domingo, 28 de dezembro de 2025

Os melhores álbuns de 2025

Com 2025 chegando ao fim, é hora de fazer a lista dos melhores álbuns do ano. Eis o meu top-20:

1 — Daron Malakian nd Scars on Broadway — “Addicted to the Violence” — Se tem algum fã de System of a Down com saudade de um material inédito da banda, talvez uma boa opção seja ouvir a discografia solo de Daron Malakian. O terceiro álbum do músico em muitos momentos lembra um disco do System of a Down, mas sem os vocais marcantes de Serj Tankian. Por outro lado, é um álbum que apresenta uma estrutura eclética, boas melodias e temas políticos que o fizeram ficar no topo da minha lista. (Mais sobre o disco na crítica que fiz para o site Rock on Board)

2 — Ghost — “Skeletá” — “Skeletá” pode até não ser o melhor álbum do Ghost, mas é inegável que a banda liderada por Tobias Forge, ou atualmente Papa V Perpetua, fez um dos grandes álbuns de 2025. Muito influenciado pelo rock dos anos 1980, reafirma as virtudes da banda sueca, que também proporcionou uma experiência em seus concertos que foi interessante e perdida pelos tempos modernos, em que os celulares foram proibidos. “Skeletá” é rock, é pop, é teatro, é espetáculo e merece todos os elogios. (Mais sobre o disco na crítica que fiz para o site Rock on Board)

3 — The Amazons — “21st Century Fiction” — Eu não conhecia muito bem esta banda britânica até ouvir “21st Century Fiction”. O álbum foi um arrebatamento instantâneo. Por vezes, o The Amazons me lembrou um pouco bandas como Royal Blood e Muse, mas ficar preso a isto seria limitar demais o som do grupo de Reading formado por Matt Thomson (vocais), Chris Alderton (guitarra) e Elliot Briggs (baixo), que fez um dos grandes álbuns de rock do ano.

4 — Suede — “Antidepressants” — Nunca prestei muita atenção no Suede, mas “Antidepressants” definitivamente fez com que eu achasse que devia dar uma olhada com mais atenção na banda. Décimo álbum de estúdio do grupo de Londres, o disco tem uma pegada meio soturna, gótica, explorando temas com paranoia, morte e a desconexão com a modernidade. Ao mesmo tempo e paradoxalmente há críticos que o veem como uma afirmação da vida. Eu gostei bastante do que ouvi e agora pretendo dar mais atenção ao resto da discografia do grupo.

5 — The Hives — “The Hives Forever Forever The Hives” — Sétimo trabalho de estúdio da banda sueca, este disco representa o The Hives fincando os dois pés no rock de arena, o que eles mostraram saber fazer muito bem para quem teve a oportunidade de assistir aos shows da turnê deste disco. “The Hives Forever Forever The Hives” é divertido, bem feito e levantaria qualquer um de um estado de tristeza.

6 — Lady Gaga — “Mayhem” — Que belezura de álbum. Aquele disco pop raiz que me fez transportar para uma música pop feita um pouco nos anos 1980 e 1990. Muita gente exalta “Abracadabra”, mas esta está longe de ser a melhor canção de um álbum que tem canções como “Vanish into you”, “Disease” e “Perfect Celebrity”.

7 — El Cuarteto de Nos — “Puertas” — Essa banda uruguaia tem mais de 40 anos de estrada e até então eu nunca tinha escutado nenhum trabalho dela. “Puertas” caiu no meu colo em meio a vários discos ao longo deste ano e gostei imediatamente. Agora preciso me aprofundar mais e ouvir os outros trabalhos do grupo.

8 — We Are Scientists — “Qialifying Mile” — Um álbum bem robusto musicalmente. Acho muito interessante a consistência, arranjos e escopo lírico que a banda da Califórnia criou neste que é o seu nono álbum de estúdio.

9 — Wolf Alice — “The Clearing” — Há discos que não nos ganham na primeira vez que ouvimos. “The Clearing” foi um pouco assim. Na primeira vez que ouvi o quarto álbum de estúdio desta banda britânica, eu achei legal, mas nada de especial. Foi então que resolvi ouvir de novo e a magia aconteceu, me fazendo perceber a riqueza e uma série de nuances deste disco que tem uma pegada um tanto quanto setentista.

