terça-feira, 10 de outubro de 2017

O novo Blade Runner

Tá meio vazio aqui, né
Retomar histórias de sucesso do passado ou que tornaram-se cult são sempre um desafio. Mas se a arte contemporânea caracteriza-se muito pela reciclagem, o pastiche, o meme e as citações, o cinema não iria atuar na contramão dessa história. Por isso, as salas vêm sendo enxurradas de franquias de dinheiro fácil ou histórias que apelem para uma memória afetiva do espectador. O recente filme do “Pica-Pau” é uma clara estratégia de reciclar o personagem querido dos desenhos animados num filme que combina animação com atores de carne e osso. “Blade Runner 2049” é a aposta do momento.

Dirigido por Ridley Scott, o filme de 1982, contava a história do policial Rick Deckard (Harrison Ford), um caçador de replicantes que haviam escapado da fábrica Tyrell e precisavam ser eliminados. Neste futuro distópico imaginado pelo conto do escritor Phillip K. Dick, eram discutidos temas como a humanidade e o direito das máquinas de viverem como se humanos fossem, já que elas haviam evoluído de tal forma a terem sentimentos, ou a emularem sentimentos. Enquanto os replicantes viviam à margem da sociedade, Deckard encontrava-se num dilema ao ver-se apaixonado por Rachel (Sean Young), uma evolução criada pela Tyrell. Uma máquina quase humana.

“Blade Runner” passava-se no início do século XXI e a sociedade que vivemos é bastante diferente da versão futurista retratada por Scott. A nova versão dá um salto de 40 anos na história e imagina uma sociedade ainda mais isolada, vazia e pessimista. As novas versões dos Nexos são ainda mais realistas e os próprios Blade Runners são versões criadas e não seres humanos nascidos para caçarem as máquinas.

No mundo imaginado pelo diretor canadense Denis Villeneuve, os lugares são monocromáticos, a sensação de vazio é enorme e um isolamento depressivo grita na tela ao mesmo tempo em que os cenários são magníficos. É nele que vive K (Ryan Gosling), um Blade Runner que recebe uma missão de matar uma série de replicantes antes que a existência deles seja exposta para a sociedade.

Mas se a tenente Joshi (Robin Wright) quer encobrir o segredo da existência de uma replicante grávida, Niander Wallace (Jared Leto, que vai se notabilizando por personagens esquisitos tal qual um neo-Johnny Depp), o dono das empresas que assumiram o espólio da Tyrell, quer obter toda a informação possível desta evolução natural para trabalhar em cima dela numa geração ainda mais evoluída.

K, porém, tem seus próprios planos. Ele mesmo quer saber o quanto tem de humanidade e o quanto de sua memória não passa de implante. Concentra-se em K toda a questão do filme que reflete sobre o que poderíamos definir como o direito dos replicantes à vida e à humanidade.

“Blade Runner 2049” tem um profundo respeito pela obra original e dialoga maravilhosamente bem com o primeiro filme realizado há 35 anos. A forma como são inseridas as referências ao trabalho de 82 saem perfeitamente e a participação de Harrison Ford retomando o papel de Deckard é a cereja no bolo de um filme que funciona muito bem do início ao fim e tem uma beleza que vai da cinematografia à trilha sonora.


Cotação da corneta: Nota 9.

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