domingo, 4 de outubro de 2009

Por que não tenho motivos para sorrir?


Entre as diversas pessoas com quem já conversei que pensam de alguma forma o que se pode fazer para o esporte, há dois posicionamentos em relação à Olimpíada. Uns acham que ela é um instrumento que alavanca negócios, empregos, etc... que tem o poder de revitalizar uma cidade. E citam o exemplo de Barcelona, que é realmente espetacular, mas que não conheci na sua fase degradada.

Outro grupo no qual eu me incluo pensa numa relação diametralmente oposta. É preciso primeiro tornar a cidade capaz e funcionando para os seus cidadãos para aí sim poder pleitear a realização dos Jogos. Isso inclui serviços básicos e mínimos de transporte, saúde, educação e segurança. Além de uma política esportiva séria. Coisa, aliás, que o Brasil não tem, pois vive de fenômenos que surgem aqui e ali. Londres, por exemplo, está apta a receber as Olimpíadas, o que fará em 2012, assim como Madri, injustamente rejeitada pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) para 2016.

É por conta destes argumentos que sempre fui contra o Rio sediar uma Olimpíada e sou contra o Brasil sediar uma Copa do Mundo. Falando apenas da cidade em que conheço e da Olimpíada mais especificamente, o Rio tem uma infraestrutura precária de transporte e não é uma cidade segura. As escolas têm ensino sofrível e quem não tem plano de saúde tem que ter muita fé em Deus e rezar antes de seguir para um hospital. Embora para alguns não pareça, é com tristeza que escrevo isso. Mas é tudo o que leio nos jornais ou vejo com meus próprios olhos.

Mas com a escolha pró-Rio de Janeiro já feita – para a alegria da indústria do oba-oba – estes são argumentos que precisam ser neste momento deixados de lado para analisarmos sobre o que esperar daqui para frente.

Infelizmente eu não espero muita coisa. Primeiro porque quem está a frente do projeto olímpico é o presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), Carlos Arthur Nuzman. A euforia cívico-olímpica lamentavelmente fez muita gente esquecer que Nuzman é o mesmo dirigente que está há 14 anos no poder e que exatamente há um ano convocou uma eleição as pressas, sem aviso prévio e sem oposição, na calada da noite e nos porões de um hotel no Rio para ser reeleito por mais quatro anos. Homenageado por seus colegas que comandam outras Confederações – menos os que não o apóiam e, por isso, reclamam com a falta de verbas – foi reeleito por aclamação para ficar no cargo até 2012. Ou melhor, pelo menos até 2012.

O mesmo Nuzman que já declarou também no ano passado em entrevista à ESPN Brasil ser “contra a limitação de mandato” e que sua gestão no vôlei só deu certo porque ele praticamente não tinha oposição, por isso deixou a CBV como campeão olímpico, é quem vai comandar o desde já poderoso Comitê Rio-2016. O órgão terá logo de saída à disposição um fundo de R$ 1,2 bilhão para uma série de ações iniciais, entre elas uma campanha interna sobre os Jogos e o lançamento de um site sobre o Rio-2016. Nuzman também foi presidente do Comitê do Pan-Americano de 2007, competição de cujos problemas falarei mais adiante.

Em sua dinastia, pouco se sabe o que Nuzman fez pelo esporte brasileiro. Ainda que ele não seja plenamente responsável, pois isso é responsabilidade dos governos federal, estadual e municipal também, não se notou muito incentivo ao esporte de base ou ao esporte olímpico nos últimos anos.

O resultado final de sua administração até aqui? Uma atuação pífia do esporte olímpico brasileiro. De Atlanta-96 até Pequim-2008, o desempenho do Brasil sempre foi pífio para o tamanho do país. Em Atlanta foram 15 medalhas, sendo três de ouro e a modesta 25ª posição. Mas ele tinha apenas um ano de mandato. Não pode ser cobrado por isso. Veio Sidney e não se ouviu o hino nacional. Foram conquistadas 12 medalhas e o Brasil ficou na 52ª posição. Veio Atenas e o número de medalhas caiu para 10, mas como o Brasil conquistou cinco ouros ficou na 16ª posição. Em Pequim, o Brasil voltou a conquistar apenas três ouros entre 15 medalhas e ficou na 23ª posição.

Nas duas últimas Olimpíadas o discurso do COB veio através da manipulação dos números. Em Atenas se disse que foi o melhor desempenho da história porque foram conquistados cinco ouros. Quatro anos depois, o discurso era de que foi igualado o melhor desempenho da história porque foram conquistadas 15 medalhas como em Atlanta. Falta critério, mas o discurso é malabarístico.

Para o tamanho do país e para o potencial esportivo que ele tem, no entanto, é inaceitável um número inferior a algo entre 30 e 40 medalhas numa Olimpíada, e uma colocação entre os 10 primeiros países do mundo. É o mínimo que se exige para um país de dimensões continentais. Não é necessário chegar aos “co-irmãos” de características semelhantes como Estados Unidos (110 medalhas sendo 36 de ouro em Pequim), China (100 medalhas e 52 de ouro) e Rússia (72 medalhas sendo 23 de ouro). Mas é impressionante ficar atrás de Jamaica, Quênia, Etiópia ou Bielorrússia, países que não tem a importância e o volume de dinheiro para investimento em esporte do país.

O retrato do esporte olímpico brasileiro foi visto neste ano. Recentemente o Brasil disputou três mundiais (atletismo, judô e natação) e voltou para casa com apenas duas medalhas do novo fenômeno nacional, o nadador César Cielo, que, por acaso, treina nos Estados Unidos e cujos pais reclamaram na última Olimpíada da falta de apoio da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA).

Assim como todo o Brasil, a natação brasileira, cuja Confederação é presidida por Coaracy Nunes Filho desde 1988, tem sempre um desempenho abaixo do que deveria se esperar. Coaracy, aliás, não é o único presidente de Confederação a se eternizar no poder. Ricardo Teixeira comanda a CBF desde 1989 e já está garantido até 2014, ano da Copa do Mundo. Gerasime Bosikis ficou 12 anos no poder da Confederação Brasaileira de Basquete (CBB) entre 1997 e 2009, período em que não viu o basquete masculino disputar uma Olimpíada, até ceder lugar a Carlos Nunes, que prometeu manter a alternância de poder quando foi eleito.

No Atletismo, Roberto Gesta de Melo está há 22 anos no poder. Além dos resultados ruins do seu esporte, considerado o mais nobre da Olimpíada, agora ele convive com uma série de escândalos de doping nas mais diferentes modalidades. O pior deles envolveu o técnico Jayme Netto, um dos principais do país, que confessou ter ministrado doses de eritropoietina a seus atletas, todos suspensos antes do Mundial de Atletismo de Berlim.

Sem renovação, sem novas ideias e com administrações visivelmente ruins, como pode o esporte brasileiro dar certo? Mas eu ainda não falei do Pan-2007, do qual trato no próximo post.

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