A professora e o pequeno gênio |
Muitas
definições já foram escritas sobre a arte. Em geral, o fazer artístico
divide-se entre os que advogam por um talento natural as margens de um dom
divino e os que afirmam a necessidade do suor para lapidar o talento. “A
professora do jardim de infância” ("The kindergarten teacher", no original) é uma história de frustração e de uma luta
constante contra o sentimento de vazio e de inoperância por não ser nada daquilo que se
almejava. E o que todo aspirante a arte mais almeja é o reconhecimento de seu
talento e obra.
Lisa
Spinelli (Maggie Gyllenhall) não tem ambos. Seus poemas são medíocres como a
vida que ela acha levar. Ela é uma professora de jardim de infância com uma
família tipicamente burguesa que leva uma vida que, para ela, é sufocantemente simples.
Lisa é muito boa como professora e mãe, mas a frustração do seu olhar a cada
rabisco torto no caderno prova que ela não está satisfeita com a vida que
leva.
As aulas
de um curso noturno de poesia servem para remexer a artista dentro dela e, quem
sabe, despertar de vez a sua veia natural. Quão frustrante é para ela
compreender a constatação de seu professor, Simon (Gael Garcia Bernal), de que
há um abismo entre o artista e o diletante, o apreciador da arte.
Lisa é a
diletante. Artista é o seu jovem aluno, de seis ou sete anos. Jimmy Roy (Parker Sevak)
parece um “Paterson” (2016) antes de se tornar adulto. Tem um talento natural para
fazer poesias com a profundidade que uma criança raramente alcançaria. E quão
incrível é a atuação do jovem Parker, que declama os textos profundos com inocência e olhar infantil.
Jimmy é
um talento raro que Lisa quer lapidar, mostrar ao mundo. O problema é que ela
coloca suas frustrações a serviço de Jimmy, ao invés de fazê-lo desenvolver-se
naturalmente. Assim, canibaliza-o enquanto se perde em mentiras até o
melancólico desfecho dessa professora que não pôde apenas incentivar de forma
correta o seu aluno, pois queria projetar-se sobre ele e ver alguém da sua
órbita ser grande e não medíocre como ela acha que ela e a sua família
são.
Boa parte
da força de “A professora do Jardim de infância” está no trabalho de Maggie. É
uma de suas melhores atuações. Ela transpõe por cada poro do seu corpo a
frustração e o inconformismo de ser Lisa, a mera professora de crianças. O olhar vazio
a cada poema rejeitado e visto como medíocre contrasta com o brilho dos seus
olhos ao contemplar cada poema de Jimmy. A criança é o seu mundo. O problema é
que nada do mundo dela lhe pertence. O que provoca uma espiral de dor e
contrariedade quase insuportáveis para ela.
“A
professora do jardim de infância” é baseado num filme original israelense de
2014. Não tenho base para comparação, mas é possível dizer que o trabalho da
diretora Sara Colangelo é uma agradável e incômoda experiência sobre a frustração de
ser um diletante e nada além disso. Dói. Deve doer mais ainda aos que não
convivem bem com isso.
Cotação da Corneta:
nota 7,5.
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