Se ela dança, eu danço |
Damien Chazelle tem a receita ideal para aqueles que ficam irritados no engarrafamento. Por que não sair dos carros cantando, dançando e fazendo um le parkour básico? Imagine você naquele engarrafamento gostoso indo para Búzios passar o carnaval. Tudo parado. Você vai levar seis horas para chegar naquela casa de praia que alugou para 18 pessoas. Por que não sair do carro e cantar... "Dancing Queen", por exemplo? Ou "Another day of sun", que foi a escolha de Chazelle. Talvez a sua jornada fosse menos estressante.
Pois "La La Land" começa exatamente dessa maneira surreal. Ou seja, logo de cara, você sabe que é um musical. É como se o diretor desse um recado: fique no cinema ou corra que ainda dá tempo de pegar aquele filme iraniano premiado no festival de não sei onde na outra sala.
Aqueles que torcem o nariz para musicais (Nunca vou entender alguém que começa a cantar e dançar enquanto lava os pratos ou bebe um cafezinho) são logo impactados por essa cena. Muito bonita, por sinal. E agora? A gente fica ou vai embora para ver no que vai dar? Bom, logo o filme vai engrenar na história.
E sobre o que é "La La Land"? Sobre sonhos, sobre fazer o que se ama, sobre frustrações, evidentemente, e sobre Hollywood. O filme de Chazelle é uma grande ode à Meca do cinema e à Los Angeles, a cidade que é a capital dessa fábrica de fantasias. "La La Land" é Hollywood homenageando a si mesma e seus filmes dos tempos românticos em que se amarrava cachorro com linguiça. Você pensa que eu não percebi aquela agarradinha no poste estilo "Cantando na chuva", Ryan Gosling? Eu vi!
São muitas citações aqui e ali a clássicos do cinema. Tem "Casablanca" (1942), "Juventude Transviada" (1955), diversos filmes de Fred Astaire e tem até uma citação aos filmes de Jean-Luc Godard (Não me venham dizer que não se falava dele ao comentarem de um filme que seria rodado em Paris e não teria roteiro. Claramente, foi uma alfinetada). E uma amiga até lembrou que rola uma cota pessoal do Chazelle falando de "The Wonders".
Dentro dessa máquina de beleza do mundo encantado de Hollywood, o filme conta a história de amor dos jovens sonhadores Sebastian (Ryan Gosling) e Mia (Emma Watson). Entre idas e vindas da vida, primeiro eles se odeiam, depois eles se aturam, então ela o sacaneia (pedir para tocar "I Ran" na pool party depois de "Take on me" é esculacho), mas aí tem aquele cair de tarde, aquele céu bonito, aquela DANCINHA, aquele SAPATEADO. Rola um clima.
Seria questão de tempo para Sebastian mandar um "How you doing?" para ela. Foi o que ele fez. E chamou logo para um date para não se arrepender. Afinal, não existem muitas mulheres fofas de língua presa por aí.
Tanto Sebastian quanto Mia são dois jovens batalhando por um lugar ao sol e uma sombra na barraca da praia de Hollywood. Seb é um músico que quer ter o próprio clube de jazz, o ritmo que ele define como sendo conflito e diálogo e pelo qual ele é apaixonado. Seu sonho é devolver o seu amado clube aos bons tempos do jazz. Hoje, o local só quer saber de tocar samba, o que o revolta. Super te entendo, Sebastian. Ninguém merece samba.
Já Mia quer ser uma atriz famosa feito as grandes musas do cinema. Tipo Scarlett Johansson. Para isso, ela investe pesado em inúmeros testes de elenco. Mas não é fácil, meus amigos. São muitos tiros na água até acertar um navio na batalha naval da vida.
Por outro lado, o amor está ali, vivo, PULSANTE, atravessando a primavera, o verão, rateando no outono e chegando a mais um inverno. Tem toda essa coisa meio Vivaldi do Chazelle. O amor constrói e ajuda a superar as dificuldades.
Mas e os números musicais? Peraí, que números? A gente mal percebe. Primeiramente, fora.... não, peraí, o que eu ia dizer é que, primeiramente, o grande mérito desde pequeno notável que começa a nascer em Hollywood é a parcimônia. As musicas estão ali a serviço da história (acredite, nem sempre é assim. Veja "Caminhos da floresta", por exemplo). Por isso, "La La Land" tem apenas cinco números. Sendo que dois deles nem usam daquela ideia que eu tinha de musicais em que você sai cantando enquanto compra queijo minas e pão integral no mercado. Poderiam ser realmente momentos da vida em que você canta. Sabe aquele momento na orla, aquele sunset laranja e "City of stars" lhe vem à mente? Mas também poderia ser "Roots bloody roots". O importante é cantar.
É claro que o filme é TODO musicado (é um musical, gente. Mas eu estou sobrevivendo). Mas grande parte da trilha sonora é instrumental. E entra junto da história, ajuda a contá-la e flui maravilhosamente bem. Recurso semelhante foi usado pelo diretor no maravilhoso "Whiplash" (2015). Num musical propriamente dito como neste novo trabalho de Chazelle foi o que no golfe se chama de um hole-in-one. Ou seja, uma tacada perfeita.
Junte tudo isso com as boas canções do filme e temos uma fórmula que o Globo de Ouro considerou imbatível. Tanto que o filme de Chazelle levou sete prêmios. Fará o mesmo no Oscar? Não sei. Mas Hollywood adora falar de si mesma. Ainda mais desse jeito combinando modernidade e nostalgia, usando IPhone e dançando como Ginger Rogers.
"La La Land", portanto, é um filme gostoso de se ver e quase impossível de se implicar. Eu bem que tentei, fui com extrema má vontade, mas seus defeitos o fizeram perder poucos pontos na avaliação final e soaria como picuinha se todos fossem citados nesse textão. E ainda tem um bom desfecho, um desfecho adulto e zero padrão Disney encantada. Assim, o filme de Chazelle ganhará uma nota 8.
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