segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Um álbum já clássico do Iron Maiden

Há 35 anos na estrada, o Iron Maiden já mudou duas vezes de vocalista, ganhou e perdeu membros, mas sempre foi uma indústria muito bem controlada pelo seu baixista, Steve Harris, fundador do grupo lá pelos idos de 1975 junto com os guitarristas Dave Murray e Dennis Stratton, o vocalista Paul Di’Anno e o baterista Clive Burr. Deste quinteto, apenas Harris, que assina boa parte das músicas da donzela de ferro, e Murray permaneceram no Iron que no terceiro disco, “The number of the beast”, de 1982, ganhou o vocalista que mudaria a história da banda.

Substituto de Di’Anno, que afundava em drogas e não se recusava a sair do seu processo de autodestruição, o baixinho Bruce Dickinson assumiu com personalidade a função e foi a voz do Iron nos seus discos mais bem sucedidos. De “The number of the beast” passando por outros álbuns clássicos como “Piece of mind” (1983), “Powerslave” (1984), “Seventh Son of a Seventh Son” (1988) a “Fear of the dark” (1992), da canção-símbolo do Iron.

Um ano depois do lançamento de “Fear of the dark”, Bruce abandonou a banda para cuidar de sua carreira solo e deixou um Iron apático com um vocalista – Blaze Bayley – muito fraco e dois discos que não deixaram saudade, “The X-Factor” (1995) e “Virtual XI” (1998). Seis anos depois, Bruce e o guitarrista Adrian Smith retornaram à banda que desde então mantém a atual formação com três guitarristas – além de Smith e Murray, Janick Gears – mais Harris e o baterista Nico McBrain.

A volta de Bruce não poderia ter sido melhor. Eles fizeram um discaço, “Brave New World” (2000), cuja turnê passou pelo Brasil para um antológico show no Rock in Rio. Na seqüência, outro ótimo disco, “Dance of death” (2003), e nova passagem no Rio para um grande show no então Claro Hall, hoje Citibank Hall (pelo menos até o fechamento desse texto). Há quatro anos, “A matter of life and death” quebrou o encanto. Um disco bem meia-boca e que nem ganhou muito destaque, logo depois atropelado pela turnê retrô da banda “Somewhere back in time”, que mais uma vez visitou o Brasil para um show na Apoteose.

Mas agora Bruce, Harris e os demais membros do sexteto de Leyton, ao leste de Londres, podem se orgulhar e sair pelo mundo em mais uma turnê tocando um disco inteiro se quiserem. Lançado no mês passado, “The Final Frontier” é o melhor disco do retorno de Bruce à banda e rivaliza com as melhores obras que a banda já produziu. É de levar os fãs a se regozijarem e fazerem sacrifícios em nome dos deuses do metal em celebração pela obra-prima que receberam. “The Final Frontier” é a saída para um dia de trabalho estressante e para um bombardeio de tanto lixo que recebemos hoje em dia nos ouvidos. Não precisamos citar nomes, né...

Mais longo trabalho do Iron (são 76 minutos do mais puro metal), o 15º álbum de estúdio da donzela de ferro é bem diferente dos recentes discos da banda. Não tem canções fáceis e de refrões que fixam na cabeça como o que encontramos em “Brave New World” ou mesmo em “Fear of the dark” e “The Number of the beast”. Os “ôoos” e “lálalalas” de “Brave...” também ficaram definitivamente para trás num processo que já se iniciara no álbum seguinte e fora concluído em “A matter of life and death”.

O Iron claramente optou por sair de sua zona de conforto criando letras (todas contendo a assinatura de Harris) mais complexas e difíceis de acompanhar e canções mais longas (apenas uma tem menos de cinco minutos. Uma tem 11 minutos e outras duas têm nove minutos). Tudo isso mantendo os conhecidos e longos solos de guitarra da banda.

O risco corrido por uma banda que não precisaria se arriscar mais por ter um grupo de fãs fiéis e que consumiria qualquer coisa vindo dela foi louvado pela imprensa internacional e ganhou também retorno comercial. O álbum estreou em primeiro lugar nas vendas em 21 países, incluindo o Reino Unido e o Canadá. Duas semanas depois, estava em primeiro em 28 países. Números que o Iron não colhia desde “Fear of the dark”.

Entre as críticas positivas, a revista “The Quietus” disse que “The Final Frontier” leva tempo, exige esforço, mas é esmagadoramente brilhante. Eles (o Iron) não optaram apenas pela opção mais fácil, que teria sido chato para nós, e, mais importante, que você sente que seria chato para eles também”. A “Metal Hammer” disse que “somos inacreditavelmente sortudos por eles ainda estarem por aí. Longa vida ao reino do Maiden”. A “Mojo” afirmou que era um dos álbuns mais ambiciosos do Iron enquanto a “One Metal” chamou o disco de uma “odisséia prog rock que confirma que o Iron Maiden é a melhor das grandes bandas em atividade hoje”.

