Que bigode, amigos! |
Os números sempre foram sedutores. No cinema do século
XXI, então, eles são moeda de troca natural numa sociedade que só vê o lucro. O
sucesso de fórmulas leva a repetições incansáveis. E é essa a sensação que
causa ao assistir à nova versão do clássico filme “Assassinato no Expresso do
Oriente”.
Ao contrário da versão de 1974, o filme atual dirigido e estrelado
por Kenneth Branagh transformou-se numa obra digna dos filmes da Marvel, onde
piadinhas e traquejos caminham lado a lado com a história. Sua versão do famoso
detetive Hercule Poirot, criado pela escritora Agatha Christie, parece um
super-herói com superpoderes de dedução e uma imensa capacidade intelectual,
muito acima da média, como se fosse um humano que atingisse um estágio de
singularidade. Além de um peculiar charme com sotaque belga e a esquisitices de
um bigode moldado e irretocável. Afinal, todo super-herói tem características
únicas.
Isso traz consequências. Para o bem e para o mal.
“Assassinato no Expresso do Oriente” é um filme agradável de se ver até certo
ponto. Tem uma irresistível história do gênero “quem matou fulano?”, com uma dúzia
de suspeitos e um detetive a investigar o caso enquanto você se pergunta quem é
o assassino. Não deixa de ser uma diversão descompromissada para uma tarde sem
grandes anseios.
Por outro lado, a narrativa tem aquele cheiro de “eu já
vi isso dezenas de vezes”. Se até os filmes da Marvel estão cansando, que dirá
as cópias que não fazem parte do seu universo cinematográfico.
Além disso, o Poirot de Branagh guarda enorme semelhança
com o Sherlock Holmes vivido por Benedict Cumberbatch na série da BBC. Tem uma
certa arrogância, uma inteligência fora do normal, os superpoderes de dedução,
manias únicas e até a paixão por uma mulher misteriosa/talvez impossível... A
diferença está apenas no charme que Cumberbatch impõe a Holmes. Branagh prefere
dar um tom caricatural ao seu Poirot.
Diretor mais conhecido por suas adaptações de
Shakespeare, cujo tom clássico acabou virando uma assinatura própria, Branagh
acabou por ter o mérito de sair da sua zona de conforto para construir uma
história agridoce para as massas. Há méritos em assumir riscos. E nele, o
diretor inglês colhe frutos e maçãs podres no processo. Mas o resultado final é
aceitável.
Fica no ar, porém, que Branagh está apenas começando.
Estaria inaugurando uma franquia. O final do filme dá a entender que Poirot ainda voltará em mais
alguns filmes. O Expresso do Oriente é apenas o ponto de partida para novas
aventuras.
Cotação da Corneta: nota 6,5.
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