Não é fácil ser astronauta |
Muitos filmes já foram feitos sobre a
conquista do espaço. Mas acho que poucos souberem retratar com tamanha acuidade
esse desafio insano rumo ao desconhecido quanto Damien Chazelle em “O primeiro
homem”.
Mais novo trabalho do diretor que
ficou mais conhecido pelo sensacional “Whiplash” (2014) e que venceu o Oscar de
melhor diretor por “La La Land” (2016), “O primeiro homem” é uma cinebiografia.
Supostamente deveria contar a história de Neil Armstrong (vivido por um Ryan
Gosling contido, quase encurralado pelo desafio de ir até a Lua), mas isso é o
pano de fundo de uma história ainda maior que é a o desafio de chegar aonde
nenhum homem jamais estivera até então.
Chazelle trouxe um realismo
impressionante â experiência da corrida espacial. Levou para a tela o incomodo
que é pilotar um foguete. A incerteza daquelas máquinas em plenos anos 60,
pouco mais de seis décadas depois que o homem aprendeu a voar. Levou o medo,
fez questão de esfregar nas nossas caras o quão insano e desafiador era até
então ser um astronauta. E talvez seja até hoje.
E ele expõe isso nas cenas nauseantes
das máquinas balançando horrores. No isolamento e na solidão de se estar em
órbita. Na tensão e na incerteza da volta. Na dificuldade de acertar cálculos
tão difíceis para um humano normal compreender. Um erro é nada menos do que
fatal. Tudo para chegar naquele momento em que se dá um “pequeno passo para um
homem, mas um grande salto para a humanidade”.
No seu filme, a Lua está sempre à
espreita. Ali, do alto, sendo observada, estudada, admirada, contemplada. E
desafiando aqueles aventureiros modernos. A cada fracasso ela parece mais
distante. A cada pequeno triunfo, ela surge mais perto. Alguns enquadramentos
também ressaltam a dupla face do satélite natural da Terra. O lado escuro e
claro na face de um Neil Armstrong preocupado com o futuro, no rosto do seu
filho quando pergunta se ele pode não voltar. A Lua talvez tenha sido (e talvez
continue sendo) um desafio tão grande quanto o das caravelas rumo ao
desconhecido nos séculos XV e XVI.
Para enfatizar tudo isso, Chazelle
reduz a trilha sonora ao mínimo possível. Se “Whiplash” era um filme todo
pontuado pela trilha, e “La La Land” era um musical de canções marcantes, “O
primeiro homem” exalta o silêncio solitário da viagem para além da Terra
pontuado apenas por canções épicas compostas por Justin Hurwitz – o mesmo de “Whiplash”
e “La La Land” - para dramatizar os momentos mais marcantes. Em especial a
partida da Apolo 11 de Houston e o pouso na Lua.
“O primeiro homem” é um filme belo. Não
é muito verborrágico e por vezes tem diálogos erráticos. Algo bem diferente dos
trabalhos anteriores do roteirista Josh Singer, vencedor do Oscar por “Spotligh”
(2015) e que também escreveu “The Post” (2017). A cena final de Neil Armstrong
reencontrando a mulher (a ótima Claire Foy, a rainha Elizabeth nas duas
primeiras temporadas de “The Crown”) é de uma beleza singular. Nada é dito
naqueles minutos finais. É como se o silêncio do espaço e as incertezas permanecessem
até a volta à Terra. Mas ao mesmo tempo muita coisa é dita naquela troca de
olhares e pequenos gestos através do vidro. Cenas como essa valem demais o
filme.
Cotação da Corneta: nota 8,5.
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