terça-feira, 19 de agosto de 2008

O Ameriquinha do mundo

No momento em que escrevo este texto, o Brasil ocupava o 39º lugar no quadro de medalhas dos Jogos Olímpicos de Pequim. Atrás de “potências” como Estônia, Mongólia, Zimbábue, Etiópia e Coréia do Norte com uma única medalha de ouro e cinco de bronze. Um desempenho pífio para um país que tem dimensões continentais.

É claro que até o fim dos Jogos o país vai melhorar sua posição no “ranking” – ainda faltam as medalhas certas do vôlei e futebol feminino, por exemplo -, vai conquistar mais medalhas. Quem sabe até supere o recorde de ouros (cinco em Atenas, há quatro anos) e de total de medalhas (16 em Atlanta-1996). Ainda assim, embora muitos dirigentes – aqueles de sempre, aliás - estejam preparados para alardear que será o melhor desempenho da história do Brasil nas Olimpíadas, a verdade é que o país mais uma vez terá uma participação lamentável nos Jogos.

O Brasil é campeão mundial sim de desperdício de talento. Não preciso viajar pelo país ou mesmo sair daqui da tela do meu computador para saber que diariamente este país perde campeões, os joga no esgoto mesmo. Pela falta de oportunidades, pela falta de políticas públicas, de parcerias sérias com empresas privadas, com escolas, universidades.

Tudo é desperdiçado enquanto o país vive a ilusão dos Jogos Pan-Americanos. Quando a Olimpíada vem no ano seguinte o Brasil conhece a sua verdadeira dimensão que é a de um país pequeno. Do tamanho do Bahrein, Camarões ou Panamá, com quem divide a “honra” de ter uma única medalha dourada.

É muito desperdício de talento em 180 milhões de habitantes e uma área de mais de oito milhões de quilômetros quadrados. É triste notar que a cinco dias do fim das Olimpíadas, 636 medalhas foram distribuídas e o país conquistou apenas seis. Está atrás não apenas de “potências” como Azerbaijão, Geórgia e Quênia, mas de atletas como Michael Phelps, fenômeno da natação que conquistou oito medalhas de ouro em Pequim. Se Phelps fosse um país, diria que certamente terminaria os Jogos na frente do Brasil no quadro de medalhas. Não é difícil imaginar isso, uma vez que o Brasil nunca conquistou mais do que cinco medalhas de ouro em uma Olimpíada.

O Brasil é um gigante que esportivamente nunca acordou. As medalhas de bronze conquistadas por Keitlyn Quadros, Leandro Guilheiro e Tiago Camilo, pelas meninas da vela, e o ouro e o bronze do nadador César Cielo, assim como todas as outras desde o atirador Guilherme Paraense, ouro em Antuérpia (1920), foram vencidas por heróis. É disso que o país vive. De heróis que de quatro em quatro anos surgem para dar uma alegria a um povo que é simpático às demais nações exatamente porque nunca ameaçou a hegemonia esportiva delas.

Por mais que algumas confederações como a de judô e a de vôlei façam um bom trabalho que já atravessa pelo menos seis ciclos olímpicos, são casos isolados, atividades esparsas.

Quando este país deixará de ser uma nação de losers? Pois hoje, o Brasil é o Ameriquinha do mundo. Todo mundo adora. É uma espécie de segunda nação dos países desenvolvidos. Quando ganha uma medalha todos aplaudem e comemoram, assim como fazem as torcidas do Rio quando o América chega a uma decisão ou fica perto dela. Foi assim quando Cielo ganhou o ouro nos 50m livre. Todo mundo riu, chorou, se emocionou. Tudo lindo. É bom ver uma nação loser ganhar de vez em quando. Só que isso é muito pouco para um país gigante como o nosso.

Mas, salvo raras exceções, sempre vai se esconder a verdade da população. O oba-oba passa por todos, de órgãos oficiais até o povão. Não importa que Guilheiro ou Tiago Camilo tenham uma postura de verdadeiros campeões dizendo que não estão satisfeitos com as medalhas que ganharam e que podiam mais. Não importa que um judoca como Eduardo Santos , com uma história de vida de muito sofrimento (nestes dias vi na ESPN que o judoca Carlos Honorato leiloou um quimono para financiar uma operação no pé de Eduado o que fez com que ele pudesse continuar no esporte), diga com muita tristeza que não foi para Pequim para disputar e sim para ganhar.

O que vale é a babação cívica. É deixar a prova eliminado na primeira fase, mas feliz por estar em Pequim, satisfeito com a melhor colocação de um brasileiro naquela modalidade (normalmente algo entre o oitavo e o 12º), por rever os amigos e, o mais importante, quebrar o insipiente recorde sul-americano.

Não é que não devamos reverenciar os atletas que conquistam medalhas sob a bandeira do país (e não para o país como gostam de dizer os babadores cívicos). Devemos sim porque eles são heróis.

Mas ao mesmo tempo é preciso mostrar o desperdício de talento a que este país se impõe. E cobrar uma postura decente dos dirigentes brasileiros. Antes de gastar milhões como bobagens como uma candidatura às Olimpíadas de 2016, é preciso investir no esporte de base, desenvolver campeões e, obviamente, investir em melhorias para a população no país. Primeiro você oferece serviços de qualidade, depois se candidata a sediar um evento. Não o inverso. O Brasil não mereceu a Copa do Mundo e não merece receber as Olimpíadas.

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