10 — The Hellacopters — “Overdrive” — O Hellacopters é a terceira banda sueca a entrar nesta lista, mostrando que há toda uma cena roqueira interessante acontecendo por lá. “Overdrive” é um classic rock feijão com arroz bem feito e saboroso.

11 — Franz Ferdinand — “The Human Fear” — Não tenho visto o Franz Ferdinand figurar em muitas listas neste ano. Em parte acho que é porque “The Human Fear” não está entre os melhores trabalhos da banda. Em parte eu acho que é porque “The Human Fear” saiu no dia 10 de janeiro. Mas este é um outro disco que cresce muito conforme ouvimos cada vez mais. Acho um álbum gostoso demais de ouvir, meio como entrar numa festa nostálgica na night escocesa.

12 — Halestorm — “Everest” — Sempre gostei do hard rock da banda liderada por Lzzy Hale e acho que “Everest” tem algumas de suas melhores canções. Destaque para “Shiver”, que é uma das minhas músicas favoritas do disco.

13 — Bush — “I Beat Loneliness” — “I Beat Loneliness” é um pouco uma tentativa do Bush em retomar uma sonoridade que mostrava no início, mas também uma tentativa de dar uma nova guinada para o futuro. Como olhar para o passado buscando inspiração para se adaptar e seguir em frente. Eu gostei do álbum e foi mais um que cresceu para mim na segunda vez que ouvi. (Mais sobre o disco na crítica que fiz para o site Rock on Board)

14 — The Darkness — “Dreams on Toast” — O que eu mais gosto deste álbum do The Darkness é sua versatilidade. O disco tem rock, country, baladas e ainda termina com uma canção digna de um musical.

15 — Robert Plant with Suzi Dian — “Saving Grace” — Robert Plant vive muito bem e em paz com seu passado. O Led Zeppelin não é uma sombra pesada, mas algo do que ele se orgulha e não tem nenhum problema em falar sobre, visto o documentário “Becoming Led Zeppelin”, mas ao mesmo tempo é um assunto superado. Desde então, o cantor fez diversos álbuns muito interessantes e ricos musicalmente como “Band of Joy” (2010) e “Lullaby and the Ceaseless Roar” (2014). “Saving Grace”, lançado em parceria com a cantora Suzi Dian, é tão bom que me fez quebrar a regra de que esta lista só pode ser de álbuns com material original. Aqui, Plant faz uma releitura de materiais de artistas como Memphis Minnie, Moby Grape, e Blind Willie Johnson. É um álbum muito bom de um artista em paz com o passado e de bem com o presente.

16 — Buddy Guy — “Ain´t Done with the Blues” — Buddy Guy tem 89 anos, mas como o próprio nome do seu álbum indica, está longe de ter acabado com o blues. Ele fez um excelente disco que conta ainda com parcerias com Joe Bonamassa e Peter Frampton e que foi indicado ao Grammy na categoria de Melhor Álbum de Blues Tradicional. O resultado só conheceremos em fevereiro de 2026.

17 — Florence and the Machine — “Everybody Scream” — Não sou exatamente um fã de Florence and the Machine, mas “Everybody Scream” é um álbum bem interessante musicalmente e que mereceu um lugar no top-20.

18 — The Lathums — “Matter does not define” — Terceiro álbum desta banda britânica. É daqueles discos meio indie muito legal de ouvir que muitas bandas da Inglaterra fazem. Tem um que de Smiths, um que de Arctic Monkeys. Bem interessante.

19 — Coheed and Cambria — “Vaxis — Act III: The Father of Make Believe” — Quando ouvi o álbum pela primeira vez, estava pronto para colocá-lo no top-5. A segunda escutada o fez perder um pouco da força, mas ainda assim continuei gostando de ouvir este Coheed and Cambria que me pareceu um pouco diferente da imagem que eu tinha do grupo.

20 — Neil Young and the Chrome Hearts — “Talkin to the Trees” — O Neil Young que conhecemos e amamos. Aquele garage rock com pegada blueseira e canções de protesto necessárias neste tempo sombrio em que vivemos.

Amanhã eu volto com as melhores séries de 2025.

“Valor Sentimental”: investigação do trauma e reconciliação pela arte

Reinsve está maravilhosa no papel
(Atenção: Esta crítica contém spoilers do filme)

Há filmes que a gente consegue saber desde o início que estarmos diante de algo diferente. Eu tive está sensação nos primeiros minutos de “Valor Sentimental” (Affeksjonsverdi, no original), o novo filme do diretor dinamarquês Joachim Trier, o mesmo do excelente “A pior pessoa do mundo” (2021).

