Samuel L. Jackson mostra quem manda |
Quentin Tarantino é uma espécie de Garrincha
do cinema. Todo mundo sabe o que ele vai fazer, mas ninguém deixa de ver os
seus filmes. Como os nossos avós não deixavam de ir ao Maracanã para ver o
ex-atacante do Botafogo usar o mesmo drible contra os zagueiros pelos
gramados.
Tarantino tem oito filmes na vida.
Todos falam sobre um único tema: vingança. Nada mais humano. Atire a primeira
pedra quem nunca se vingou. Ou desejou se vingar sobre algo.
Outra característica dos seus filmes
são as mortes violentas. Cabeças estourando, sangue jorrando para todos os
lados. As empresas de sangue artificial (deve ter uma coisa assim) devem
esfregar as mãos quando Tarantino anuncia que vai fazer um filme.
Para vocês terem uma ideia de quanto
sangue já foi usado, em oito filmes Tarantino já matou 378 pessoas. Dá uma
média de 47,25 por filme. Em "Os oito odiados", 15 vão pra vala.
Quinze vão descobrir se Deus existe.
Bem, "Os oito odiados" tem
tudo isso que a gente ama em Tarantino. E quatro anos depois de "Django
Livre" (2012), o diretor americano resolveu mais uma vez falar sobre o
racismo e a xenofobia na América. A carta de Abraham Lincoln, aliás, é tão
atual para tantos lugares.
Entre um "nigger" e outro.
Entre uma fala contra os mexicanos e outro, Tarantino expõe todas as vísceras
possíveis do discurso do preconceito. E o melhor é que o seu texto não faz
concessões. O filme fala do jeito que o povo (preconceituoso e xenófobo) fala,
com aquele ódio e a violência verbal que já vimos algumas vezes na vida real.
Parece que é para chocar de propósito. Sob a cortina histórica do recente fim
da guerra civil americana, período em que se passa o filme, o diretor quer
mostrar que o comportamento não mudou muito em 200 anos.
Tarantino não tem papas na língua.
Usa o gênero mais americano de todos, o western, para tocar na ferida com ferro
quente e girar o bastão com crueldade. Ele já tinha feito algo semelhante em
"Django Livre".
Em quase três horas de filme separado
em cinco capítulos, quase um Lars von Trier pop, Tarantino expõe a beleza das
paisagens geladas de Wyoming (o filme é lindo demais, assim como a trilha sonora
de Ennio Morricone), e conta a história de oito caras que vão ter que se aturar
na taverna de Minnie até uma nevasca passar.
Ali tem dois caçadores de recompensa
(Kurt Russell e Samuel L. Jackson, um habitué dos filmes do diretor e que está
maravilhoso no papel do major Marquis Warren), um futuro xerife de Red Rock
(Walton Goggins), um velho general sulista (Bruce Dern), um inglês (Tom Roth),
um mexicano (Demián Bichir), um cowboy (Michael Masen), e uma prisioneira que John
Ruth, personagem de Russell quer mandar para a forca em troca de dez mil
dólares (Jennifer Jason Leigh, merecidamente indicada ao Oscar).
Como numa peça de teatro filmada,
eles discutem, entram em conflito e falam sobre o passado enquanto degustam o famoso
guisado da Minnie.
É um belo filme. É um filme maduro.
Não o melhor do diretor americano, mas digno de sua filmografia. Por falar
nisso, e como essa corneta está muito séria, vamos fazer o ranking Tarantino
para tentar gerar uma polêmica.
1. Bastardos Inglórios
2. Pulp fiction
3. Cães de aluguel
4. Os oito odiados
5. Django Livre
6. Kill Bill volumes 1 e 2 (pra mim é
um filme só)
7. Jackie Brown
Os três primeiros dessa lista são o
que fazem de Tarantino um cara genial. Os demais até Kill Bill mostram que ele
é um cara foda. Jackie Brown é um erro que o torna humano. Tipo o que
"Obladi Obladá" representa para os Beatles.
Enfim, sem ódio e só com amor no
coração, a corneta dará para “Os oito odiados” uma nota 7,5.
Indicações ao careca
dourado: Atriz coadjuvante (Jennifer Jason Leigh), fotografia e trilha sonora
original.
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