domingo, 20 de novembro de 2011

Recomeço

A banda no palco do Circo/Marcelo Alves
Eu vi Liam Gallagher cantando com o Oasis em um Wembley lotado de ensandecidos, sei lá, vou chutar, 65 mil ingleses e dois brasileiros (eu e um amigo. Não tenho registro de outros). Eles cantavam todas as músicas e iam a loucura jogando copos de cerveja para o alto dando banhos entre si (eu tomei uns dois). Eu não escrevo isso para contar vantagem ou ser pedante. Até porque viajar para a Europa é uma realidade bem mais palpável hoje para a classe média brasileira e em qualquer país do mundo você vê de tudo, o melhor e o pior do indivíduo tupiniquim.

Eu digo isso para mostrar a sensação de estranheza que é ver aquele cara que dizia que cantava na banda mais importante da história desde os Beatles entrando no acanhado Circo Voador para cantar diante de um público infinitamente menor.

E isso não é uma crítica ao Circo Voador. Pelo contrário. Adoro quando tem show lá. Só é estranho ver um cara que ali pelos anos 90 era quase um dos donos do mundo num palco acanhado e diante de uma pequena plateia. Embora efusivamente apaixonada.

O que deve ter passado pela cabeça de Liam Gallagher ao se dirigir de carro do seu hotel para a casa de show? E quando entrou no camarim? E, em seguida, ao passar por um espaço pequeno, entrar por uma portinha para ser saudado pelo seu apaixonado público? Infelizmente são respostas que não tenho. Se tivesse sido malandro como foi uma amiga minha, poderia tê-lo esperado após o show para tentar fazer estas perguntas. Diante de um surpreendentemente simpático Liam, ela até conseguiu uma foto com o cantor.

Mas esta é, por enquanto, a nova realidade de Liam. Aquele show que eu vi em Wembley há dois anos foi um dos últimos do Oasis que após aquela turnê se separaria depois da enésima briga de Liam com o seu irmão Noel. O cantor pegou o que fazia parte do Oasis – os guitarristas Gem Archer e Andy Bell e o baterista Chris Sharrock – e fundou uma nova banda, o Beady Eye. Noel preferiu preparar um disco solo que já é mais elogiado do que o primeiro trabalho da banda do seu irmão, “Different Gear, Still Spending”. Natural. Noel sempre foi melhor compositor do que Liam.

O cartaz lembrando a goleada do City/Marcelo Alves
Mas é com seus defeitos e virtudes que o Beady Eye se apresenta no Circo Voador. Sim, este é o novo Liam Gallagher. Um Liam Gallagher que se apresenta surpreendentemente simpático diante da plateia. Não sei se é o clima do Circo ou se são as doses cavalares de bajulação dos seus fãs, que vestiam camisas do Manchester City, o time do coração de Liam, também acionista do clube, e exibiam cartazes que lembravam uma recente goleada de 6 a 1 sobre o rival Manchester United ou, bem humorados, perguntavam: “Who the fuck are Man United”.

“Vou responder, Man United sucks!”, mandou o cantor após a primeira canção da noite, “Four Letter World”. É o jeito simpático de ser de Liam, que mostrou estar se divertindo em toda a noite. Quando viu o cartaz referente aos 6 a 1 sobre o United já no fim do show, Liam apontou para o alto e fez um “V”. Estava em casa, quase se sentindo no City of Manchester Stadium.

O show do Beady Eye é irregular como o disco. Muitos ficaram contrariados na casa e eu ouvi muitas críticas. De palavras suaves ao bom e velho “que merda”. Não acho que tenha sido para tanto. É preciso entender que esta é uma nova banda de um cantor que avisara previamente que não tocaria uma única canção do Oasis. “Talvez na próxima turnê”, disse em entrevista ao Globo alguns dias antes do show, quando desfilou a sua marra dizendo que já tinha "ótimas" canções para um segundo disco do Beady Eye.

Com o Oasis fora da festa, sobrou a Liam tocar “Different Gear, Still Spending” na íntegra em 1h20min de show. E dai surgem canções que não são tão ruins assim como a própria “Four Letter World”, “The Roller”, uma das primeiras que eu ouvi e gosto, “Bring the light” ou “The beat goes on”. E outras que são dispensáveis e certamente não estariam num show em que Liam pudesse selecionar um repertório maior.

Se fosse qualquer outro artista, aliás, alguém diria que o cantor teria sido ousado ao optar não usar o recurso fácil de cantar músicas de sua banda anterior. No caso de Liam, poderia ser pura marra de um cara que vivia as turras com o irmão. Talvez tentando provar que poderia fazer um disco e um show excelente sem a ajuda do brother. São coisas que só a psicologia pode explicar.

Difícil saber. Só posso dizer que esse toque de ousadia (ou loucura?) de Liam resulta num show morno para aqueles que ainda não conhecem direito o som do Beady Eye. Embora para os fãs, aqueles com camisas do Manchester City e alguns até com corte de cabelo igual ao de Liam, tenha sido intenso. Eu confesso ter ficado surpreso com a quantidade de gente cantando as letras do Beady Eye como se fossem sucessos do Oasis. Para estes, foi um show espetacular.

No final, parece que todos no palco saíram satisfeitos e muitos na plateia também. O Beady Eye não é o Oasis. Nem nunca será. Mas é um recomeço para Liam Gallagher. Quem sabe em breve ele não estará tocando novamente em Wembley.

Set list do show: “Four letter world”, “Beatles and Stones”, “Millionaire”, “Two of a kind”, “For Anyone”, “Three Ring Circus”, “The Roller”, “In the bubble with a bullet”, “Bring the light”, “Standing on the edge of the noise”, “Kill for a dream”, “The beat goes on”, “Man of misery”, “The morning son”, “Wigwam”, “World outside my room”, “Sons of the stage”.


Abaixo, alguns momentos do espetáculo:

"Four Letter World"

"The Roller"


"The beat goes on"

"Millionaire"

"Bring the light"

"Sons of the stage"

2 comentários:

Renato Grandelle disse...

Saudade daquele show no Wembley. Seria histórico pra mim, só pelo local e pela magnitude da banda. Acabou sendo histórico pra milhares de outros, porque foi um dos últimos do Oasis. E o clima era tão bom que, mesmo eu não conhecendo quase nada do que se tocava, me diverti como em muito poucos shows que fui. Bom texto, Marcelo.

marcelo alves disse...

Valeu. Saudade daquele dia também. Foi muito bom. Estou com vontade de ter outras experiências de shows em locais gringos. Tomara que role. abs