Momoa é um bom Aquaman, mas merecia outro filme |
Marvel x DC é praticamente a versão dos quadrinhos
do Emilinha x Marlene dos rádios no século passado. Claramente, porém, a Marvel
sempre levou muita vantagem neste confronto. Simplesmente porque suas
adaptações são melhores, mais bem feitas e, principalmente, têm roteiros infinitamente
melhores.
É incrível que num momento em que a tecnologia é
tão avançada a ponto de criar cenários incríveis e ótimas cenas embaixo d’água,
talvez o que “Aquaman” tenha de melhor, a DC não consiga alguém decente para
escrever uma história minimamente simples que não evoque problemas freudianos
com pai ou mãe, e situações constrangedoras. Os roteiros são o maior calcanhar
de Aquiles das produções da DC. Se “Batman vs Superman” (2016) tinha aquela cena
constrangedora dos dois heróis resolvendo uma briga só porque descobriram que
tinham o mesmo nome da mãe, em “Aquaman” fomos apresentados ao monstro sozinho
e com depressão. Sozinho e isolado do mundo nas profundezas do mar sem fim,
Karathen aqueceu o coração só porque Arthur (Jason Momoa) conversou com ele.
- Ohh, você conversou comigo. Que lindo. Em mil
anos, nunca ninguém fez isso. Pode levar o tridente para você.
Este é apenas um exemplo de como “Aquaman” é
flopado, embora tivesse grande potencial.
De um modo geral, a estética brega-kitsch
estabelecida por Zack Snyder também cansou. E, sejamos francos, nunca deu muito
certo na série de filmes da DC. Os melhor trabalhos nesse sentido foram
justamente o “300” (2006) e o “Watchmen” (2009), talvez um dos melhores filmes baseados em
quadrinhos.
Juntando isso aos momentos dignos de um cinema que
não se pratica mais - o que foi aquele beijo do Aquaman na princesa Mera
(Amber Heard) no meio da guerra? - sobra muito pouco a elogiar sobre o
filme.
Mas tentemos alguns momentos. Por exemplo, as cenas
embaixo d’água são realmente muito boas e bem feitas. Os efeitos especiais
idem. Todo o combate na Sicília também é um ponto alto. Toda a estética e o
design de Atlântida, uma civilização extremamente avançada em relação à humana,
também ficaram muito bem feitas, embora, por vezes, Atlântida pareça um refugo
de “Avatar” (2009) com pitadas de "Carbono Alterado" (2018).
Por outro lado, é cansativa demais a busca do
Aquaman pelo tal tridente mágico. Era necessário mesmo mostrar em detalhes e
com tempo generoso todos os povos dos sete mares? Se fossem mais comedidos
daria para economizar pelo menos meia hora de filme. E ainda havia a trama
paralela do Arraia Negra (Yahia Abdul-Mateen II), um vilão da superfície que desse um gancho
para um segundo filme.
Por falar em vilões, o rei Orm (Patrick Wilson) é de um
constrangimento que só a DC nos proporciona. Ele tem birra porque tem um
meio-irmão mestiço, quer iniciar uma guerra com a superfície com base num
suposto ataque muito mequetrefe. Além de se tornar o Senhor dos Oceanos, que
ambições têm Orm ao querer iniciar uma guerra com a superfície? Quer ser o
senhor do planeta? Afinal, não dá para acreditar nesse papo de que os homens
estão poluindo planeta e é preciso agir antes que seja tarde. E tudo parte de
uma raiva do meio irmão, a quem ele culpa pela morte da mãe, enfim, tudo muito
mal contado.
Por falar na relação de Atlanna (Nicole Kidman) com
seus filhos, surge outro problema da DC. A falta de cuidado com o que chamamos
de transmídia storytelling. Este é outro momento em que a Marvel anda dando um
banho na rival. Durante o filme, a princesa Mera cita que o
Aquaman precisa reclamar o trono ou o irmão iniciará uma guerra. E lembra da
sua importância ao derrotar o Stepenwolf, dando a entender, portanto, que o
filme se passa após os acontecimentos da “Liga da Justiça”. Até aí tudo bem. O
problema é que em “Aquaman”, Arthur diz que não pisa nunca mais em Atlântida
por causa do que o povo fez com a sua mãe. Só que de pisou lá em “Liga da
Justiça” para falar e lutar contra o Steppenwolf.
Além disso, em “Aquaman”, fica claro o amor e a
devoção de Arthur pela mãe desde sempre. O problema é que em “Liga da Justiça”,
ele fala de Atlanna com rancor, como se tivesse sido abandonado (“Sua rainha me
deixou na porta da casa do meu pai”). Mas em “Aquaman”, é mostrado que ambos
tiveram uma convivência na infância de Arthur e o claro amor entre eles, além
da devoção que perdurou para sempre. Ou seja, o multiverso da DC tem buracos e
contradições. E não é bem amarrado. E isso se evidencia ainda mais pela falta
de planejamento para os próximos passos.
James Wan não entregou o Aquaman em todo o seu
potencial, mas Jason Momoa pareceu-me muito bem no papel principal. Deu a
impressão de ter sido a escolha acertada, apesar do visual macho alfa bombado
ser bem diferente do Aquaman original.
Mas a DC segue devendo uma sequência de grandes
filmes nesta sua nova fase. O único mesmo que merece todos os elogios continua
sendo “Mulher Maravilha” (2009).
Cotação da Corneta: nota 5.
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