Torcida do Rangers: 'Nosso clube nunca morrerá'/Reprodução |
Há dois anos o Glasgow Rangers
não subiu, mas caiu no "tapetão". Dono de mais títulos nacionais do que qualquer
clube grande brasileiro - e estaduais também, antes que alguém venha com
piadinha desmerecendo a Escócia e o seu campeonato – com 54 conquistas, o time
terminou a temporada 2011-12 com vice-campeonato escocês, mas não tinha o que
comemorar.
Não porque tinha perdido mais um
título para o grande rival Celtic com 20 pontos de diferença, mas porque estava
falido, quebrado, tinha perdido tudo por causa de uma administração desastrosa
que não pagou os impostos que devia. O Glasgow Rangers estava acabado e
um novo clube precisava ser criado. Nascia o Rangers FC.
Era o velho Rangers, com a mesma
torcida fanática que lotava o Ibrox Stadium e nutria um ódio pelo Celtic maior
do que qualquer Barcelona x Real Madrid ou Manchester United x Liverpool,
garantem os seus torcedores, mas com uma nova roupagem. Na letra fria da lei
era um novo clube, com novo nome e outra administração tentando limpar tudo o
que de deplorável foi feito pelos antigos donos do velho clube.
E como tal, não poderia
permanecer na elite. Assim, em julho do ano passado os demais clubes
escoceses se reuniram na sede da Liga Escocesa de Futebol (SFL, na sigla em
inglês) para decidir para onde o Rangers iria. Seus dirigentes tinham a expectativa de que o time conseguisse uma vaga na segunda divisão. Na pior das
hipóteses, a mais sombria de todas, seria condenado a jogar a quarta divisão, a
última do país. Os diretores argumentavam que isso poderia ser uma tragédia
financeira não apenas para o clube, mas para o futebol escocês, que vive basicamente da rivalidade Rangers x Celtic.
Acabei de ver um pequeno documentário
da ESPN Brasil sobre o calvário do Rangers. E um detalhe me chamou a atenção. Antes
da votação decisiva sobre o futuro do clube, torcedores do Rangers pediram ao
presidente David Somers para fazer uma votação sobre o que desejavam
para o time. Um dia antes da reunião decisiva na SFL, a maioria esmagadora,
80% dos detentores dos carnês de ingressos para a temporada, votaram para que o clube fosse para a quarta divisão.
Foi quando um torcedor apareceu na
reportagem dizendo que não queria que o Rangers fosse ajudado por ninguém e que
a história do clube fosse limpa.
Naquele mesmo instante comecei a
refletir sobre as cenas patéticas de torcedores do Fluminense comemorando o não rebaixamento do clube na porta do Superior Tribunal de Justiça Desportiva
(STJD), no Rio. Celebrando uma volta pela janela usando o argumento de que a
lei devia ser cumprida.
Ora, a lei deve sempre ser
cumprida, mas também interpretada. E é para isso que existe um julgamento.
Fazer um clube perder quatro pontos e ser rebaixado por causa da escalação
irregular de um jogador em 13 minutos de uma partida que, mesmo que o time tivesse
perdido, estaria garantido na elite do Campeonato Brasileiro, é um pouco demais.
A Portuguesa errou sim e por isso merecia ser punida. Mas jamais rebaixada. Porque
no campo não mereceu isso e nem o Héverton, o tal atleta irregular, foi
decisivo no jogo contra o Grêmio, na última rodada.
Havia uma série de punições a
serem aplicadas que não mudariam o que aconteceu no campeonato dentro do campo.
Uma delas é a que me parecia a mais correta. É baseada na lei da Fifa que dá
uma brecha para que o clube pague a pena no campeonato seguinte. Assim, a
Portuguesa seria punida e começaria o próximo Brasileiro com quatro pontos a
menos. É uma punição semelhante às que acontecem na Itália. Dura, exemplar, que prejudicaria o desempenho do time no
campeonato (poderia condenar ao rebaixamento ou acarretar em perda de vaga na Copa
Libertadores), mas manteria o resultado do campo em 2013. Contudo optou-se por
mudar drasticamente o resultado do torneio. E o imbróglio agora está só no
início.
Mas o que me incomoda mais não é a decisão do tribunal, a troca de acusações, as insinuações de que o Fluminense é sempre
beneficiado pelo tapetão, as teorias da conspiração, as bobagens de “pagar a
Série B” ou as “trocas de gentilezas” (algumas excessivamente raivosas) entre torcedores que só têm olhos para o
seu clube e para o que é bom para o seu clube e nada mais. O que me incomoda
mesmo é ver uma parte da torcida do Fluminense (e eu espero que seja pequena)
comemorando a vitória no tribunal e a manutenção do clube em um lugar que não é
dele de direito. É a personificação da ética maleável brasileira e uma imagem
mais forte do que qualquer estouro de champagne de dirigente. O pior é que tenho
a certeza que se a mesma coisa tivesse acontecido com qualquer outro clube
grande do país, estas cenas lamentáveis teriam se repetido.
Por isso que torcida por torcida
eu hoje prefiro a do Rangers. No encontro da SFL, 25 dos 30 clubes que votaram jogaram o Rangers para a quarta divisão, onde o time estreou dias depois. Cogitou-se
uma reestruturação do futebol escocês para a temporada seguinte, quase uma virada
de mesa no estilo Copa João Havelange. A torcida mais uma vez disse não.
O Rangers venceu a quarta divisão com a torcida
ocupando quase que 100% dos 49 mil lugares do Ibrox Stadium em todo jogo. Hoje
lidera a terceira divisão com folga, com 13 pontos de vantagem sobre o Dunfermline
Athletic. Seguramente estará na segunda divisão na próxima temporada. E em
pouco tempo, o “Old Firm”, como é conhecido o velho clássico Rangers x Celtic,
voltará a ser realizado na Escócia.
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