domingo, 16 de fevereiro de 2025

Capitão América e o sonho da Marvel de construir um admirável futuro novo

Desgaste natural do modelo, problemas na justiça com o ator que era a grande aposta de vilão da nova saga, saída de cena de atores que construíram personagens carismáticos e que conquistaram o público, aposta num modelo de multiverso que se revelou equivocada, uma pandemia… São inúmeros os problemas que fizeram o trem da Marvel Studios descarrilar. Depois de um ano de 2024 em que se pode considerar que a Marvel praticamente fez uma pausa para reorganizar a casa, havia uma expectativa baixa, mas alguma expectativa de que o novo filme do Capitão América seria um recomeço com algum frescor do Universo Cinematográfico do estúdio.

De fato, “Capitão América: Admirável Mundo Novo” (Captain America: Brave New World, no original) tem uma cara de fase 1 da Marvel. Aquela em que os heróis começaram a ser apresentados, lidaram com ameaças locais graves, mas em que também o terreno começava a ser preparado para o grande desafio futuro que viria pela frente. Contudo, há alguns problemas nisso tudo.

O primeiro é que não estamos mais na fase 1 e já se passaram 17 anos desde o primeiro filme do estúdio. Ou seja, o que o filme dirigido pelo até então pouco conhecido Julius Onah tenta fazer, no caso, emular uma subcamada de nostalgia daquele começo de saga em 2008 já não causa o mesmo impacto, pois aquilo não é mais novidade para fãs antigos, fãs de quadrinhos e fãs (se é que houve algum) chegados durante a pandemia. O segundo é que este já é o 35º filme da Marvel. O desgaste é evidente. A falta de criatividade é notória. E a Marvel tem um enorme peso de um longo passado de pontas soltas a resolver. Pelo menos neste filme ela tira um grande elefante da sala, a questão envolvendo o celestial no Oceano Índico do qual pouco se falou desde “Eternos” (2021). E resolve uma ponta que ninguém mais lembrava: por onde andava o Líder (Tim Blake Nelson) desde a sua aparição em “O Incrível Hulk” (2008).

Todavia, o maior problema de “Admirável Mundo Novo” é a falta de coragem de um roteiro e de um filme que passou por diversas refilmagens. O filme pega emprestado o nome de um clássico da literatura escrito por Aldous Huxley e lançado em 1932. No livro “Admirável Mundo Novo”, Huxley descreve uma sociedade distópica sobre a desumanização dos seres humanos em que de um lado existe uma civilização ultraestruturada e refém do progresso científico e do outro um grupo considerado “selvagem”, que simplesmente segue a ordem natural da sociedade antes que a ciência e a tecnologia tomassem conta da organização social.

O enredo tinha tudo para espelhar e refletir não a história de Huxley, mas trazer elementos do livro, mesmo ideias genéricas para debater o novo mundo em que os Estados Unidos são presididos pelo General Ross (Harrison Ford, que assume o personagem em substituição ao falecido William Hurt), a tecnologia é extremamente avançada, temos super-humanos por todos os lados e a humanidade ainda sofre com os efeitos da morte e posterior retorno à vida de metade do planeta.

Nada disso acontece. O admirável mundo novo do título se resume a uma frase de efeito de um programa jornalístico para dizer que agora o planeta não tem apenas o vibranium de Wakanda, mas descobriu que o celestial do Oceano Índico produziu adamantium. Sim, AQUELE adamantium que os fãs de X-Men conhecem muito bem.

Se o roteiro bastante expositivo e desinteressante não reflete nada, resta a história rasa do filme em si. Ela se resume basicamente a um projeto de vingança do Líder que Sam Wilson (Anthony Mackie) tentará resolver para impedir uma crise internacional e a injusta condenação de seu amigo Isaiah Bradley (Carl Lumbly) ao corredor da morte. Mesmo os dilemas de Sam são fugazes. Não há espaço para uma reflexão quando ele mais uma vez coloca em jogo o merecimento de usar o escudo de Steve Rodgers e assumir um manto que parece pesado demais para ele, um homem comum que não tem o soro do supersoldado correndo nas suas veias. Este dilema é mais uma vez resolvido de forma en passant após uma sessão de terapia com o seu colega Bucky Barnes (Sebastian Stan).

Se a trama do filme é pueril, pelo menos tem o mérito de colocar a Marvel com os pés de volta no chão. Saindo de tramas cósmicas e brigas com seres quase celestiais para os graves problemas do dia a dia do planeta.

Algumas cenas de luta do filme também são bem divertidas, mas é pouco. Muito pouco para um filme que almejava ser um recomeço da Marvel. O futuro do Universo ainda está longe de ser admirável. Vamos ver se o Quarteto Fantástico conseguirá resgatar a Marvel da irrelevância.

Nota 6,5/10.

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