
É um Rio menos veloz, menos sujo com a inocência do carnaval de rua e onde o jazz anda disputando espaço com o nascente rock and roll, invenção americana aportando na cidade que é o coração e a alma do Brasil. Mas na Lapa, essas “músicas moderninhas” não tem vez nas casas de dança onde brilham o samba e o choro. Casas estas coladas aos puteiros com o que há de melhor e pior para se satisfazer de acordo com o gosto do freguês.
Demorou 26 anos – desde “Eu sei que vou te amar” (1984) - para que o jornalista Arnaldo Jabor deixasse um pouco de lado sua verve ácida com que vocifera contra os desmandos e escândalos do governo Lula e sua futura sucessora Dilma Rousseff e voltasse a pegar numa câmera para rodar um Rio de Janeiro dos seus sonhos. Um Rio de Janeiro idílico presente na sua memória e por vezes retratado em suas crônicas no Segundo Caderno do Globo.
Agora o pipoqueiro, as prostitutas, o avô e tantos outros personagens ganharam imagem, cor, falas e movimento num roteiro de um filme essencialmente nostálgico com uma visão romântica da cidade que o cineasta conheceu a partir do seu nascimento há 70 anos.
Essa poderia ser uma definição apressada de “A Suprema Felicidade”, novo filme de Jabor após esse longo hiato. Outra descrição básica é o óbvio que o filme conta a história do crescimento e do amadurecimento do jovem Paulinho (Jayme Matarazzo, que faz o personagem na adolescência e idade adulta) e sua relação com o avô (um estupendo Marco Nanini, dono da película), num Rio de Janeiro entre o fim da Segunda Guerra Mundial em 1945 e o fim da década de 50 e início da década de 60.
É um enredo simples num roteiro que, é verdade, se perde por vezes nas suas idas e vindas (ou faz com que nos percamos) e tem cenas que parecem não ter muito nexo com relação ao resto da história. Mas assim também não é a vida? Por vezes não nos deparamos com situações sem sentido que nos tiram do eixo normal, do destino previamente traçado e depois que passamos por elas retomamos o rumo anterior? Ou não?
Poderia se dizer que o filme de Jabor é sobre nada. E alguns amigos deste blogueiro comentaram isso para criticá-lo. Mas é também sobre tudo porque ele é um pouquinho da vida. Uma reflexão sobre essa atividade pulsante que gosta de quem gosta dela como bem lembra o personagem de Marco Nanini.
Sim, “A Suprema Felicidade” é por vezes cansativo. Talvez funcionasse melhor com uns 20 minutos menos. Ele tem também um ritmo bem menos acelerado do que nos acostumamos a ver hoje em dia e por isso às vezes causa rejeição de quem o assiste. Mas não é diferente nessa questão específica do ritmo de qualquer Fellini ou Godard. E acho que isso é um problema mais do espectador, não do filme.
Se você se perde nestas idas e vindas sem ordem cronológica, é aí que vale se apegar aquela definição básica do neto que aprende os segredos da vida com o avô apaixonado por cada segundo que lhe resta e por tudo o que ela, a vida, lhe oferece descritas acima. E apreciar o filme sem moderação ou pré-conceitos.
“A Suprema Felicidade” pode não ser a película que entrará na lista de melhores da sua vida, mas ele é um trabalho simpático (ou fofo, como descreveu uma amiga minha) do diretor que consegue nos brindar com esse Rio mais romântico e único para quem o viveu. Eram tempos pré-“Cidade de Deus” (2002) e “Tropa de Elite” (2007).
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