terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Um lobo feroz no Circo

- Vou ao show do Lobão.

A cada vez que eu proferia essa frase para boa parte dos meus amigos, recebia em troca olhares estranhos, caras torcidas e provocações por eu ter gasto um naco do meu salário comprando um ingresso para a apresentação do velho lobo no Circo Voador.

Sim, Lobão pode não ser um grande cantor e desafinar de vez em quando. Sim, ele também pode não ser o guitarrista mais virtuoso que faça solos espetaculares e ganhe a sua plateia como uma técnica apurada. E é isso que levaram muitos a torcer a cara para mim.

Mas Lobão tem um diferencial que existe em pouquíssimos artistas brasileiros. Ele tem alma. Ele é dionisíaco. Ele domina as atenções assim que entra no palco com as suas letras, verdadeiras crônicas com melodias que contam parte da história do Rio de Janeiro e de São Paulo, onde o cantor agora vive, vista pelos seus olhos, além da própria música brasileira a partir dos anos 80. Tá, dos anos 70. Vamos respeitar, já que ele uma vez me disse que era um artista dos anos 70.

Lobão é um showman, um astro do rock brasileiro que tem atitude. E não falo do período em que ele brigou com gravadoras e botou com garra a sua música na rua para vender seus três ótimos discos “A vida é doce” (1999), “2001, uma odisséia no universo paralelo” (2001) e “Canções dentro da noite escura” (2005) em jornaleiros. Falo daquele cara que chega no palco e dá um show, se entrega à música e despeja o seu melhor barulho, a sua melhor interpretação e leva a plateia ao delírio.

Poucos shows de bandas ou artistas brasileiros são tão bons quanto os do Lobão (acho que perdi alguns amigos com essa frase). E a comparação fica ainda mais favorável para ele quando a gente olha para o lado e vê coisas como Restart e NX Zero. Ou a escalação nacional do Rock in Rio, em geral de chorar. Muito do que vemos nunca chegará sequer ao que o velho lobo fez de mais ou menos na vida.

E não são apenas as suas letras por vezes sacanas, outras criativas e até as românticas que são o diferencial dele no palco. Lobão é também um bem humorado artista que faz piadas, pede um baseado (e fuma um antes de jogar para a galera), faz versões “universitárias-brejeiras” de “Help”, dos Beatles, e imita de forma muito engraçada o velho amigo Cazuza, morto em 1990, para interpretar “Vida louca vida”. E continua sendo provocador ao mudar o refrão de “Rádio Bla”, que encerrou os trabalhos do seu espetáculo, com um “eu ligo o rádio/e jabá/jabá, jabá, eu te amo”.

É tudo isso que a gente vê no Circo Voador, onde o cantor esteve na sexta-feira passada para tocar após quase um mês de adiamento devido a compromissos com a sua biografia “50 anos a mil”.

A espera valeu a pena. Durante duas horas, Lobão tocou umas 20 músicas, desde a mais recente, a boa “Das tripas coração”, que abre a sua biografia, até clássicos inesquecíveis como “Vida Bandida”, “Corações Psicodélicos”, “Ronaldo foi pra guerra”, “Bambina”, “Me Chama”, “Canos Silenciosos” e aquele petardo fantástico que é “A vida é doce”.

É como disse um outro amigo meu no Facebook, este fã do cantor: “Lobão é foda. O resto, meus amigos, usa calça amarelo ovo”. Eu não poderia descrever melhor.

Abaixo, alguns bons momentos do show que consegui encontrar no YouTube.

"Corações Psicodélicos"

"Canos Silenciosos"

"Me Chama"

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