Tá meio vazio aqui, né |
Retomar histórias de sucesso do passado ou que tornaram-se cult são
sempre um desafio. Mas se a arte contemporânea caracteriza-se muito pela
reciclagem, o pastiche, o meme e as citações, o cinema não iria atuar na
contramão dessa história. Por isso, as salas vêm sendo enxurradas de franquias
de dinheiro fácil ou histórias que apelem para uma memória afetiva do
espectador. O recente filme do “Pica-Pau” é uma clara estratégia de reciclar o
personagem querido dos desenhos animados num filme que combina animação com
atores de carne e osso. “Blade Runner 2049” é a aposta do momento.
Dirigido por Ridley Scott, o filme de 1982, contava a história do
policial Rick Deckard (Harrison Ford), um caçador de replicantes que haviam
escapado da fábrica Tyrell e precisavam ser eliminados. Neste futuro distópico
imaginado pelo conto do escritor Phillip K. Dick, eram discutidos temas como a
humanidade e o direito das máquinas de viverem como se humanos fossem, já que
elas haviam evoluído de tal forma a terem sentimentos, ou a emularem sentimentos. Enquanto os replicantes
viviam à margem da sociedade, Deckard encontrava-se num dilema ao ver-se
apaixonado por Rachel (Sean Young), uma evolução criada pela Tyrell. Uma
máquina quase humana.
“Blade Runner” passava-se no início do século XXI e a sociedade que vivemos
é bastante diferente da versão futurista retratada por Scott. A nova versão dá
um salto de 40 anos na história e imagina uma sociedade ainda mais isolada,
vazia e pessimista. As novas versões dos Nexos são ainda mais realistas e os
próprios Blade Runners são versões criadas e não seres humanos nascidos para
caçarem as máquinas.
No mundo imaginado pelo diretor canadense Denis Villeneuve, os lugares
são monocromáticos, a sensação de vazio é enorme e um isolamento depressivo
grita na tela ao mesmo tempo em que os cenários são magníficos. É nele que vive
K (Ryan Gosling), um Blade Runner que recebe uma missão de matar uma série de
replicantes antes que a existência deles seja exposta para a sociedade.
Mas se a tenente Joshi (Robin Wright) quer encobrir o segredo da
existência de uma replicante grávida, Niander Wallace (Jared Leto, que vai se
notabilizando por personagens esquisitos tal qual um neo-Johnny Depp), o dono
das empresas que assumiram o espólio da Tyrell, quer obter toda a informação
possível desta evolução natural para trabalhar em cima dela numa geração ainda
mais evoluída.
K, porém, tem seus próprios planos. Ele mesmo quer saber o quanto tem
de humanidade e o quanto de sua memória não passa de implante. Concentra-se em
K toda a questão do filme que reflete sobre o que poderíamos definir como o
direito dos replicantes à vida e à humanidade.
“Blade Runner 2049” tem um profundo respeito pela obra original e
dialoga maravilhosamente bem com o primeiro filme realizado há 35 anos. A forma
como são inseridas as referências ao trabalho de 82 saem perfeitamente e a
participação de Harrison Ford retomando o papel de Deckard é a cereja no bolo
de um filme que funciona muito bem do início ao fim e tem uma beleza que vai da
cinematografia à trilha sonora.
Cotação da corneta:
Nota 9.
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