Que visão! |
O grande perigo de você fazer um
filme incrivelmente belo nos mais diferentes pontos de vista estéticos, é
desejar repetir essa fórmula de sucesso que, por vezes, ou eu diria muito
provavelmente, soará pálida em comparação com a obra que tangencia a perfeição.
"A grande beleza", o lindo
filme de Paolo Sorrentino, mostrava Roma em seus melhores ângulos - e você pode
imaginar o quanto isso pode ser deslumbrante - enquanto fazia uma reflexão
ensaística sobre o que é belo e o quão fútil ou não uma vida pode ser.
O resultado foi um estrondoso acerto
de roteiro, direção e trabalho dos atores premiado com o Oscar de melhor filme
estrangeiro em 2014.
"A Juventude", o novo
trabalho do diretor italiano, tenta ir no mesmo caminho de "A grande
beleza", mas escorrega na tentativa de mimetizar um filme que alia
competência a uma confluência cósmica de acertos que só encontra paralelos em
explicações divinas. Para um diretor napolitano, oriundo de um país que é a
sede da Igreja Católica, não soa como heresia esta evocação divina.
É uma pena que nem sempre estes
acertos se repetem. "A Juventude" pende para a caricatura na
comparação com "A grande beleza" e não satisfaz plenamente mesmo
quando descolamos o trabalho de qualquer passado de Sorrentino.
Sim, o filme é belo. O cenário agora
é um hotel-spa na Suíça que é a definição do conforto. Conforto inclusive para
os olhos de quem vê a película com as paisagens típicas de um verão naquele país
europeu. Campos verdes e cheios de flores, vaquinhas leiteiras, os Alpes ao fundo
com neve eterna nos picos, a sensação eterna de tranquilidade e paz. O lugar
ideal para o descanso de dois artistas ou para o desenvolvimento de um trabalho
que exige a reflexão.
É lá que se encontram o maestro Fred
Ballinger (Michael Cane, tocante), e o diretor de cinema Mick Boyle (Harvey Keytel).
Dois veteranos amigos que vivem momentos distintos de suas vidas. Um
praticamente desistiu dela desde a morte da esposa e enfrenta problemas de
relacionamento com a filha, Lena (Rachel Weisz). O outro está numa
efervescência criativa e empolgado em trabalhar com jovens roteiristas para
finalizar aquele que seria o seu filme-testamento.
Música e cinema se aliam numa
reflexão sobre a passagem do tempo, as fraturas acusadas por ele e o tempo que
foi aproveitado ou desperdiçado numa existência que é única mesmo para os que
acreditam em uma eventual volta.
Enquanto Bellinger e Boyle vivem a
amizade em que se eximem de contar frustrações um para o outro, o hotel
paradoxalmente exibe uma coleção de hóspedes que passam, de certa forma, recados sobre a passagem do tempo. Isso vai do casal que não se fala, mas se entende,
passa pelo personagem caricatural de Maradona, um ex-jogador genial que hoje se
encontra obeso e decadente, e chega até ao monge budista que controla o tempo e
espaço dentro de sua meditação. É senhor do seu tempo.
Nas duas horas de filme, Ballinger e
Boyle vão revelando desejos e frustrações. E nisso ganham a companhia de um ator
que fez muito sucesso em um filme de ação e agora luta para ser reconhecido
como artista pleno num filme de arte em que ele viverá Hitler. Trata-se de Jimmy Tree (Paul Dano).
Não faltam reflexões também sobre o
próprio cinema e a sua importância atual em comparação com a produção
televisiva. Discussão bastante atual, pois há mais de uma década as séries de
TV têm ocupado o lugar da arte e da vanguarda que já foi do cinema, hoje mais
afeito a blockbusters e franquias que garantam um bom faturamento. Por mais que
o circuito de arte sempre vá ter o seu espaço.
"A Juventude", porém, não
atinge plenamente o seu objetivo. Michael Caine e Keytel estão bem, mas o
filme careceu de um roteiro que desenvolvesse melhor as questões abordadas.
Paralelo a isso, há um excesso de cenas desnecessárias, que desviam do foco
proposto. E pareceu um equívoco a tentativa de dar leveza ao filme (com o
perdão do paradoxo) ao colocar um Maradona fake apenas pela piada (ou um
capricho do diretor que, como eu disse acima, é de Nápoles, onde Maradona é
rei).
Entre o idílico das
paisagens suíças e dos belos corpos de mulheres igualmente filmadas como
presentes divinos, Sorrentino fica no meio do caminho no objetivo de buscar um
novo "A grande beleza". Faltou a "A Juventude" estofo,
camadas e melhor desenvolvimento de ideias. Sobrou beleza e um final impactante.
Por isso, o filme receberá um 6,5 da corneta.
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