domingo, 21 de junho de 2009

Uma inspiração e uma utopia

“Intrigas de Estado” é uma inspiração para um jovem repórter. O filme mostra a história de uma grande reportagem feita por um experiente jornalista, Cal McAffrey, vivido pelo quase sempre ótimo Russel Crowe, envolvendo conspirações no alto escalão do governo, muito dinheiro e interesses em jogo.

O filme de Kevin McDonald, mesmo diretor de “O último rei da Escócia” (2006), acompanha a investigação de Cal, um repórter sagaz apresentado em cena como tudo o que o jornalismo tem de mais sedutor, perigoso e, por que não, clichê, numa história que pode custar a cabeça do seu melhor amigo, o congressista republicano Stephen Collins, vivido pelo quase sempre péssimo Ben Affleck.

Ao seu lado, uma jovem jornalista que escreve um blog sobre o Capitólio, Della Frye (Rachel McAdams), e vai aprender na marra a ser repórter. A mulher é tratada quase como uma desqualificada, mas aos pouco vai provando o seu valor numa, digamos, bela integração entre o papel e o online.

O filme de McDonald é uma inspiração, mas também é uma utopia. Que nos leva a uma triste constatação. Com ou sem diploma, provavelmente nunca mais existirão repórteres como Cal. Seja pela pressão de donos de jornal que vêem apenas o lucro na frente, bem mostrada no filme na interpretação da editora-chefe Cameron Lynne (Helen Mirren e seu belo sotaque britânico) “apertando as bolas” de Cal porque seus patrões estão com a faca no seu pescoço, seja pelo imediatismo, a concorrência nociva e a necessidade de tudo ser para ontem, muito mais até do que o jornalismo sempre foi, que gera apurações incompletas e histórias semi-escritas, ou melhor, semi-contadas.

Depois da excitação de uma reportagem que todo jovem jornalista sonha em escrever, a conclusão que fica é que hoje jamais alguém atrasaria a capa de um jornal por quatro horas por causa de uma matéria importante. Há prazos e custos a cumprir. Todos no fio da navalha. O mais fácil seria ir contando a história em fragmentos, de preferência com idas e vindas como uma novelinha que venda diariamente mais e mais jornais. O lance é produzir em massa para a massa.

O tom parece depressivo, mas "Intrigas de Estado" é um dos melhores filmes do ano. Escrito pelo craque Tony Gilroy – que escreveu, entre outros, “O Advogado do Diabo” (1997) e os três filmes do herói Jason Bourne e escreveu e dirigiu o recente “Duplicidade” (2009) e o excelente “Conduta de Risco” (2007) – o trabalho tem diálogos primorosos que casam perfeitamente com a câmera de McDonald e a interpretação de Crowe, outro craque na tela.

Acontece que o fictício Cal McAffrey ou os bem reais Bob Woodward, Carl Bernstein ou Gay Talese estão tão distantes da realidade atual que bate um desânimo. O romantismo e a liberdade ficaram apenas para o cinema.

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