdão pela morte de Wood Hite, que era da gangue de Jesse.

De qualquer forma, o tiro certeiro e tão indesejado por cada espectador que acompanha o drama de Jesse no cinema sai pela culatra no campo das idéias e Ford, também brilhantemente vivido por Casey Affleck (muito mais talentoso que seu irmão Ben) acaba entrando para a história como o covarde que atirou pelas costas em um homem indefeso, uma vez que Jesse não usava o seu cinto com as armas como o próprio Ford descreveu em carta ao governador.

Ford termina assassinado por Ed O’Kelley, que no filme é tratado como um fã de Jesse querendo vingar seu ídolo, mas diz a lenda que ele foi convencido por um membro da gangue de Ford de que ficaria famoso matando o assassino de Jesse James. Seja qual for a versão, o fato é que O’Kelley entrou para a história como “o homem que matou o homem que matou Jesse James”.

“O assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford” agrada a todos os fãs de faroeste que não forem xiitas quanto ao gênero, mas também àqueles que curtem um filme humano, focado nos defeitos e nas virtudes, nas minúcias de um homem que parecia uma lenda pelos seus atos e o mundo completamente diferente que vivia, mas que não verdade viveu entre nós logo ali no século XIX.

Suas fraquezas não o diminuem ou o absolvem de seus crimes, mas é inegável sua condição de herói da América tanto no ato de registrar em foto a sua morte, quanto no corpo congelado para permanecer o máximo de tempo possível intacto ou na romaria que se seguiu à sua casa após a notícia que ele havia sido assassinado.

Como Wyatt Earp ou o índio apache Gerônimo, Jesse James e seu bando fazem parte da história dos Estados Unidos. E os americanos são ótimos para criar mitos, lendas e heróis mesmo numa figura que era, no mínimo controversa.

Uma controvérsia tão bem interpretada por Pitt que faz o espectador querer mudar o curso da história e desviar aquela bala que despudoradamente deu cabo do homem para iniciar o mito americano.

Nenhum comentário: