domingo, 19 de outubro de 2008

Pequenos grandes shows


Sempre gostei de assistir à mega-concertos mesmo de bandas que eu não seja muito fã. Para um aficionado por espetáculos como eu, é muito legal ver toda a produção de um show, as eventuais surpresas preparadas, enfim, há muito por trás de uma banda e no mundo do rock a música é o que há de mais importante, mas não a única coisa a admirar. O que seria o Kiss sem toda aquela teatralidade de Genne Simmons e cia. com sangue, explosões, fogos de artifício, etc? Uma grande banda, mas talvez não uma banda lendária.

Com esse espírito apreciador vi, por exemplo, um bom show do Police no Maracanã no ano passado, embora não considere a banda de Sting nem uma das 50 melhores da minha lista particular.

Por outro lado, e sem que isso seja contraditório, também sempre gostei de pequenos shows, que fossem focados mais naquela coisa de baixo-guitarra-bateria-voz e platéia. Tudo meio improvisado, simples, com uma banda no palco e um público honesto e fiel.

A cada dia, porém, eu gosto mais desses pequenos grandes shows do que dos mega-concertos que rolam por aqui. Na semana passada, tive mais uma mostra de como eles estão mais prazerosos.

Estive no Circo Voador para ver pela segunda vez o Mudhoney tocar ao vivo aqui no Rio de Janeiro. A última já havia sido espetacular. Lembro-me até hoje de que após vê-los abrindo para o Pearl Jam no show de dezembro de 2005, disse que o espetáculo magistral da banda de Eddie Vedder fora, para mim, gratuito, pois o Mudhoney já havia “pago o ingresso”, como se diz na gíria.

Desde aquele show espetacular, o Mudhoney lançou mais dois discos (a banda tem nove no total): Under a Billion Suns (2006) e The Lucky Ones (2008). E veio uma vez ao Brasil antes do show que vi, mas só tocaram em São Paulo no ano passado.

Assim, esta apresentação foi a primeira desde aquele dia 4 de dezembro de 2005. Num palco diferente (o grupo tocara no Sambódromo) e com muito menos gente – dos 40 mil daquela ocasião para uns mil ou talvez um pouco mais de agora – a banda de Seattle formada por Mark Arm (vocal e guitarra), Steve Turner (guitarra), Matt Lukin (baixo) e Dan Peters (bateria) manteve ao menos duas semelhanças com relação ao show de três anos atrás: a potência do seu som e uma apresentação irretocável.

O público era pequeno, mas aguerrido. Cantava boa parte das músicas, pulava muito, fazia as tradicionais (e, convenhamos, desnecessárias) rodas no meio da pista, enfim, era uma platéia empolgada. Muitos ali já tinham visto o Mudhoney tocar pelo menos uma vez, mas mantinham a alegria de ver a banda.

E aí está o grande diferencial dos shows pequenos atualmente. Os fãs ficam onde realmente deveria estar, grudados no palco, tentando subir para tocar nos ídolos e sendo violentamente jogadas para fora, fazendo toda aquela algazarra saudável. Bem diferente do cordão de isolamento chamado área vip dos médios e grandes shows da atualidade aonde os verdadeiros fãs, aqueles que chegam cedo para ficarem mais próximos do seus ídolos, aqueles que contam cada centavo do dinheiro para comprar o ingresso sempre absurdamente caro (o do Mudhoney nem estava tão caro, pois todos podiam pagar meia desde que levassem um livro ou um quilo de alimento não perecível para doar), ficam tão distantes daqueles que eles tanto admiram.

O preconceito forjado por organizadores incompetentes de espetáculos não existe em shows pequenos. Dessa forma, o fã fica próximo do ídolo e acontece aquela saudável alimentação cíclica. A banda toca bem, o público se empolga e faz a banda tocar melhor que empolga ainda mais a sua platéia. Isso faz os concertos serem inesquecíveis e diferencia um show correto, mas frio como o do Police de uma apresentação incendiária como a do Mudhoney ou a de um Iggy Pop, por exemplo.

Sem contar que só um show pequeno numa casa pequena, embora bastante aprazível, como o Circo Voador poderia proporcionar um encontro antes da apresentação entre fãs e banda como aconteceu com os aficionados que chegaram cedo na casa. Eles puderam tirar fotos, pedir autógrafos, gritar e espernear com a presença fortuita de Mark Arm e Steve Turner, que chegaram por volta das 23h, pouco antes do Rockz iniciar o show de abertura.

Por falar em Iggy Pop, é impossível não lembrar dele ao ver Mark Arm no palco. Nos momentos em que está sem a sua guitarra ele parece o velho roqueiro cantando. Os mesmos trejeitos, a mesma disposição. Um animal no palco. Quando o set exige mais um guitarrista, ele se transforma naquilo que Seattle produziu de melhor. É quase um Kurt Cobain no auge.

Nas mãos do Mudhoney está o que restou do grunge. O som que viveu o seu auge nos anos 90 capitaneado pelo Nirvana e pelo Pearl Jam, mas que tinha outros dois grandes representantes no Soundgarden e no Alice in Chains, acabou saindo do cenário com a bala que matou Cobain e a mudança de estilo da banda de Eddie Vedder para um rock mais tradicional.

É a cada show do Mudhoney, porém, que o pessoal da minha geração ressuscita as camisas de flanela xadrez e vai para imensas rodas no meio da platéia para celebrar por um momento aqueles dias pós-Nevermind (1991) e Ten (1991), talvez os dois mais importantes discos do grunge, respectivamente do Nirvana e do Pearl Jam.

Nas quase duas horas de espetáculo, a banda procurou cobrir toda a sua história com muito peso, distorção e tudo o mais que caracteriza o grunge. Se clássicos como “Touch me, I’m sick”, primeiro single do álbum de estréia do Mudhoney, “Superfuzz Bigmuff” (1988), continuam sendo uma das favoritas, e outras grandes músicas como “You gotta it (keep it out my face)”, “Sweet young thing and sweet no more” e “Hate the Police”, mostram que o Mudhoney não banda de uma música só, as novas canções mostram a qualidade do novo trabalho do grupo.

Cinco delas foram cantadas – pouco menos da metade do novo disco - e tiveram ótima recepção da galera. “The Lucky Ones” é a melhor, mas “I’m Now”, “Next Time” e “Tales of Terror” também têm seu valor e ajudam a manter o peso da banda. Elas também comprovam que o Mudhoney continua sendo uma banda essencial e que com eles o grunge nunca morrerá.

Foi difícil escolher quatro vídeos para postar aqui. Aqui vão algumas pedradas citadas acima:
“Touch me, I’m sick”


“You gotta it (keep it out my face)”



“Sweet young thing and sweet no more”



“The Lucky Ones”



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