segunda-feira, 11 de abril de 2016

Não é 'A grande beleza'

Que visão!
O grande perigo de você fazer um filme incrivelmente belo nos mais diferentes pontos de vista estéticos, é desejar repetir essa fórmula de sucesso que, por vezes, ou eu diria muito provavelmente, soará pálida em comparação com a obra que tangencia a perfeição.

"A grande beleza", o lindo filme de Paolo Sorrentino, mostrava Roma em seus melhores ângulos - e você pode imaginar o quanto isso pode ser deslumbrante - enquanto fazia uma reflexão ensaística sobre o que é belo e o quão fútil ou não uma vida pode ser. 

O resultado foi um estrondoso acerto de roteiro, direção e trabalho dos atores premiado com o Oscar de melhor filme estrangeiro em 2014. 

"A Juventude", o novo trabalho do diretor italiano, tenta ir no mesmo caminho de "A grande beleza", mas escorrega na tentativa de mimetizar um filme que alia competência a uma confluência cósmica de acertos que só encontra paralelos em explicações divinas. Para um diretor napolitano, oriundo de um país que é a sede da Igreja Católica, não soa como heresia esta evocação divina. 

É uma pena que nem sempre estes acertos se repetem. "A Juventude" pende para a caricatura na comparação com "A grande beleza" e não satisfaz plenamente mesmo quando descolamos o trabalho de qualquer passado de Sorrentino. 

Sim, o filme é belo. O cenário agora é um hotel-spa na Suíça que é a definição do conforto. Conforto inclusive para os olhos de quem vê a película com as paisagens típicas de um verão naquele país europeu. Campos verdes e cheios de flores, vaquinhas leiteiras, os Alpes ao fundo com neve eterna nos picos, a sensação eterna de tranquilidade e paz. O lugar ideal para o descanso de dois artistas ou para o desenvolvimento de um trabalho que exige a reflexão. 

É lá que se encontram o maestro Fred Ballinger (Michael Cane, tocante), e o diretor de cinema Mick Boyle (Harvey Keytel). Dois veteranos amigos que vivem momentos distintos de suas vidas. Um praticamente desistiu dela desde a morte da esposa e enfrenta problemas de relacionamento com a filha, Lena (Rachel Weisz). O outro está numa efervescência criativa e empolgado em trabalhar com jovens roteiristas para finalizar aquele que seria o seu filme-testamento. 

Música e cinema se aliam numa reflexão sobre a passagem do tempo, as fraturas acusadas por ele e o tempo que foi aproveitado ou desperdiçado numa existência que é única mesmo para os que acreditam em uma eventual volta. 

Enquanto Bellinger e Boyle vivem a amizade em que se eximem de contar frustrações um para o outro, o hotel paradoxalmente exibe uma coleção de hóspedes que passam, de certa forma, recados sobre a passagem do tempo. Isso vai do casal que não se fala, mas se entende, passa pelo personagem caricatural de Maradona, um ex-jogador genial que hoje se encontra obeso e decadente, e chega até ao monge budista que controla o tempo e espaço dentro de sua meditação. É senhor do seu tempo. 

Nas duas horas de filme, Ballinger e Boyle vão revelando desejos e frustrações. E nisso ganham a companhia de um ator que fez muito sucesso em um filme de ação e agora luta para ser reconhecido como artista pleno num filme de arte em que ele viverá Hitler. Trata-se de Jimmy Tree (Paul Dano). 

Não faltam reflexões também sobre o próprio cinema e a sua importância atual em comparação com a produção televisiva. Discussão bastante atual, pois há mais de uma década as séries de TV têm ocupado o lugar da arte e da vanguarda que já foi do cinema, hoje mais afeito a blockbusters e franquias que garantam um bom faturamento. Por mais que o circuito de arte sempre vá ter o seu espaço. 

"A Juventude", porém, não atinge plenamente o seu objetivo. Michael Caine e Keytel estão bem, mas o filme careceu de um roteiro que desenvolvesse melhor as questões abordadas. Paralelo a isso, há um excesso de cenas desnecessárias, que desviam do foco proposto. E pareceu um equívoco a tentativa de dar leveza ao filme (com o perdão do paradoxo) ao colocar um Maradona fake apenas pela piada (ou um capricho do diretor que, como eu disse acima, é de Nápoles, onde Maradona é rei). 


Entre o idílico das paisagens suíças e dos belos corpos de mulheres igualmente filmadas como presentes divinos, Sorrentino fica no meio do caminho no objetivo de buscar um novo "A grande beleza". Faltou a "A Juventude" estofo, camadas e melhor desenvolvimento de ideias. Sobrou beleza e um final impactante. Por isso, o filme receberá um 6,5 da corneta.

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