A vida é dura no Texas, brother |
A Corneta andava meio
desanimada, MACAMBÚZIA, EMBEZERRADA, com os indicados ao careca dourado de
melhor filme deste ano. Afinal, dos cinco
filmes já vistos, só um, "A chegada", ela considerava realmente
excepcional. Até que o sexto filme riscado da lista veio arrasando quarteirões
e conquistando corações como um refrão de um sertanejo universitário diante das
massas. Precisamos, portanto, falar sobre o quanto "A qualquer custo"
é simplesmente maravilhoso.
Do mesmo roteirista
do ótimo "Sicário" (2015), Taylor Sheridan, "A qualquer custo"
conta a história de dois irmãos que bolam um plano engenhoso para salvar o
rancho da família das dívidas. O objetivo de Toby Howard (Chris Pine, o Capitão
Kirk em versão barba por fazer e olhar perdido) e Tanner Howard (Ben Foster sem
as magias do Medivh, de "Warcraft") é assaltar diferentes agências de
um mesmo banco do Texas para arrecadar o dinheiro necessário para pagar as
dívidas.
Os dois, porém, não
evoluem com tranquilidade como uma escola de samba nota 10 na avenida. Eles são
implacavelmente perseguidos pela dupla de policiais formada por Marcus Hamilton
(Jeff Bridges) e Gil Birmingham (Alberto Parker).
Enquanto a história
se desenvolve, o filme faz uma reflexão sobre a morte de um jeito de viver
típico de pequenas cidades daquele estado americano. O que se vê são
praticamente cidades-fantasma, muito desemprego, estabelecimentos fechados e
ofertas de dinheiro fácil no famoso esquema de agiotagem em um cenário
melancólico filmado por David Mackenzie, diretor que conseguiu traduzir em
imagens toda a angústia e a desoladora realidade local.
"Estamos no
século XXI e eu ainda tenho que correr de incêndios com o gado. É por isso que
meus filhos não farão isso para viver", diz um personagem diante do ranger
Marcus, que sabe que tanto este cowboy quanto outros tantos moradores daquela
região estão por conta própria. O Estado não vai ajudá-los. Ninguém vai
ajudá-los. Isso vale tanto para os criadores de gado, quanto para a população
que resolve seus problemas de forma direta e cada um com a sua própria arma no
coldre. E ali que a cultura americana da arma é ainda mais presente.
Marcus, aliás, é uma
figura deplorável. Ele humilha e esculacha o parceiro meio índio, meio
mexicano, expondo todo o preconceito arraigado naquela região. Um lugar em que
Donald Trump não teria dificuldades para construir o muro que quisesse. O
policial trata o parceiro como inferior, mas também tem um respeito por ele,
que, por vezes, devolve as provocações na mesma moeda, mostrando que não
tolerará qualquer agressão gratuita. Os diálogos entre os dois são brilhantes,
assim como o roteiro do filme, merecidamente indicado ao Oscar.
Marcus está se
aposentando. Birmingham ainda tem um resto de carreira pela frente. A dupla de
policiais é uma metáfora para o que o filme exibe na tela. Os velhos conceitos
estão saindo de cena (ou precisam sair de cena). Os novos estão chegando, e
eles não são necessariamente caucasianos. Mas essa travessia nunca é fácil.
É justamente o
policial índio-mexicano que vai expor a decadência da região num dos embates
com Marcus. É quando ele diz que há 150 anos todas aquelas terras eram dos
ancestrais dele, mas os brancos tiraram tudo, massacraram os indígenas e a
cultura deles. Agora, Birmingham assiste aos brancos perderem tudo o que conquistaram
para os bancos. Os mesmos bancos que Toby e Tanner estão assaltando agora. O
filme, portanto, não deixa de ter uma visão de que uma certa justiça está sendo
feita pelos irmãos assaltantes. Por mais que a lei precise ser cumprida e eles
precisem ser capturados ou mortos.
"A qualquer
custo" é uma espécie de faroeste sobre a crise econômica. É uma reflexão
sobre o fim de um estilo de viver, que está sendo substituído por algo que não
se sabe muito bem o que é, mas vem corroendo empregos e fazendo as pessoas
deixarem suas casas. E tem um Jeff Bridges inspirado e que merecia subverter as
regras e levar o Oscar de ator principal, pois estão faltando concorrentes à
altura dele no quinteto da estatueta de ator. Mas ele está na disputa de ator
coadjuvante e com bons concorrentes. Michael Shannon, de "Animais
Noturnos", por exemplo.
A Corneta se rendeu
ao trabalho da dupla Mackenzie-Sheridan e "A qualquer custo" ganhará
uma nota 9.
Indicações ao careca
dourado: melhor filme, ator coadjuvante (Jeff Bridges), roteiro (Taylor
Sheridan) e edição.
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