domingo, 24 de maio de 2009

Traídos pelo amor

“Desejo e Perigo” tem parentesco direto com “A Espiã” (2006) e a intensidade claustrofóbica de um “A vida dos outros” (2006). Novo trabalho do diretor taiwanês Ang Lee, de “O Segredo de Brockeback Mountain” (2005) e “Hulk” (2003), seu filme se assemelha ao longa de Paul Verhoeven no enredo de uma agente infiltrada que tenta seduzir o algoz de uma campanha militar e acaba por ele também se envolvendo. Do trabalho de Florian Henckel von Donnersmarck, Ang Lee guarda a tensão com que constrói suas cenas, sempre deixando no ar que seus personagens sabem mais do que dizem e veem dos dois lados.

E esse clima de suspense Lee cria com precisão hollywoodiana, com direito a trilha sonora impactante/intermitente que eleva em dois tons a respiração do telespectador.

Filme que ficou mais conhecido durante a sua polêmica exibição no festival de Veneza de 2007 por suas ardentes cenas de sexo, “Desejo e Perigo” conta a história da jovem Wong Chia Chi (Wei Tang), recrutada na escola pelo idealista Kuang Yu Min (Lee-Ho Wang) com um único objetivo: seduzir o senhor Yee (Tony Leung Chiu Wai) e levá-lo para o covil do leão onde o que deveria ser uma noite de luxuriosa dedicação ao adultério se transformaria numa sangrenta e patriótica morte.

Estamos na China em meio a Segunda Guerra Mundial e um colaboracionista da opressão japonesa, que reduz o povo chinês em geral a vermes que esmolam comida, vivem em condições subumanas e são obrigados a renegar sua cultura e aprender a língua dominante, é visto como um inimigo traidor.

Insatisfeitos, tomados pela fúria juvenil, Kuang e seus companheiros planejam uma vingança. Um ato terrorista-patriótico em nome e pela libertação da China. O plano grandioso, ousado e arriscado diante da implacável máquina de vigilância do Estado só não contava com o imponderável. O poder de um filete mínimo de amor e sexo sob um corpo e uma alma ávidos e naturalmente carentes.

A vida de Wei Tang é desde muito cedo dedicada a esta vingança que nunca foi dela, pois seus único desejo era fazer teatro. Por que ela terá entrado nesse plano? A troco de quê? Um plano pelo qual ela deu inclusive a própria virgindade, perdida com um qualquer mais experiente porque já fizera um pouco de tudo com prostitutas.

A resposta está em Kuang, jovem pelo qual ela sentiu uma atração imediata, por sua paixão e idealismo, mas que não foi homem suficiente quando deveria ter sido.

“Você deveria ter feito isso há três anos”, sentenciou ela, seca e asperamente implacável quando finalmente beijada por ele.

Agora já era tarde. Wei Tang, sob o disfarce da pequena burguesa Mak Tai Tai, estava completamente inebriada pelo amor de Yee, pela selvageria com que era tratada na cama, sempre explorando cada vez mais, indo até o limite ou além do limite que eles achavam que tinham chegado. O sabor é de uma maçã proibida no paraíso. A sensação é de uma cobra que rasteja pela corrente sanguínea para inocular o seu veneno no coração do alvo estrangulando-a de paixão, levando-a a aniquilação.

Céu e inferno estão juntos agora. Dão-se o diabólico abraço que engalfinha mais do que a vida de Wei Tang ou a honra de Yee, mas também condena a hesitação dos conspiradores. Num momento de decisão não se pode falhar. Seja na hora do ato político ou do beijo que pode transformar o amanhã em tragédia. No fundo, desejo e perigo caminham juntos em uma ponte velha sob o abismo.

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