Viola mostra que faz o que deve ser feito |
Steve McQueen
ainda tem poucos filmes na carreira, mas está entre os diretores que fazem
alguns dos trabalhos mais interessantes destes tempos. Seus dois filmes
anteriores, “12 anos de escravidão” (2013) e “Shame” (2011) são dois ótimos trabalhos.
O primeiro conta a história de um homem livre que morava em Nova York, mas é
sequestrado, levado para o sul, onde torna-se escravo e leva 12 anos para ser
libertado. O segundo conta a história de um homem que não cultiva qualquer tipo
de relacionamento e apenas alimenta seu vício desvairado por sexo, o que o faz
mergulhar nas profundezas em busca de cada vez mais prazer.
Em “Viúvas”, o
diretor troca o protagonismo masculino pelo feminino. O filme, porém, não é o
melhor que McQueen, vencedor de um Oscar em 2014 por “12 anos de escravidão”, já
produziu. Mas ainda assim é um McQueen que tenta inverter o tradicional
protagonismo masculino dos “filmes de assalto” para as mulheres. E transforma
o que seria um golpe numa tragédia que marca todos os envolvidos. Em especial
sua protagonista, Verônica, vivida por Viola Davis, talvez a figura mais
marcante do filme.
Na trama de
McQueen, as mulheres são fortes, lidam com as dores da perda dos seus maridos
assaltantes enquanto se equilibram para cuidar do que restou, dos filhos ou
refazerem as suas vidas da melhor forma possível. Os homens, por outro lado,
são o retrato da decadência do patriarcado masculino.
Harry Rawlings
(Liam Neeson) não passa de um covarde que falha no seu suposto plano perfeito e
sofre as consequências dos seus atos. Tom Mulligan (Robert Duvall) é o retrato
do decadente homem racista senhor de engenho ex-dono de fazendas de escravos
americano, cuja família tradicional tem um naco de poder há três gerações em um
lado decadente de Chicago e deseja manter o poder como sempre foi, ou seja, passando
de pai para filho. Duvall aparece em poucas cenas, mas suas entradas são
brilhantes e vivazes em expor até mesmo na natural decadência física do ator de
87 anos o quanto seu personagem representa o passado decrépito que precisa ser
superado.
É onde entra o seu
filho, a nova geração que tenta impedir que o comando do 18º distrito passe
pela primeira vez para um afro-americano. Jack Mullingan (Colin Farrell), é o
velho pensamento apenas envernizado para as novas gerações. Ele pode achar o
comportamento do pai odioso, mas embrenha-se nas teias de corrupção da política
como qualquer homem branco que se envolve nos podres daquela região. É
pragmático em analisar cenários e joga para ganhar, custe o que custar.
Ele concorre ao
cargo político com Jamal Manning (Bryan Tyrree Henry), um notório bandido e
traficante da região que tenta se esgueirar na política cujo irmão, Jatemme
Manning, brilhantemente interpretado por Daniel Kaluuya, é um psicopata que
toca os negócios da família com uma mão de ferro e crueldade própria dos assassinos
feios.
Em meio a eles há
o trio formado por Veronica, Alice (Elizabeth Debicki) e Linda (Michelle
Rodriguez). Elas são as três viúvas do título e protagonistas dessa história
que precisam dar o golpe final traçado por Harry para conseguir US$ 5 milhões
que garantiriam a Veronica o pagamento de US$ 2 milhões que o marido devia a Jamal
e ainda uma boa grana para elas recomeçarem as suas vidas.
Traçando o perfil
dos personagens e combinando com o cenário decadente, escuro e o clima pesado armado
por McQueen, “Viúvas” tinha tudo para ser um grande filme. E de fato tem seus
bons momentos. Mas a história tem alguns buracos que complicam a sua
compreensão. Não fica clara a questão do dinheiro roubado no início e para que
ele serviria aos propósitos que são revelados no decorrer do filme. Também não
está bem esclarecido o que levou Harry a tomar algumas atitudes no decorrer da
história.
Além disso, a cena
do cachorro que sente o cheiro é tão, mas tão clichê, que nem parece um filme
do cinema que McQueen tem por hábito realizar. São mais a sua cara e o estilo
dele as boas cenas iniciais que contrastavam o assalto, o último assalto
realizado pelo grupo de Harry com as vidas caseiras, problemáticas, terríveis
ou não, que eles tinham com suas esposas.
O saldo final,
porém, é o de um filme que não supera “12 anos de escravidão” e “Shame”, mas
ainda assim é uma história interessante para quem curte o cinema do diretor.
Cotação
da Corneta: nota 7.
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