Nestes primeiros minutos, Trier usa a casa que pertenceu a diferentes gerações da mesma família como uma metáfora para uma exploração da intimidade desta família, revelando memórias, fraturas e conflitos não resolvidos.

Os primeiros minutos retratam a casa tendo como texto de fundo uma redação em que a jovem Nora Borg escreveu para a escola usando a casa como a protagonista. Eles dão o início de uma jornada de investigação de traumas e reconciliação pela arte.

Pulando para o presente, o cineasta Gustav Borg (Stellan Skarsgard numa atuação absolutamente fenomenal), aparece no funeral do sua ex-mulher e se vê diante de suas duas filhas, Nora (Renate Reinsve, ainda mais impactante e cheia de nuances do que no filme anterior de Trier) e Agnes (Inge Ibsdotter Lilleaas, que eu não conhecia, mas cujo trabalho magistral não fica nem um pouco atrás dos dois protagonistas). Logo de cara, percebe-se que há uma relação com arestas que precisam ser aparadas ali.

Borg representa o clichê do cineasta livre, que viveu para o cinema, negligenciando o tempo para cuidar das filhas. Nora é uma atriz de teatro de sucesso que frequentemente tem ataques de pânico e parece ter dentro de si uma tristeza e assuntos não resolvidos. Agnes é uma historiadora que não quis seguir a carreira artística, embora tenha sido a estrela mirim de um dos filmes de sucesso de Borg. As duas se ressentem da falta do pai, são magoadas pela sua ausência que vem de muito antes de sua separação da mãe.

Borg, no entanto, parece querer tentar uma reaproximação com a família. E o caminho que ele usa é o que ele mais conhece e se sente à vontade. Depois de 15 anos sem filmar, o diretor tem um roteiro novo e quer oferecer à filha. O roteiro é perfeito para ela, ele diz. Ela, no entanto, se recusa a filmá-lo numa cena em que Skarsgaard e Reinsve duelam com expressões cheias de sutilezas e extremamente ricas pelo que não é dito. Nora diz não conseguir trabalhar com Borg porque sequer consegue dialogar com ele. Fica claro desde o início que eles têm algo que os afasta.

Borg, entretanto, precisa fazer este filme. Ele é parte do seu processo de investigação do motivo do suicídio de sua mãe quando ele tinha apenas sete anos.

É quando entra em cena a famosa atriz americana Rachel Kemp (Elle Fanning, brilhante). Ela tem o dinheiro, os recursos e o nome para atrair a atenção de grandes produtoras como a Netflix. Estes momentos que envolvem a participação de Borg em um festival de cinema e a produção para a Netflix são o máximo de alívio cômico que “Valor Sentimental” nos entregará.

Kemp se esforça muito para fazer o filme, mas por mais excelente que seja como atriz, e há algumas cenas realmente maravilhosas de Fanning neste processo, ela sente que há algo de errado. Que não devia estar ali. Embora não exponha isso para além de sutis comentários e olhares, Borg também sente que algo não está certo. Mas entre o filme possível e o não filme, ele mantém os ensaios e a produção de pé.

Paralelamente, Agnes começa a investigar o passado da avó. Sua prisão e tortura por nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Ali temos vislumbres do que a mãe de Borg viveu. Vislumbres para tentarmos conectar com sua investigação pela arte.

É curioso que Trier coloque no centro desta história um diretor, uma atriz e uma historiadora. De um lado, Borg quer fazer o filme para tentar compreender as razões do suicídio da mãe. Mas o roteiro, como ele sempre deixa claro, não é (somente) sobre ela, mas também sobre a filha, Nora, que já mais para o fim do filme, descobrimos que também tentou tirar a vida em algum momento no passado.

Do outro, temos a historiadora, a acadêmica buscando dados e fatos do passado para compreender não apenas o passado, mas também o presente.

As duas camadas são importantes para nos darem pistas para construir o quebra-cabeças daquela família com relações fraturadas pelo tempo, pelo afastamento, por escolhas equivocadas, pela falta de diálogo.

Trier construiu em “Valor Sentimental” um filme monumental. É um trabalho sobre memória e o poder reconciliador da arte que conta com atuações soberbas dos seus principais atores. Se eu só pudesse escolher um filme para levar de 2025, definitivamente seria este.

Nota 10/10.