Dias difíceis na Noruega |
Hans
Petter Moland não tem nada em comum com Quentin Tarantino. Um é norueguês, nasceu
em Oslo, tem 59 anos e já foi descrito como o Ridley Scott da Noruega
(interpretem como vocês quiserem). O outro nasceu a 6.847km de distância da
capital do país nórdico, em Knoxville, no Tennessee, tem 52 anos e trabalhou em
uma locadora antes de resolver fazer seus próprios filmes. Moland, como vocês
podem ver, é mais velho. Mas parece que ele resolveu fazer uma homenagem ao
menino Tarantino em seu mais novo filme.
"O
cidadão do ano" parece até uma releitura de um dos filmes de Tarantino.
Tipo um cruzamento de “Kill Bill” (2003) com “Bastardos Inglórios” (2009) e uma
pitada de “Django Livre” (2012). Mas vocês poderiam misturar quaisquer outros
ingredientes da filmografia do diretor americano. O trabalho de Moland é o tipo
de cinema praticado pelo americano até o último floquinho de neve de uma
geladíssima cidade do interior norueguês (fiquei com frio só de ver o filme).
Vejam
o que o filme do diretor escandinavo tem em comum com o que Tarantino costuma
produzir:
1)
Uma história clássica de vingança
2)
Personagens no mínimo curiosos
3)
Piadas engraçadas e situações nonsense
4)
Um vilão excêntrico
5)
Sangue, sangue jorrado, sangue esguichando, todo o tipo de água vermelha
tingindo a neve
A
única diferença é que ele é falado em norueguês. É MA-RA-Vi-LHO-SO, amigos.
O
enredo é o seguinte. Stellan Skarsgard, que é o que os críticos gostam de
chamar de ator FETICHE do diretor, pois esteve em quatro dos seus sete longas,
é um cara do bem e um exemplo para a sociedade norueguesa. Seu personagem, Nils
Dickman (uma piada pronta para os versados em língua inglesa), foi eleito
recentemente o cidadão do ano pela comunidade local pelos seus serviços
prestados em afastar a neve das estradas com seus caminhões maneiros.
Mas
ele tem um filho encrenqueiro. Ingvar (Aron Eskeland) se mete com os caras
errados por causa de droga e o chefão do tráfico manda apagá-lo. Foi o maior
erro da vida de Greven (Pal Sverre Hagen). Ele provocará o desejo
“tarantinesco” de vingança em Dickman, que tal qual uma Arya Stark em
"Game of Thrones" fará uma lista de todos os que têm a obrigação de
mandar ao encontro de Deus mais cedo do que o destino esperava.
Greven,
ou melhor Ole Forsby (todos os mafiosos do filme tem um apelido no melhor
estilo mafioso clássico), merece um parágrafo a parte. Afinal, quantas vezes
vocês viram na história do cinema um vilão vegan obsessivo, que dá frutas e
verduras para o filho, o proíbe de comer aqueles cereais matinais e ainda
obriga os capangas a tomar suco de cenoura? Crueldade obrigar alguém a tomar
suco de cenoura. O cara é uma figura. Essa máfia norueguesa é o orgulho dos
programas de saúde, bem estar e beleza das TVs.
Mas
acho que a falta de carne não faz bem a Greven, pois ele está sempre muito
nervosinho. Participa até de cenas lamentáveis espancando a ex-mulher. No
mínimo merecia ser enquadrado na lei Maria da Penha.
A
história de Nils abre também uma ferida no acordo de cavalheiros que
noruegueses e sérvios têm na exploração do narcotráfico-perfumaria do país
nórdico. E uma morte inesperada gerará um problema com o Papa sérvio (Bruno
Ganz) e acrescentará um molho báltico nesta situação.
“O
cidadão do ano” também tem diálogos impagáveis. Do cara que reclama do frio
norueguês e ouve que, ou você tem bem estar social ou tem sol como nos países
africanos e sul-americanos, ao trecho em que os cidadãos bem vestidos são relacionados
com pessoas de partidos de direita, há momentos de muito bom humor no filme.
Além da contagem dos mortos de acordo com a religião de cada um.
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