sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Cotação da corneta: 'Trinta'

Matheus brilhando como Joãosinho Trinta
Se a corneta tivesse poderes celestiais, fosse uma espécie de Chico Xavier da galhofa, tentaria entrar em contato com Tim Maia, Cazuza e Renato Russo só para fazer uma pergunta. E ai? Viram o filme do seu colega Joãosinho Trinta? Queriam um igual né? Diante da provocação, Tim Maia provavelmente soltaria uma série de impropérios contra a corneta, que encerraria a comunicação antes que eles me matassem na Matrix do plano superior.

Tudo isso é porque "Trinta", a cinebiografia sobre o famoso carnavalesco Joãosinho Trinta (Matheus Nachtergale), nove vezes campeão do carnaval carioca, é beeeem superior ao filme dos seus coleguinhas artistas. Acho que ver este filme pode dar aquela vontade nos fãs dos músicos citados acima de torcerem por um novo trabalho, uma segunda chance para os três no cinema.

"Trinta" mostra como todo carnavalesco é um pouco MacGyver. Se o velho herói do seriado “Profissão Perigo” transformava um chiclete, um arame enferrujado e um isqueiro em bomba atômica, o carnavalesco consegue dar sentido a um enredo que começa nas lendas do Maranhão (e não estamos falando sobre uma famosa família local) e passa pela corte francesa. Bom, quem curte carnaval acha que tudo tem uma lógica e quem sou eu para contestar? O importante é fazer com que na quarta-feira de cinzas todos ouçam DEZ, NOTA DEZ!

Ao contrário dos filmes dos seus colegas famosos, o diretor Paulo Machline, acertou em um ponto que faz “Trinta” ser melhor: não tentou abraçar o mundo. Ele partiu de uma premissa do próprio carnavalesco, que no filme diz que “menos é mais”. Se na cena em questão, isso vira uma desculpa para uma personagem exibir, digamos, todo o seu esplendor, em “Trinta” é uma bola dentro que dá foco à história e a deixa mais coesa e amarrada.

O ponto fundamental aqui é o momento em que Joãosinho inicia a sua carreira solo substituindo Fernando Pamplona no Salgueiro. Ali, enquanto prepara o desfile “O rei de França na ilha da assombração”, em 1974, ele tem que lidar com a desconfiança da comunidade de que seria capaz de tocar um carnaval inteiro numa escola grande. Seu enciumado antagonista é o chefe do barracão Tião (o sempre ótimo Milhem Cortaz), que queria o emprego para ele e, diante da negativa de Germano (Ernani Moraes), o poderoso chefão da escola, faz de tudo para derrubar Joãosinho.

O carnavalesco, no entanto, consegue dobrar Tião e seu parceiro de barracão, Calça Larga (Fabricio Boliveira), outrora conhecido como João de Santo Cristo naquele filme “Faroeste Caboclo” (2013), baseado na música da Legião Urbana e que preferimos esquecer.

Enquanto isso, vamos acompanhando pílulas da vida de Joãosinho. De como o bailarino João Jorge veio do Maranhão para dançar no Theatro Municipal e acabou se transformando naquele que viria a ser um dos personagens mais importantes do carnaval carioca. Tudo com muito luxo e riqueza, afinal, quem gosta de miséria é intelectual. Ainda bem que a corneta é do povo.

Poderia dizer que dentre as cinebiografias recentes sobre personagens brasileiros, “Trinta” mostra ser a mais competente. Mas isso é papo de intelectual. Na linguagem da corneta, diria que Machline sambou na cara da sociedade. E por isso, o seu filme vai ganhar uma nota 7.

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