A “MusicRadar” disse que o Iron “criou uma obra cheia de emoção, hipnótico, com uma estrutura não-convencional e visão estonteante”. E encerrou afirmando que o “grupo tem conseguido ir além dos seus sonhos”. Já a “BBC” elogiou o disco como “uma realização notável”.

Não é fácil sucesso de público e crítica e o Iron conseguiu com um disco que, como disse, é um dos mais bem trabalhados pela banda e um disco em que todos participaram ativamente do processo criativo mais do que em outros trabalhos como disse Smith em entrevistas um mês antes do lançamento do álbum.

Musicalmente, “The Final Frontier” tem um quê de metal progressivo como disse a "One Metal", mas a assinatura do Iron Maiden está em cada um dos seus 76 minutos que não o fazem confundir com bandas especialistas no estilo como o Dream Theater. Estão lá os longos e trabalhados solos como em “Satellite 15...the Final Frontier”, belos riffs como o que abre “Starblind”. Sem contar a absurda introdução de Harris no baixo em “El Dorado”. De fazer qualquer fã do Iron soltar urros e palavrões de emoção. Deve ser de arrepiar ao vivo. Bruce está cantando ainda melhor lembrando as turnês do “Brave new world” e do “Dance of death”. No último disco de estúdio, achei sua voz um pouco distante e perdida em meio aos instrumentos. Em “The Final Frontier”, há espaço para todos brilharem e se complementarem numa obra que se encaixa perfeitamente, em engrenagens que se movem de forma sincrônica. É devastador de se ouvir.

Os temas do álbum vão de histórias de terror a preocupações econômico-climáticas do Iron. “Satellite 15”, que abre o disco e foi o primeiro videoclipe lançado pelo grupo (clique aqui para ver), é a história de um astronauta num planeta desconhecido que se vê na sua “fronteira final”, diante da morte que será causada por uma versão alienígena do Eddie Hunter, o mascote da banda. Mas ele não se arrepende de nada. Queria apenas uma chance de falar com a família que não terá. Afinal, Eddie não perdoa. Esmaga.

“El Dorado” tem como tema a crise econômica. Fala sobre uma “noite fria de inverno em que você navega para a glória sem saber o que é certo”. Após falar sobre as “pirâmides de ouro” e avisar que “o seu dinheiro foi deixado para queimar”, a letra de Smith, Harris e Bruce diz que “não há caminho fácil para um homem honesto hoje”.

“El Dorado tem uma letra cínica sobre a crise econômica que aconteceu. Parece com uma tempestade perfeita, pessoas emprestando dinheiro como loucas. Eu pensei: 'Isso vai ferrar algumas pessoas o suficiente e estamos numa boa'. E é sobre isso que é El Dorado. É sobre vender o mito que as ruas estão pavimentadas de ouro e perguntar depois: Onde eu assino?”, disse Bruce ao explicar a letra.

As guerras sem sentido como as do Iraque e do Afeganistão são o tema de “Mother of mercy” (“Sempre pensei que estava fazendo o certo/agora não tenho tanta certeza”, “Você me disse o que é certo/Mas eu vou lhe contar a verdade/Você me disse o que é honesto/Mas tudo a volta é morte e crueldade”) e “Coming Home” (Na agridoce reflexão/quando damos o beijo de despedida na terra/quando as ondas e ecos da/cidade se tornam fantasmas do tempo”), dois musicaços que vem na seqüência.

Mais rápida do que a média do disco, “The Alchemist” pode ser encarada como uma metáfora para um período de obscurantismo na vida de alguém que foi mergulhado na ignorância e nas trevas manipulado por um alquimista de histórias e informações. Agora o personagem tenta ser resgatado dessa caverna numa alegoria platônica que parece ressurgir de forma ainda mais iconoclasta em “Starblind” (“Somos a luz que traz o fim da noite”).

“Isle of avalon” parece uma alegoria para um renascimento enquanto o pregador Bruce Dickinson anuncia nietzschianamente a liberdade em “The Talisman”. O momento é de “abraçar o oceano” e se livrar das amarras.

Fechando o belíssimo disco do Iron, “The man who would be king” fala sobre arrependimentos de decisões tomadas enquanto “When the wild wind blows” parece uma alegoria de um apocalipse ambiental como se as decisões equivocadas do rei na canção anterior levassem ao clímax negativo do planeta quando o “vento sopra selvagem”.

É quando se chega a fronteira final da existência e deve-se buscar uma saída. A do Iron foi não optar pelo óbvio. E com isso seus fãs ganharam um álbum daqueles inesquecíveis e que já nascem clássicos.

Abaixo, algumas canções do novo disco:

“Mother of mercy”


“El Dorado”



“Coming Home”



“Satellite 15...The Final Frontier”



“Starblind”

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