domingo, 17 de maio de 2009

Um leigo na USS Enterprise

Nunca fui um trekkie. As imagens do capitão Kirk e de Spock são vagas na minha mente. Personagens de um outro filme de ficção científica que eu não acompanhava. Preferia Star Wars. Por isso fui ao cinema para ver “Star Trek” sem qualquer imagem do passado e como um leigo que nada entende o que está se passando e vê tudo como novidade.

E nada melhor para alguém com este “perfil” do que acompanhar um, para roubar uma expressão que li outro dia numa crítica da Isabela Boscov, da Veja, “filme de origem”. É o que J.J. Abrams, esse midas do cinema (e da TV) atual resolveu fazer ao aceitar o desafio de dirigir o 12º filme de uma das séries mais cultuadas da história da TV e do cinema americanos.

Não sei o que pensam os fãs da série, principalmente diante da destruição de Vulcano, quase um ato iconoclástico pelo que percebi, mas para os leigos “Star Trek” é um ótimo filme. Nele acompanhamos como Kirk (William Shatner na série original e hoje vivido por Chris Pine) e Spock (Leonard Nimoy na série original, que faz uma participação para lá de especial neste filme, e hoje vivido por Zachary Quinto) se tornaram os personagens cultuados que são.

Vemos um jovem Kirk lidando com sua hiperatividade, sendo um gênio passional que se mete em encrencas por causa de mulheres e mostra extrema autoconfiança. Acompanhamos o frio e matemático Spock tendo problemas na escola e resolvendo da pior maneira por sofrer preconceito por ser filho de pai vulcano e mãe terráquea. E mostrando exatamente o conflito entre esses dois mundos na sua mente. Acompanhamos a formação da personalidade deles enquanto entram, por diferentes meios, bem apropriados a cada um, naquela que se tornaria a lendária USS Enterprise para “viajarem onde nenhum homem jamais esteve”.

Enquanto tudo isso acontece, se desenrola uma trama básica de um vilão, Nero, vivido por Eric Bana, querendo destruir os dois mundos que ele considera os responsáveis pela destruição de Romulan 120 anos a frente do tempo em que “Star Trek” se passa.

Sim, Abrams e seus ótimos roteiristas, Roberto Orci e Alex Kurtzman, usaram dois ou três truques de “Lost” neste filme. Um deles foi o da viagem no tempo numa trama que é bem mais fácil de entender do que a da série de TV e na qual não me aprofundo para não estragar a graça do filme. O outro é o confronto entre dois personagens de forte personalidade e visões diametralmente opostas. O Kirk e Spock de Abrams são até certo ponto como Locke e Jack na série de TV.

Mais do que um blockbuster com ótimos efeitos especiais – e que em alguns momentos respeita até o fato de no espaço o som não se propagar –, “Star Trek” é um filme absolutamente humano. A beleza de tudo o que é criado pela computação gráfica não é personagem principal no filme, mas um excelente coadjuvante que auxilia e não rouba a cena.

O fundamental em “Star Trek” é o conflito entre os personagens, a busca de Kirk em ganhar a confiança de uma tripulação enquanto Spock tenta “dominar seus demônios interiores”. É a valorização da amizade, da união, a importância do amor, a busca por vingança. Enfim, são os sentimentos humanos, demasiadamente humanos. Tudo isso valorizado por um roteiro simples com diálogos inspirados e situações bem humoradas. “Star Trek” é um filme que vai do drama à comédia numa roupagem de aventura de ficção científica.

É também uma película infinitamente mais bem sucedida do que a estréia de Abrams como diretor de longas metragens. Vamos combinar que “Missão Impossível III” (2006) é uma decepção e inferior aos dois primeiros. Mas tudo o que o criador de “Lost” erra neste filme, acerta com louvor em “Star Trek”.

Taí. Agora virei fã. Onde será que eu encontro os filmes e as séries antigas para recuperar o tempo perdido?

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