Onde é a festinha à fantasia? |
Poucas pessoas ficam até os créditos
finais de um filme. Até aquele momento em que aparece que Pascoal Gumercindo
foi o assistente de maquiagem do senhor Cavill e Josefina Andrews foi a
cabeleireira para cenas de ação da senhorita Gadot. A corneta fica em ocasiões
especiais. E foi lá que ela viu uma situação que soou como uma anedota. Nos
agradecimentos especiais de "Batman vs Superman: a origem da Justiça"
estava o nome de Frank Miller.
Miller é um gênio responsável por
histórias clássicas do Demolidor e do Wolverine e por um cânone dos quadrinhos
chamado "Batman: o cavaleiro das trevas" (1986), justamente a HQ que
tem a tão comentada batalha entre o Batman envelhecido e o Superman em um futuro
distópico. Eu não posso falar por Miller, mas se fosse ele ficaria envergonhado
diante do trabalho equivocado (eu quis ser educado) de Zack Snyder no cinema.
Confesso que a última vez que fiquei
tão constrangido em uma sala de cinema foi quando vi "Cinquenta tons de cinza". A diferença é que não fiquei anos esperando para ver esse Sabrina
gourmetizado.
E ATENÇÃO: A PARTIR DE AGORA É
METRALHADORA DE SPOILERS EM TEXTÃO.
"Batman vs Superman" não é
um filme baseado em "O cavaleiro das trevas". E Snyder já havia
deixado isso claro. A questão é que o que ele nos apresenta como solução para
este filme que seria o embrião da Liga da Justiça é um nada. Uma junção de
erros, atuações sofríveis, roteiro sem pé nem cabeça e mal escrito e um filme
que é sem ritmo e até mal editado.
Passamos mais de uma hora e meia indo
de uma cena a outra sem que uma coisa tenha qualquer contato com a cena
seguinte e a anterior. O que Zack queria? Nunca saberemos. Só o que sabemos é
que ele pegou duas ótimas histórias (além do "Cavaleiro das Trevas"
há ecos de "A morte do Superman" ali) e transformou num papelão digno
de filme do "Quarteto Fantástico".
Os problemas de "Batman vs
Superman" são tantos que vou fazer em lista para facilitar o trabalho:
1- Ben Affleck não pode fazer filme
de super-herói. Ele destruiu o Demolidor, que ficou mais de uma década no limbo
até ganhar uma segunda chance. Obrigado, Netflix, te amo. Seu Bruce Wayne é
aquela coisa inexpressiva, olhar de estou zangadinho com o mundo, com um
grisalhinho próximo às orelhas dignos de quem esqueceu de passar Grecin. #voltaChristianBale
2- Henry Cavill, amigos, não funciona
quando não está brigando. Eu disse isso em "O homem de aço" (2013) e
mantenho a crítica.
Eu sou mais bonito que você |
3- O Batman não tem superpoderes, mas
tem dinheiro, que é praticamente um superpoder. Como é que ele resolve achar
que o Superman é responsável pelas mazelas do mundo sem apurar direito com
todas as suas fontes? Cara, a desculpa de que é supostamente a primeira
aparição do Superman não cola. Até porque ele fica dois anos remoendo uma
raivinha de quem perdeu a Mulher-gato para o melhor amigo sem ter apurado
direito os benefícios que o Homem de aço fazia ao planeta.
4- A obsessão patológica dele pelo
Superman, com direito a recortes de jornal na parede também não cola. Afinal,
cuidar de Gotham City dá trabalho. Tem Coringa, Pinguim, Espantalho,
Duas-Caras, Bane, Hera Venenosa... Entre outros. Não dá para fazer clipping do
noticiário da cidade do outro lado da ponte.
5- Jesse Eisenberg, pede para sair.
Esse Lex Luthor misto de "sou descolado, como balinha de ursinho, uso
tênis e trabalho no Google" com "tenho um parafuso a menos e devia
estar no asilo Arkham" não combina com o Lex Luthor. Está caricato, está
boboca e nada tem a ver com Lex Luthor. Deu saudade do Gene Hackman. E acho que
até do Kevin Spacey.
6- Esse negócio de Lois Lane (Amy
Adams) ser uma jornalista tão fodona a ponto de saber sem NENHUMA apuração onde
encontrar o Superman para salvá-lo da morte ou saber tudo o que acontece apenas
com dois pedaços de informação é uma piada.
7- O filme tenta levantar duas
discussões atreladas aos dois heróis principais. Os limites do poder do
Superman e os métodos pouco ortodoxos do Batman em lidar com o crime. Falha em
ambos porque o roteiro é banal e tão profundo quanto piscina de bebê. No caso
do Superman parecia um episódio de "Supergirl".
8 - Excesso de flashbacks sem sentido
(todo mundo sabe como os pais do Bruce Wayne morreram), alucinações
desnecessárias...
9- Zack Snyder tentou repetir uns
truques de "Watchmen" e a coisa ficou tosca. Toda aquela câmera
lenta, todos aqueles olhares perdidos ao infinito. Meu Deus, que triste.
10- E chegamos ao momento ÚNICO E
FREUDIANO. O mais constrangedor de todos! Quando Batman e Superman estão
brigando no recreio da escola como dois coleguinhas que se desentenderam, tudo
fica bem quando o Batman descobre que, além de órfãos, ambos têm uma mãe de
mesmo nome: Martha. Sim, é assim que acontece, com direito a uma sequência de
diálogos dignos de novela mexicana.
Mas nem tudo é um horror no filme.
Destaquemos quatro pontos positivos.
1- A trilha sonora épica. Eu gosto de
trilhas sonoras épicas como se fosse a última guerra do planeta antes do
Apocalipse.
2- Jeremy Irons manteve a dignidade
do Alfred.
3- A participação da Mulher Maravilha
(Gal Gadot) com seus cabelos esvoaçantes padrão Beyoncé, escudo, espada e
chicotinho dourado. Ela bem que tentou salvar o filme, mas naquela altura do
campeonato já tinha saído até o gol do Khedira e a tragédia estava consumada.
4- A luta entre Batman e Superman,
quando o Morcego dá uma bela surra no Homem de Aço, o fazendo até perder o
penteado perfeito cheio de gel. É uma pena que a motivação dela tenha sido
pífia, e o desfecho patético. Aliás, nenhum personagem parece saber o que está
fazendo no filme.
É lamentável que "Batman vs
Superman" seja uma tragédia. No mundo atual, não cabe mais filme ruim de
super-herói. São outros tempos. Mas Zack Snyder resolveu entrar em campo para
levar um 7 a 1 cinematográfico. É com pesar que a corneta dará ao seu filme uma nota 2,5.
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