quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Fantasmas da Espanha

O cineasta tcheco Milos Forman gosta de retratar tipos polêmicos ou controversos. Sua filmografia contém três cinebiografias de personalidades que causaram algum incômodo na história da humanidade, claro que guardadas as devidas proporções. É o caso do comediante Andy Kaufmann (Jim Carrey) no filme “Man on the Moon” (1999) e do músico Wolfgang Amadeus Mozart em “Amadeus” (1984), que faturou oito Oscars. Além de Larry Flynt, criador da revista masculina Hustler, cuja vida foi retratada em “O povo contra Larry Flynt” (1996).

Filmar a vida de personagens reais parece ser uma temática que atrai o diretor. Em “Sombras de Goya” ele volta a utilizar um personagem histórico, no caso o pintor espanhol Francisco de Goya, vivido pelo ator sueco Stellan Skarsgard. Mas ao contrário das obras citadas, o filme não é sobre o pintor.

Goya aparece como pano de fundo de importantes mudanças históricas entre o final do século XVIII e início do XIX. Ele é um gênio que usa o seu pincel para testemunhar mudanças dramáticas na Espanha, sempre uma vítima da Igreja, dos franceses pós-revolução de 1789 e finalmente dos ingleses, com suas pinturas críticas ao mesmo tempo em que bajulava a corte fazendo quadros em sua homenagem por encomenda.

E em meio a esse turbilhão de acontecimentos, o diretor, que também escreveu o roteiro ao lado de Jean-Claude Carrière, cria uma história de obsessão do pintor por sua retratada Inés (Natalie Portman, uma atriz madura e perfeita para o papel), uma paixão de graves conseqüências também para o padre Lorenzo (o onipresente Javier Bardem nestes últimos meses nas salas de cinema do Brasil).

Capturada pela Inquisição apenas por não gostar de carne de porco – para a Igreja Católica um ato de judeus – Inés sofre com a tortura do que os padres chamavam de “interrogatório” (qualquer semelhança com o extremismo religioso de Bush pode não ser mera coincidência), é afastada de sua família e acaba violentada por Lorenzo, com quem terá uma filha. As conseqüências de diversas rupturas internas e da sociedade serão, porém, trágicas para Inés, que jamais irá se recuperar da tortura física e psíquica causada pela Igreja.

E nesta história, Goya não passa de um personagem inserido numa obra de ficção. Não se sabe se realmente ele teve uma modelo por quem se apaixonou. O pintor é mais um espectador privilegiado que registra todos os momentos conturbados pelos quais a Espanha está passando.

Apesar do filme de Milos Forman levar o seu nome, Goya na obra é um coadjuvante num enredo muito mais focado em Inés e Lorenzo. O filme conta menos sobre o pintor e critica mais os métodos e a tortura da Igreja. Uma polêmica, no entanto, que não provocou muito reboliço.

Desta vez não espere mais uma cinebiografia assinada por Forman. Mas nem por isso, “Sombras de Goya” deixa de ser uma bela película calcada no talento de seus três atores principais.

2 comentários:

Anônimo disse...

vc diz uma coisa. o veríssimo, outra... vcs, por favor, combinem para criticar um filme. mas, por via das dúvidas, vou ao cinema tirar a minha conclusão. abs

Anônimo disse...

Confie no Veríssimo. Ele é muito mais sábio do que eu. Tem mais experiência, cultura, leitura... Mas numa coisa nós nos acertamos. No fato de Goya ser um mero coadjuvante no filme. Eu apenas respeitei a opção do Milos Forman. Até porque, acho que não era a intenção do diretor fazer uma biografia do pintor.
De qualquer forma, é ainda mais sábia a sua postura de assistir, tirar suas conclusões e entrar no debate.