sábado, 4 de janeiro de 2025

“Nosferatu”, o sonho realizado de Robert Eggers que, porém, perde para o original de Murnau

Refilmar “Nosferatu” sempre foi um desejo do diretor Robert Eggers. Fã do clássico do Expressionismo alemão lançado em 1922, Eggers se impôs esse desafio após consolidar a sua carreira com uma cinematografia muito baseada em construir filmes como um grau de horror que gravita entre o sobrenatural e o ocultismo. Mesmo seu filme mais controverso, “O Homem do Norte” (2022), explora uma faceta mística em meio a uma trama de vingança que se passa no período viking.

Mas ao impor este desafio, Eggers tem uma pressão extra que não teve nos seus três longas anteriores — além de “O Homem do Norte”, ele também é diretor dos ótimos “O Farol” (2019), talvez o seu melhor filme, e “A Bruxa” (2015). E esta pressão é a comparação com um filme lançado há mais de um século.

Quando filmou o seu “Nosferatu”, F. W. Murnau tinha perante si um cinema ainda muito jovem e que tinha apenas 27 anos desde que os irmãos Lumière projetaram o seu primeiro filme. Naquele tempo, a tecnologia era praticamente nenhuma em comparação com os tempos atuais de Inteligência Artificial. Os filmes eram mudos, em preto e branco e todo e qualquer efeito era prático. As atuações para os tempos de hoje soariam caricatas, mas não podemos esquecer que num tempo de cinema mudo, as expressões exageradas eram fundamentais para darem vivacidade ao que se queria passar.

E é fascinante que mesmo diante destas limitações o filme de Murnau permaneça sendo mais interessante do que a versão de Eggers. Isso diz muito sobre o quão Murnau foi genial ao filmar seu “Nosferatu”, mas também no quanto Eggers de certa forma falhou ao transpor a sua versão para as novas plateias do século XXI.

É claro que o “Nosferatu” de Eggers tem predicados. A começar pela fotografia. Belíssima, glacial, asfixiante e ainda com um jogo de luz e sombras que não deixa de ser uma bonita homenagem ao filme original.

Outro ponto alto de “Nosferatu” é o trabalho de Bill Skarsgard como o Conde Orlok. Ele é tão assustador quanto a versão original de Max Schreck (sempre, evidentemente, guardando as devidas proporções de um intervalo de 103 anos de diferença). E Eggers sabe muito bem jogar com os ângulos de câmera para revelar sempre apenas o necessário, deixando para Skarsgard a tarefa de usar a impostação da sua voz ecoar como o vento frio da morte sobre a fictícia cidade de Wisburg, na Alemanha do século XIX.

Contudo, o “Nosferatu” de Eggers se resume a isso. Ele não tem as sutilezas do filme de Murnau. No original, o mal vai crescendo enquanto o medo está a espreita até se revelar em sua profundidade. Embora, como espectadores, saibamos desde o princípio de que Orlok é um vampiro possuidor de almas, dentro da história a percepção desta evolução demoníaca é aos poucos. Sua alma avança pelas sombras sorrateiramente. Como se a influência de Orlok fosse se espalhando como uma doença até que já fosse quase tarde demais para salvar a cidade do seu domínio. Daí a associação com a peste negra funcionar melhor no original do que neste filme, quando Eggers transforma este elemento num confronto entre fé e ciência.

Esta dualidade, porém, acaba sendo um ponto fraco do filme. Temos os que acreditam, temos os que não acreditam, mas na essência parece haver um consenso de que é preciso seguir o professor Eberhart (Willem Defoe), que parece saber o que está acontecendo e, apenas por ser convincente no seu argumento, confia-se cegamente nele, apesar dos vãos e quase constrangedores esforços de um Friedrich vivido por um Aaron Taylor-Johnson nada convincente.

Conforme o tempo vai passando, o “Nosferatu” de Eggers de certa forma vai minguando e ficando desinteressante. Ele só volta a ganhar realmente um fôlego em seus momentos finais. Ali, no duelo entre Ellen (Lily-Rose Depp) e o vilão, o filme de Eggers ganha na interpretação de Skarsgard um final fascinante que culmina numa imagem que é uma pintura do horror e do sacrifício. Por esta cena, a espera valeu a pena.

Nota 6/10

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