quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Do limite da obra

Envolto numa vida excessivamente pacata e morna com sua esposa, o cineasta François (Frédéric van den Driessche) é instigado por uma atriz a tentar entender os segredos do prazer feminino. Observar suas nuances e o que faz a mulher atingir o orgasmo é o seu projeto mais ousado e que o levará a expandir os limites da própria obra.

Após diversas recusas, François encontra três jovens e iniciantes atrizes dispostas a fazer o filme e se abrir para as suas experiências sensoriais. Charlotte (Maroussia Dubreuil), Julie (Lise Bellynck) e Stéphanie (Marie Allan) aceitam se entregar ao projeto confiando na famosa delicadeza de François para entender o ponto de vista de seus atores.

As três se masturbam para ele, transam entre si e compartilham seus mais íntimos segredos e seus mais obscuros sentimentos em busca do papel desejado. Estariam sendo elas manipuladas pelo diretor ou ao contrário? A pseudopureza da alma de François o impede de ver que a cada teste que fazia, ele era também manipulado por suas cobaias.

Aos poucos, porém, François vai construindo seu filme expandindo cada vez mais a fronteira de sua obra até um perigoso limite que pode lhe ser fatal. Até onde ele irá? Até onde lhe permitirão ir nessa transgressão sexual? Respostas no cinema.

“Anjos Exterminadores” é uma obra densa por abordar o espinhoso tema do prazer feminino e corajosa ao utilizar cenas de sexo tão verdadeiras, bem filmadas e de certa forma delicadas que, por vezes, parecem ter realmente acontecido. Maroussia, Lise e Marie parecem ter realmente sentido o prazer que na tela dizem viver através de suas personagens. O ponto, todavia, está muito distante do G orgasmático. O objetivo é abrir e refletir sobre essa caixa de pandora que é a psique da mulher. Esta me parece ser a motivação do diretor e roteirista Jean-Claude Brisseau.

Seu filme guarda muitas semelhanças com o excelente espanhol “Lúcia e o Sexo” (2001), de Julio Medem, na medida em que usa a metalinguagem cinematográfica usando o recurso de uma obra dentro de outra. Não é François que deseja fazer um filme sobre o prazer feminino, mas Brisseau que tem o desafio de realizar uma obra sobre um tema que ao mesmo tempo é tabu e transgressor.

São apenas algumas das vertentes de “Anjos Exterminadores”, que explora as profundezas da alma feminina sem encontrar qualquer conclusão sobre o desejado. Esta é a motivação de qualquer obra aberta, aliás. Não é à toa que François diz que o filme foi um “sucesso inesperado”. Contudo, ele não afirma que atingiu o objetivo que buscava.

Ao procurar sempre um passo a frente e ainda não desvelado, François pagará caro. Não o quanto estava escrito no seu destino, uma vez que é salvo pelo anjo do título que deveria exterminá-lo, mas um alto, destrutivo e irreversível preço. Trocou a vida que tinha por uma obra-prima incompleta. Um preço a ser ponderado.

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