terça-feira, 23 de maio de 2017

O Arthur das ruas

Espada maneira. Vou levar para mim
Para Guy Ritchie a história da humanidade se resume a brigas de gangues nas ruas. Deve ser alguma frustração por ter sido Martin Scorsese e não ele a ter feito "Gangues de Nova York" (2002). Se convidassem Ritchie a fazer uma nova versão da Branca de Neve, os anões seriam sujos, frequentariam puteiros, cuspiriam no chão e falariam palavrões e gírias como "mano" e "brou" enquanto a personagem principal seria toda tatuada e lutaria um kung fu que aprenderia com o seu mestre chinês. 

Não importa o tempo histórico. Não importa se eu estou no século XX, XIX ou na Idade Média. Tudo para Ritchie não passa de brigas de garotos machos, descolados e malandrões pelo poder. 

Assim ele desconstrói/destrói a lenda do nosso querido Rei Arthur nesse "Rei Arthur: a lenda da espada". No filme para lá de constrangedor, Art (sim, o personagem de Charlie Hunnam tem um apelido de infância maneiro que ganhou nas ruas, choque) foi mandado embora num barco pelo pai, o rei Uther (Eric Bana), após uma trairagem do tio Vortigern (Jude Law, mais afetado que um pavão frondoso). Titio sabia que "the night is dark and full of terrors" e resolveu se aliar ao lado negro da força para ser um cara fortão com uma foice maneira e brincar com fogo. Além de tomar o trono para si. 

O que o Jude Law não sabia é que ao perder o sobrinho no mundo (que não sabemos como sobreviveu na longa jornada de barco, sem comida e bebida, de Camelot até Londres, ops, "Londínia"), ele estava vendo nascer um monstro. 

Criado por prostitutas, convivendo com vikings e sendo treinado pelo Cem Olhos, que ganhou um emprego nessa produção depois do cancelamento de "Marco Polo", Art virou um homem pronto para a vida. Honesto, justo, forte e macho. Pronto para enfrentar quaisquer forças dessa Inglaterra bagunçada e cheia de druidas e magos que ecoam magias possuidoras de bichos que deixariam o Brandon Stark embasbacado. 

Mas ninguém saberia da sua existência se o povo não começasse uma campanha contra o rei usurpador. Nas ruas, símbolos da oposição eram pichados anunciando a volta do verdadeiro rei e a galera parava em todas as tabernas dizendo: "Primeiramente, fora Vortigern". 

Isso começou a incomodar o rei, que precisava se impor pela força. Ele, inclusive, desconfiava que já estava sendo grampeado dentro do seu próprio palácio. 

Mas a coisa começou a feder mesmo quando a maré baixou e revelou AQUELA espada. Aí Vortigern tremeu na base, amigos. Começou a buscar cada jovem pela cidade atrás de quem possa tirar a espada da pedra de uma forma mais obsessiva do que o príncipe com o sapatinho de cristal atrás da Cinderela. 

É quando vem um dos momentos mais constrangedores desse filme que definitivamente não precisava ter sido feito (#Cornetarevolts). Art não sabe muito bem como pegar na espada e recebe instruções de... David Beckham! Sim, David Beckham. Se fossem instruções sobre como bater falta, tudo bem. Mas tirar uma espada da pedra, não dá. 

A partir daí acontece aquilo que já conhecemos no cinema. Começa a jornada do herói rumo ao conhecimento, ao poder e à vingança. Afinal, o nosso amigo Art é o rei legítimo, o herdeiro do trono em Camelot. Trono este que foi usurpado pelo titio. No meio disso tudo é um tal de você precisa dominar a espada, a espada te domina, você não pode desviar o olhar da espada, a espada levanta mais poeira que fãs em show da Ivete Sangalo, a espada isso, a espada aquilo. A espada tem poder, já sabemos. E enquanto isso, Art faz doce. Diz que não serve para o cargo, que não quer o podere etc e tal. Quando sabemos que o aedes aegypti azul com o vírus da política o picou há muito tempo. 

Só que a situação se desenrola de uma maneira tão absurda e o Guy Ritchie se coloca numa situação tão irreversível, que ele precisa lançar mão de um deus ex-machina para equilibrar as forças. Que desagradável. 

Enfim, durante todo o filme, vemos muita correria, muita pancadaria, pegadinhas e aquela linguagem das ruas cheia de gírias e malemolências. O que não vemos é Guinevere. Nem Lancelot. Merlim? É apenas uma imagem distante de três segundos. 

Parece que essa galera ficou para um segundo filme. Preferimos que ele não aconteça, Guy. Vá ler Bernard Cornwell que é o melhor que você pode fazer. 


A Corneta está decepcionada. "Rei Arthur: a lenda da espada" vai ganhar uma nota 3

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