segunda-feira, 7 de setembro de 2009

O caos reina

O dinamarquês Lars Von Trier é daqueles diretores que ficam naquela categoria do ou você ama ou você odeia. Ou você embarca nos seus delírios e tenta compreender o que sai daquela cabeça ou você fica completamente disperso e cai em gargalhada quando vê uma raposa falando em um dos seus filmes. Uma coisa, no entanto, é certa, tudo o que se vê ali tem alguma lógica. Pode acreditar em mim.

Quem já tinha visto ótimos trabalhos como “Dogville” (2003) e “Manderley” (2005) está acostumado com o seu estilo de filmar em capítulos, como se a película fosse um livro. Em “Anticristo”, porém, ele deixa de refletir sobre a história americana – cuja trilogia ainda será completada por “Washington”, ainda em fase de pré-produção – e embarca numa jornada niilista de dor, culpa, desespero e caos feita para chocar e incomodar o espectador.

Dividido em quatro capítulos – Luto, Dor, Desespero e Os Três Mendigos, com ainda um prólogo e um epílogo – “Anticristo” conta a história de um casal sem nome, identificado apenas como Ele (Willen Defoe) e Ela (Charlotte Gainsbourg) que vivem um grande trauma. Enquanto transavam por horas no banheiro e no quarto, numa cena de sexo explícito belamente filmada em preto e branco e ao som de uma ária de Händel, seu filho pequeno acorda, sai do berço e se entrega à morte pulando da janela da casa.

A morte do filho faz Ela cair numa profunda depressão, sentir-se culpada, pois sabia que a criança às vezes acordava de noite. Ela mergulha num luto caótico que será tratado por Ele, psicólogo. Para isso, o casal precisa mergulhar nas lembranças do último verão, os últimos momentos vividos juntos em Éden, sugestivo nome para a casa de veraneio do casal.

Foram férias num lugar isolado porque Ela precisava de um tempo sozinha ou com seu filho para concluir sua tese que envolvia temas como o femicídio na Idade Média. Completamente consumida pela culpa e tomada pelos próprios escritos, Ela cria um cenário de absoluto horror. Se inicialmente usava o sexo como uma forma para externar sua dor ou tentar corrigir o passado, como se tentasse voltar ao ponto de partida daquela tragédia, agora é a violência que a move. Contra o marido e a si própria.

É preciso descontar em algo, compensar a dor de alguma forma, pagar uma pena. E Ela se vê consumida por um sentimento de autoflagelação e de destruição trazendo ao filme as cenas fortes que causaram tanta polêmica e críticas no festival de Cannes deste ano. Certamente não são imagens para estômagos sensíveis.

De difícil classificação - Drama? Horror? Prefiro apenas um filme de Von Trier - “Anticristo” é um trabalho de entrega total de Defoe e Gainsbourg aos seus papéis. Únicos atores em cena, eles se digladiam enquanto o filme vai trazendo explicações e complicações, respostas e mais perguntas, questionamentos e julgamentos. No fim, é difícil saber onde está o real e o além do real. E o quanto Éden mudou aquela família. Ou será que Ela mergulhou demais em sua tese, a ponto de não conseguir mais voltar à tona a partir de um imprevisível gatilho? Aos cinemas para tentar buscar as respostas.

Para manter o clima “Anticristo”, uma trilha sonora apropriada. Marilyn Manson, nosso Antichrist Superstar, cantando “Sweet Dreams” e “Beautiful People”.



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