quinta-feira, 26 de maio de 2011

Two days in my life

Paul na primeira noite no Engenhão/Reprodução
É preciso ser muito mal humorado, muito garoto enxaqueca, muito cri-cri para dizer alguma coisa de negativo sobre os dois shows de Paul McCartney no Engenhão nesta semana. Depois de mais de cinco horas e 38 músicas diferentes em dois dias e de mais de oito horas e 43 músicas diferentes em sete meses (não esqueçamos que eu ainda fui para São Paulo em novembro), muito do que eu tinha para dizer poderia ser uma repetição do que já dissera sobre o show de novembro. Afinal a turnê é a mesma e boa parte das músicas são as mesmas. Todas sempre executadas com perfeição.

Muita gente também já escreveu sobre os shows com muita propriedade como vocês podem ler neste link, neste link e neste link. Mas eu sou mala. E sou jornalista. Bom, mas isso é um pleonasmo. Como eu ia dizendo, sou muito mala e mesmo diante de um cavaleiro da realeza britânica vou dar uma cornetada e começar este texto pelas vírgulas, pelos poréns, pelas conjunções adversativas em geral.

Dear Sir, com todo respeito, “Obla-di-obla-da” não dá. “Obla-di-obla-da” é a prova irrefutável que os Beatles não são perfeitos. Eu tive três chances de ouvi-la ao vivo em sete meses e continuo achando-a ruim. Uma amiga no primeiro dia carioca tentou me convencer do contrário e não conseguiu. Outra amiga no segundo dia foi ainda mais assertiva e não conseguiu. Na próxima turnê, portanto, tira essa do set list e vamos tentar umas coisas diferentes porque a melhor coisa de “Obla-di-obla-da” é saber que depois dela vem “Back in the USSR”.

Também é preciso dizer que de novembro para cá o senhor só envelheceu meio ano. Está certo que não é todo mundo que tem o teu gás aos 68 anos, mas precisava diminuir 25 minutos do show em relação ao de São Paulo? Ficou devendo mais umas três ou quatro músicas.

As considerações acima são as únicas a serem feitas. Os parágrafos que se seguem são, em resumo, adulações, comentários elogiosos e percepções importantes sobre o quanto o show foi espetacular. E, claro, uma comparação entre os dois dias de Engenhão lotado (sim, é verdade, aconteceu). Se você duvida e acha que estou exagerando, é só ir para o fim deste post e ver os vídeos que eu pesquei no YouTube. Duvido que não mude de ideia.

Para começar, Paul McCartney é uma lenda. Não pelo que ele fez de genial com John Lennon e George Harrison (ah, tinha o Ringo Star também) em 10 anos e 12 álbuns de Beatles. Muito menos porque a sua carreira nunca saiu do Olimpo – pode ter no máximo dado umas derrapadas – quando ele resolveu formar os Wings ou ficou nos seus projetos solo. Ele é uma lenda porque sua música consegue ser, como a de poucos artistas atemporal, e ainda emociona caras que viram os Beatles no auge e crianças que jamais imaginariam estar tão perto de um ex-Beatle. Sua música ainda faz chorar uma jovem perto de mim que só cresceu ouvindo os discos, uma vez que a última passagem dele pelo Rio fora em 1990, 21 anos atrás, portanto.

Ele é uma lenda com um pacto com os deuses do rock que o fazem mesmo com quase 70 anos conservar uma garganta excelente para ainda cantar muito bem. Tem gente por aí (leia-se Ian Gillan), que faz vergonha até hoje e devia estar em casa tomando sopinha e vivendo das glórias do passado. 

Nesse mesmo pacto demoníaco, está acertado que ele deve estar acompanhado dos melhores músicos disponíveis no mercado. A “maravilhôsa” banda do Paul é isso aí. Dois guitarristas excelentes, Rusty Anderson, principalmente (esse cara é um monstro), e Brian Ray, que também toca baixo quando Paul pega na guitarra (e no piano, e no ukelele e o que mais aparecer pela frente), o baterista visceral-animal, mas que também tem o seu lado, digamos, fofo, e dá um show à parte em “Dance Tonight”, Abel Laborial Jr., e o tecladista Paul Wickens formam a cozinha para o chef Paul brilhar com seus pratos sofisticados. E o trabalho é muito bem feito.

Depois de 51 anos de uma bem sucedida carreira, não dá para dizer algo menos do que perfeito de Paul McCartney no palco. E essa é uma qualidade, mas um outro porém do show e que fez o segundo dia ser melhor do que o primeiro. Se no domingo, Paul executou tudo com perfeição até demais, aparentemente tudo como fora ensaiado, inclusive suas frases em português já ditas em São Paulo, na segunda-feira o cantor improvisou um solo em uma das músicas, estava mais descontraído, mais alegre, exibiu um novo conhecimento de português, o seu “demaissss”, e até criou uma letra com três ou quatro frases para agradecer pela hospitalidade dos cariocas. Enfim, o cara estava se sentindo em casa.

