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Julieta revê o passado |
O que Woody Allen e Pedro Almodóvar
têm em comum? Toda vez que um filme novo de ambos estreia, alguém vem e fala: um filme mediano dos dois é melhor do que muita coisa que anda
sendo produzida por aí. Esta é uma avaliação PREGUIÇOSA e reveladora de uma
lógica de "dois pesos e duas medidas" absolutamente paternalista. A
Corneta jamais age assim. A lógica da Corneta é: cada obra, uma sentença.
Afinal, tanto Almodóvar quanto Allen
são humanos. Fizeram filmes excelentes e bombas. Bombas terríveis. O diretor
americano, por exemplo, não nos apresenta um filme daqueles para aplaudir desde
"Meia-noite em Paris" (2011). Ok, eu gosto de "Para Roma com
amor" (2012), mas reconheço que é uma película controversa. Esperamos que
"Café Society" seja melhor que "Blue Jasmine" (2013), o
esquecível "Magia ao luar" (2014) e "O homem irracional"
(2015), que nem é de todo ruim.
Almodóvar, por sua vez, tem uma
trajetória recente semelhante. "A pele que habito" é brilhante na mesma
proporção que "Os amantes passageiros" (2013) é decepcionante.
"Julieta", seu novo trabalho, se encontra no meio do caminho entre
estes filmes do diretor de 66 anos. Para ficar na comparação,
"Julieta" é "O homem irracional" de Almodóvar.
O filme mantém as características
conhecidas de Almodóvar. O uso de cores vibrantes, principalmente o vermelho,
uma trama folhetinesca, aquela trilha sonora pontuando como se fosse novela das 21h e o
bom trabalho de atrizes. Almodóvar é um excelente diretor de atrizes. Parece
sempre tirar o melhor delas. Não é diferente com Adriana Ugarte e Emma Suárez,
que vivem a personagem principal na juventude e na maturidade,
respectivamente.
Mas o resultado de
"Julieta" ficou aquém dos melhores roteiros do diretor espanhol.
Isso porque o filme me passou a impressão de que não era levado para lugar
nenhum. De que faltou algo, um pedaço. Tem certeza que acaba aí? A sensação que eu tenho é que Almodóvar parou a edição do filme para desanuviar um pouco a cabeça jogando "Pokémon Go" e esqueceu de completar o filme. Quando percebeu, já tinha salvo o arquivo e enviado por e-mail para todo mundo.
Tudo começou há um tempo atrás na
ilha.... Não pera. Tudo começa quando Julieta está se preparando para viajar
com o namorado Lorenzo (Dário Grandinetti) para uma temporada em Portugal onde
eles iriam desfrutar da combinação bacalhau, vinho, sexo e literatura. Não
necessariamente nesta ordem. Mas um encontro com Beatriz (Michelle Jenner),
personagem que com o passar da trama vamos entender quem é, a deixa abalada
emocionalmente. Beatriz havia encontrado sua filha, Antía, no lago Como na
aprazível Itália.
Aquele encontro trouxe um fiapo de
esperança para Julieta, que não vê a filha desde que ela desapareceu quando fez
18 anos e se emancipou. Doze anos se passaram numa agonia ininterrupta e é essa busca
angustiante por respostas que passamos a acompanhar quando Julieta desiste da
viagem e resolve permanecer em Madri.
Ao longo do filme, Almodóvar vai nos
dando pistas sobre o paradeiro de Antía enquanto conta a história do passado de
Julieta e da própria filha. As origens, os erros que elas cometeram, as escolhas. Enfim,
Julieta é humana, demasiado humana como qualquer um que você conhece.
Por vezes, o diretor tira o foco.
Apresenta uma mulher misteriosa, Marian (Rossy de Palma), que parece não se dar
bem com Julieta e nos leva a questionar o que teria acontecido com Antía e se ela teria alguma participação. Será
que houve uma briga séria? Ela enlouqueceu? Entrou para uma seita religiosa?
Está tramando uma vingança contra a mãe por culpa-lá pela morte do amado pai,
Xoan (Daniel Grao)? Fugiu para participar de um Big Brother?
O diretor te prende na
cadeira, te faz acompanhar tudo roendo as unhas em busca de uma resposta que
aparentemente será tão impactante quanto "A pele que habito", pois
ele vai te ESTIMULANDO a imaginar uma série de possibilidades.
Mas quando a busca chega ao fim, o
sentimento que fica é de vazio e frustração. O famoso fuén. O desfecho tem o sabor de uma
comida de bandejão e o que fica é a pergunta: Mas era só isso? Sofremos por
nada. Ou por quase nada.
Há méritos em "Julieta". O
filme é muito bonito. Almodóvar faz filmes bonitos da escolha das locações, passando pelos cenários e chegando aos atores. Ele tem muita estima pela beleza. A valoriza como um filósofo grego da Atenas de tempos imemoriais. O roteiro até certo ponto vai sendo bem construído e os
atores estão bem. Mas é frustrante Almodóvar criar tanto clima de suspense e
nos dar um banho de água fria. Como eu disse, pareceu um filme inacabado. Pareceu que faltou
um pedaço. Só pode ser culpa do Pokémon.
Talvez o seu objetivo fosse
apenas esse. Fazer um ensaio sobre culpa, escolhas, uma relação complicada
entre mãe e filha. As idas e vindas, os deja vu da existência. Para a Corneta, porém,
o resultado não foi plenamente satisfatório. Almodóvar, você pode fazer mais do que esse filme mediano. Por isso, "Julieta"
ganhará uma nota 6,5.
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