sexta-feira, 9 de novembro de 2018

A volta de Lisbeth Salander

Que fria em que você se meteu, Lisbeth
Três atrizes já interpretaram Lisbeth Salander em cinco filmes da saga Millenium. Quem mais apareceu é Noomi Rapace, que esteve nos três primeiros filmes. Depois vieram Rooney Mara e agora Claire Foy. Cada uma trouxe um viés para a hacker mercenária que sai pela Suécia fazendo trabalho pouco republicanos e salvando mulheres do jugo de violência e horror masculino. 

Claire Foy trouxe uma combinação do seu carregado sotaque britânico com um lado sombrio que combinou demais com o clima soturno e o frio sueco exibidos em “A garota na teia de aranha”, nova trama de Lisbeth Salander vertida para o cinema.

Esta história, porém, não é do autor sueco Stieg Larsson, criador da série e que morreu em 2004 de uma parada cardíaca após apenas três livros lançados. A história da teia de aranha é de David Lagercrantz, autor e jornalista sueco que foi contratado pela editora Norstedts para continuar a saga deixada por Larsson, que tinha planos de lançar dez livros.

A diferença, porém, na narrativa fica muito clara já na abordagem em comparação com o filme anterior, “Os homens que não amavam as mulheres” (2011). Se aquele era uma história de suspense e mistério que ia aos poucos desenvolvendo a curiosidade do espectador até o desfecho da história, neste há uma clássica história de acerto de contas com o passado e drama familiar, associada a uma roupagem que envolve política, corrupção, mercenários e uma organização criminosa. Tudo com uma postura como se Lisbeth Salander fosse uma versão dark de um James Bond ou Jason Bourne. E isso não necessariamente precisa ser visto sobre um aspecto 100% positivo ou 100% negativo.

Claire Foy é um caso à parte. Bo filme, ela despe-se definitivamente de toda a imponência e liturgia imposta pela s duas temporadas vivendo a rainha Elizabeth em “The Crown” para interpretar essa Lisbeth sem barreiras físicas, do corpo e da alma. É curioso ver essa transformação de quem ficou sendo a cara da rainha até 2017 e agora emenda dois trabalhos no cinema tão diferentes e interessantes. O papel de Janet Armstrong em “O primeiro homem” (2018) e agora de Lisbeth. 

“A garota na teia de aranha” é um bom filme. Nada marcante, um tanto previsível mas um filme bom de se acompanhar. Ainda que esta avaliação esteja prejudicada pela falta de base para analisar comparativamente à obra literária. É impossível para mim analisar se é fiel à obra. Mas apenas como cinema é interessante desse acompanhar. 

Talvez o grande problema deste filme seja a presença um tanto apagada do jornalista Mikael Blomqvist (Sverrir Gudnason). O Blomqvist de Gudnason não tem a mesma força que o de Daniel Craig no filme anterior. E nem o mesmo protagonismo. Em “A garota na teia de aranha”, Blomqvist segue em crise, mas é apenas mais uma peça movida no xadrez pessoal de Lisbeth. Que ela usa quando necessário. Ainda que fique claro que os dois compartilham um passado de questões mal resolvidas. 

Parte dos méritos do filme cabem ao diretor uruguaio Fede Alvarez. Ele soube captar muito bem o clima da saga. Um estilo dark nórdico, muitos tons escuros, faces gélidas - e a vilã Camila, vivida por Sylvia Hoeks, é um expoente disso - e a economia dos movimentos contrastando com cenas de luta claustrofóbicas. Os olhares também dizem muito do que se quer passar. 

São qualidades que mantiveram o fôlego da série. Talvez “A garota na teia de aranha” não seja melhor que “Os homens que não amavam as mulheres”, mas gostaria de ver Claire Foy interpretando mais uma vez a personagem. Lisbeth merece essa grande atriz. 

Cotação da Corneta: nota 6,5.


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