Paul talvez ainda estivesse inebriado com o que vira na véspera, quando dezenas de pessoas o surpreenderam com cartazes escritos “nanana” e balões durante a execução de “Hey Jude”. Ele ficou visivelmente emocionado com o movimento que, conforme me contou uma boa fonte, começou pelo Facebook. O cantor comentou com a banda na hora e fez questão de agradecer durante o bis, antes de cantar “Lady Madonna”, dizendo que aquilo tinha sido “fantástico”. No dia seguinte, mais elogios através da assessoria de imprensa.

“Foi muito emocionante porque os fãs tiveram todo esse trabalho. Eles poderiam apenas ter vindo ao show e assistido, mas se falaram antes para criar este momento tão especial”.

Além de menos engessado do que o primeiro, o segundo show teve cinco músicas diferentes no set list. Do primeiro dia saíram “Hello Goodbye”, que abriu os trabalhos, “Letting Go”, “Drive my car”, “I’ve just seen a face” e “Get Back” para que pudessem entrar na segunda-feira “Magical Mistery Tour” (e poucas músicas são mais perfeitas para abrir um show do que essa), “Coming Up”, “Got to get into my life”, “I’m looking through you” e “I saw her standing there”. As mudanças acabaram deixando o set mais interessante, apesar da ausência de “Letting Go”, uma canção que gosto muito.

Se Paul McCartney não tinha o que provar, o Engenhão sim passava por um teste importante. Pela primeira vez o estádio recebia um grande show de rock e precisava se mostrar viável enquanto o Maracanã, onde Paul tocou em 1990, está em obras para a Copa do Mundo de 2014. E o resultado foi bastante positivo.

Desde o início, parecia que tudo estava sendo feito para fazer o Engenhão dar certo. Havia muitas pessoas para dar informação do lado de fora e lá dentro os comes e bebes eram os melhores que eu já vi num show de rock (embora fossem os olhos da cara). A saída foi confusa, é verdade, mas é culpa das ruas estreitas no entorno do estádio e de haver uma única passarela para atender uma multidão que queria pegar o trem ou simplesmente atravessar para o outro lado da estação. Mas com paciência tudo correu bem e sem tumultos.

Só que nada disso seria levado em conta se o fator principal não tivesse sido aprovado: a acústica do estádio. Alvo de reclamação de torcidas que não sentem seu canto reverberar nos jogos como no Maracanã, confesso que isso era uma das minhas grandes preocupações. Só que o resultado foi excelente. Ouviu-se o Paul McCartney perfeitamente e todos os instrumentos da banda sem atropelos. O som lá é melhor do que na Apoteose, por exemplo, onde tudo varia de acordo com o equipamento que é levado. Rogers Waters e Rush foram perfeitos, mas o Iron Maiden teve sérios problemas, por exemplo.

Com isso, o Engenhão se credencia para novos espetáculos. Quanto ao Paul, eu não estou cansado ainda da maratona. Se ele quiser voltar para mais um show, estamos aí.

O set list do primeiro dia: “Hello Goodbye”, “Jet”, “All my loving”, “Letting Go”, “Drive my car”, “Sing the changes”, “Let me roll it”, “Long and widing road”, “1985”, “Let Em in”, “I’ve just seen a face”, “And I love her”, “Black Bird”, “Here Today”, “Dance Tonight”, “Mrs. Vanderbilt”, “Eleanor Rigby”, “Something”, “Band on the run”, “Obla-di-obla-da”, “Back in the USSR”, “I gotta feeling”, “Paperback Writer”, “A day in the life”, “Let it be”, “Live and let die”, “Hey Jude”, “Day Tripper”, “lady Madonna”, “Get Back”, “Yesterday”, “Helter Skelter” e “Sgt. Peppers lonely hearts club band/In The End”.

O set list do segundo dia: “Magical mistery tour”, “Jet”, “All my loving”, “Coming Up”, “Got to get you into my life”, “Sing the changes”, “Let me roll it”, “The long and widing road”, “1985”, “Let em in”, “I’m looking through you”, “And I love her”, “Black Bird”, “Here Today”, “Dance Tonight”, “Mrs. Vanderbilt”, “Eleanor Rigby”, “Something”,  “Band on the run”, “Obla-di-obla-da”, “Back in the USSR”, “I gotta feeling”, “Paperback Writer”, “A day in the life”, “Let it be”, “Live and let die”, “Hey Jude”, “Day Tripper”, “lady Madonna”, “I saw her standing there”, “Yesterday”, “Helter Skelter” e “Sgt. Peppers lonely hearts club band/In the end”.

Abaixo, alguns dos grandes momentos dos shows.


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