quarta-feira, 12 de maio de 2010

Mais do mesmo (mas é bom)

Um indivíduo neurótico, hipocondríaco e/ou completamente nonsense não é uma novidade na vasta filmografia de Woody Allen. O próprio já o interpretou em trabalhos recentes como “Sonhos de Cassandra” (2007) e “O escorpião de Jade” (2001). Da mesma forma, Nova York não é um cenário absolutamente novo nas lentes da câmera do diretor, por mais que nos últimos anos ele tivesse dado uma “europeizada” nos seus trabalhos filmando em Londres (“Match Point”, de 2005, e “Scoop”, de 2006) e na Espanha (“Vicky Cristina Barcelona”, de 2008).

Assim sendo, o novo filme de Allen pode ser considerado um retorno ao ponto comum de sua zona de conforto? Sim, mas isso não é necessariamente um defeito.

Sinto-me à vontade para falar do diretor, pois estou longe de ser fã do trabalho dele. Acho que ele alterna filmes excelentes com outros que não consigo gostar. Não é que ele não tenha a qualidade abordada por muitos. Quem sou eu para dizer isso? É só uma questão de gosto pessoal.

Por outro lado, confesso que a cada dia gosto mais dos seus filmes. Talvez a idade e a experiência cinematográfica esteja me fazendo enxergar outros ângulos ou apenas tenha aprendido a apreciar seus filmes docemente leves, apesar da profundidade de suas mensagens passadas com sutileza e de forma cirúrgica.

Woody Allen consegue falar de Teoria das Cordas e física quântica como quem frita um ovo ou faz um miojo. E falar sobre o difícil de forma simples e se fazendo entender é uma arte.

Em “Tudo pode dar certo” nos deparamos com a história de Boris (Larry David), um frustrado indicado ao prêmio Nobel que vive num apartamento pequeno e sujo em Nova York e ganha a vida dando aulas de xadrez para crianças que ele considera em um nível de estupidez próximo ao dos protozoários. Um fim melancólico para uma mente considerada por ele mesmo privilegiada e brilhante.

Tão brilhantemente racional, Boris odeia os micróbios humanos e teoriza sobre tudo. Até sobre seus sentimentos por uma jovem que bate à sua porta à procura de comida e vai ficando após dobrar o seu mal humor. Melody (Evan Rachel Wood) é habilidosa na sua ignorância e consegue até criar uma relação com Boris. Relação esta que vai crescendo a partir da convivência entre duas pessoas tão diametralmente opostas. Para mostrar o crescimento da admiração daquele velho turrão conforme o tempo de convivência, Allen usa nada menos do que a matemática e insights filosóficos.

Como uma comédia de costumes, assim, digamos, moderno, Allen usa a história desses dois como linha central para criar um série de situações perpendiculares onde o acaso e o destino se mostram mais senhores da verdade do que qualquer decisão racionalmente tomada sob cálculos pré-medidos.


E nesse contexto, o diretor exercita o que ele tem de melhor: seu texto criativo que faz a plateia rir satisfatoriamente. Por isso, “Tudo pode dar certo” pode até ser mais do mesmo de Allen, mas é uma iguaria a ser apreciada com deleite.

2 comentários:

Anônimo disse...

Amei o filme, dei boas gargalhadas, degustei sem moderação e agora, como sobremesa, leio a sua precisa avaliação da película. Sou fã de Allen. Mas sou mais fã de você!

marcelo alves disse...

Obrigado pelas palavras. Mas eu nem chego aos pés desses caras.